Prólogo

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Dois anos atrás

Afinal, a morte tinha seu estilo.
Passei minha mão pelo vestido preto de funeral. Era o meu favorito, mas fiquei imensamente feliz em não usá-lo frequentemente. Ou quase nunca, somente quando minha mãe me obrigava.

-- Andy, pode se sentar querida -- a voz triste de minha mãe me trouxe de volta para o funeral. Minha irmã Elisa, abriu espaço para que eu pudesse me sentar. Foi bom quando os braços dela tocaram no meu e suas mãos envolvem nas minhas.

-- espero que Pedro esteja bem -- ela sussurrou para mim enquanto olhava para ele, que estava na frente tocando levemente o caixão de sua mãe.

-- não falo mais com ele diretamente. Somos de círculos sociais diferentes.

-- Mas vocês estudaram juntos por cinco anos e agora estudam na mesma faculdade. E a mãe dele frequentava a igreja.

-- isso não quer dizer nada Elisa.

Ao lado dele estava sua irmã Rebeca. Ela era tão linda, com seus cachos loiros e olhos azuis. Pedro é totalmente seu oposto, sua pele morena e seus cabelos negros combinavam perfeitamente com os seus olhos castanhos. Tinha apenas uma palavra para ele, fascinante. Eles eram populares na época da escola, e consequentemente na faculdade, mas também serão lembrados pela mãe que morreu de câncer.
Isso estaria sempre com eles em todos os lugares.

-- que tal você falar com ele -- apertei meus lábios para não rir com a proposta de Elisa. Eu falar com Pedro? Ela só podia está delirando.
Uma música começou a tocar no fundo, não havia letra. Minha irmã gemia ao meu lado, música sem letra a deixava triste, ela dizia que todas as músicas precisavam de letras e palavras. Para ela a música merece contar uma história. E de tanto falar nisso, também acho o mesmo.

Mas a história da mãe de Pedro tinha acabado, então achava que tanto faz o tipo de música, embora, talvez ele precisasse de palavras. Minha irmã olhou triste para mim, oferecer ajuda é um ato cristão que nossos pais sempre nos ensinaram, mas vamos combinar que não dar para falar sobre minha tendência de moda ou meu gosto por livros, minha obstinação em escrever frases ou qualquer outra coisa com alguém como ele.

Fechei os olhos e fiz uma oração por ele, pela dor que estava sentindo. Pedro se sentou no banco vazio na nossa frente. Minha irmã me deu uma cotovelada, sabia que definitivamente nunca iria desistir.

O fato era que eu nunca tinha entendido como a vida podia ser tão drástica, mas podia. E é. Só ficamos com as lembranças no futuro.

-- Rodrigo chegou -- Elisa falou baixinho com um desprezo na voz. Minha mãe que estava do meu outro lado abriu logo seu melhor sorriso com toda sua doçura para ele. Ela se afastou dando oportunidade do meu noivo sentar ao meu lado. Rodrigo apenas sorrio, pois Elisa ainda tinha suas duas mãos sobre as minhas.

Meu pai se colocou na frente de todos, e começou a falar o salmo 23. Eu comecei a acompanha-lo.

-- vamos ouvir o que Pedro e Rebeca tem a falar sobre sua mãe -- meu pai, o pastor da igreja disse. Pedro e Rebeca se colocaram perto do caixão de sua mãe. Ele, no entanto me encarava. Desviei meu olhar para Rebeca que deu um passo para frente da multidão, sentados no banco da igreja. Ela não ergueu o olhar. Pegou um papel cor de rosa de seu bolso. A igreja estava silenciosa, somente se ouvia o barulho do papel sendo desembrulhado. Ela apertou os lábios e segurou o choro.

-- eu não sei como vou sobreviver sem você mãe -- disse chorando. Sua dor e seu medo se espalharam pelo ambiente. Eu também não sabia como ela iria sobreviver, jamais sequer tinha imaginado perder minha família. Minha irmã tirou suas mãos das minhas e enxugou seu rosto.

-- nem eu conseguia imaginar -- Elisa falou para mim. Ela soluçava igual uma criança. Pedro então se colocou na sua frente, seus olhos castanhos estavam vermelhos e perdidos. E aquela cara de " tô nem aí para todos vocês" que ele usava na faculdade não estava a vista.

