Capítulo 2

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A música ainda ecoava pelas entranhas da minha mente, — Mirna, Mirna, Mirna... — a mesma começava a se intensificar, lentamente, eu escutava meu nome cada vez mais rápido, a voz começava a soar impaciente, eu parecia completamente fora de mim, sem forças para responder aos chamados. Mas eu estava bem. Como eu não me sentia a tempos.

Pude enxergar um par de olhos a minha frente.

Horrendos, suas pupilas eram negras como a escuridão, e as veias do globo ocular bem aparentes, como raios intensamente vermelhos, não senti medo algum, pelo contrário, me senti acolhida, como se eu já o tivesse visto. A criatura parecia sorrir, mas não tive a completa certeza já que não permitia-me ver qualquer coisa além de seus olhos. 

— Você não pode deixá-la fazer isso, faça esse favor a mim, Mirna. — Poderia ser a voz angelical, a qual cantava a canção anterior, mas não, essa voz parecia sair da criatura, possuía um tom de insanidade, mas eu a compreendia. — Esse lugar é seu, esse trono é seu, acredite em mim.

— Eu acredito. — o respondi quase que em um sussurro, não entendendo o porque de estar dizendo aquilo, a mim, até então todos debochavam da minha capacidade.

— Não se esqueça em momento algum —  sua voz era extensa, e me causava tamanha tranquilidade, era esquisito — tchaau — a criatura disse por fim. Tenho a certeza de que se fosse algo com braços estaria acenando.

  — MIRNA. — em meio a tudo aquilo houve um grito! Meus tímpanos se tornaram inquietos, me espantei com o berro. Foi de tamanha intensidade a me tirar do transe. Por um momento desejei que não tivesse acontecido, e permanecer daquela forma, em paz, pelo resto do que seria minha vida.  

E eu pude finalmente reconhecer a voz, que mencionada o meu nome loucamente.

A criatura estava desaparecendo.

— Espera! Volta aqui! Não terminamos. — eu precisava de respostas. E algo me dizia que só essa criatura me responderia.

— Quem?! — houve uma pausa — Pelo amor de Deus, Mirna! Você está suando. Oque aconteceu? — Ridley Scott, como eu não adivinhei? —  eu estou gritando como um louco — A única pessoa, que estaria tão desesperado assim, e o mais espantoso, por mim, porém eu já havia superado essa parte, eu acho.

Ridley, foi a única pessoa pela qual já me apaixonei. No passado. 

Tudo começou no 7° ano. Ainda me lembro bem, quando o mandava cartas de amor, tentava de qualquer maneira mostrá-lo que eu estava ali, para ele. Obter algum sinal recíproco do que naquela época era o amor da minha vida, ingênua era eu. Não aconteceu.

Perdia horas e horas me perdendo nos seus traços delicados e sutis. Naquele ano, 2005, a única palavra que ouvira sair daqueles lábios, fora um mero "obrigado", por tê-lo ajudado na resposta feita pelo professor Edward, na aula de Geografia. Eu fantasiei aquele momento por muito tempo depois, talvez até anos, inquieta. Bucólica era eu.

Um tempo se passou, e eu possuía a plena lucidez de que ele não estava dando a mínima para mim, mas eu não podia me culpar por isso, meu coração simplesmente estava no comando, e eu não pude evitar. Culpe o meu coração.

 À 5 anos eu estaria radiante só de ouvir aquela voz, suave e angelical, mencionando meu nome. Cinco anos se passaram, acredito que seja um bom tempo para alguém cair na real, após uma desilusão destrutiva. 

— RIDLEY?! Porque você está aqui! —  retomei a consciência, seus olhos castanhos me encaravam, transmitiam pânico, porém não abandonei meu porte inicial — PRÓXIMO A MIM?! — depois de tudo que ele fez... Eu não poderia, nem se quisesse dirigir uma palavra a ele, eu havia deixado bem claro.

 Eu estava quebrando meu pacto, entre eu e eu mesma.

  — Não grite. Eles vão vir aqui. E não terminará muito bem, você sabe... — Ele falou, seu olhar ainda aparentava pânico, porém ele suplicava de uma forma assustadoramente plena e serena.

— Você estava gritando! Espera. — desviei minha atenção de seu rosto, para observar o ambiente. — oque eu faço no chão