-- Pedro é um pedaço de mau caminho -- Elisa cochichou nos meus ouvidos. Resolvi ignorar-lá naquele momento. E em todos os momentos quando o assunto era Pedro. Ela nunca ultizava esses tipos de frases quando se referia a algum garoto. Isso queria dizer que estava obstinada a descobrir o que aconteceu entre nós dois.

Éramos melhores amigos, e depois não éramos mais. Ele foi meu primeiro namorado, e depois já não éramos mais. E eu estava noiva de um homem que não conheço o suficiente para casar, "por pura, livre e egoísta pressão de meu pais," segundo Elisa.

-- coitadinhos... coitadinhos -- sussurrou minha irmã. Eu olhava para eles e as frases começam a se formar na minha mente.

Perdidos.
No meio de tantas pessoas.
Sozinhos
Neste mundo que mata.
Quem somos nós para esse mundo?

Eu me perguntava se Rodrigo, meu noivo, compreedia essa letra. Duvidava. Pensei na ideia de escrever a letra para ele. E que de alguma forma ele gostasse. Mas talvez entendesse errado.

No entanto, Pedro, aquele que éramos melhores amigos, e depois não éramos mais, que foi meu primeiro namorado, e depois já não éramos mais. Pedro que estava na minha frente, sofrendo, compreenderia. Sabia disso.
Embora a letra não ia ajuda-lo muito naquele momento. Ele não ia falar. Era como tivesse sido sequestrado e amordaçado. E as palavras roubadas dele. Pedro abaixou a cabeça e saiu do púlpito, passando pelas pessoas derrotado.

-- vá Andy -- pediu minha irmã.

Suspirei forte e me levantei. O meu joelho bateu no encosto do banco da frente. O barulho encheu a igreja e consequentemente acabou com o silêncio que Pedro e Rebeca iniciaram.

-- Boa ideia -- sussurro Rebeca mesmo soluçando, no momento que sentava no banco na minha frente.

Não sair porque minha irmã tinha educadamente mandado ou Rebeca tinha achado uma boa ideia. Eu fui porque não queria deixa-lo encarar o silêncio sozinho.

Encontrei Pedro no jardim do fundo da igreja, eu estava sem fôlego quando o alcancei, mas tudo bem, pois a situação já era esquisita por si só. Eu estava ciente que toda essa empatia, ou seja lá que seja, iria sumir no momento que retornassemos para a universidade. Mas naquele momento, estávamos ali, sozinhos. Embora a universidade para nós era uma espécie de guerra de diferenças. Pois eu Pedro não tínhamos muito em comum fazia um logo tempo. Incluído e excluída. Faz compra no shopping e não faz compra no shopping. Calado, exceto com os amigos. Calada o tempo todo. Mas naquele momento tínhamos algo em comum. Nós dois tínhamos perdido algo que nunca iríamos recuperar. Eu tinha perdido ele. E ele sua mãe.

O banco velho de madeira tremeu quando me sentei nele. Pedro olhou o suficiente para registrar quem eu era. Ele não demonstrou estar surpreso por eu está ali. E não me lançou um olhar de, me deixe em paz! Quero ficar sozinho.
Sabia que o tempo passaria mais rápido se eu falasse, mas não estava me importado se o tempo passasse lentamente. Eu me perguntava o que Rodrigo, meus pais e principalmente Elisa, estavam pensando quando sair tropeçando da igreja para ir atrás dele. Esperava que não estivessem achando que voltaria com ele consertado e falante.

Pois, eu não disse para ele voltar para dentro, e nem que tudo ficaria bem. Somente permaneci sentada ao seu lado. Mantendo um centímetro entre a minha perna e a dele. Ele olhava para suas mãos enquanto eu encarava uma erva daninha que nascia no jardim.

Então, finalmente Elisa surgiu. Observei quando andava em nossa direção com um expressão curiosa e investigava.

-- tchau -- disse levantando do banco.

-- tchau Andy.

E foi isso. Deixei Pedro no banco. E a distância entre nós se extinguia de centímetros para metros. Como sempre foi.

Quando cheguei perto de Elisa, ela me olhou ironicamente e novamente resolvir ignorar.

-- Andy eu te amo --disse Elisa beijando minha testa.

-- eu também.

Disse para ela a frase que tanto desejava falar a Pedro. Mesmo sabendo que nunca ia ouvir isso dele novamente.

Através da Sua Oração  (Degustação)Where stories live. Discover now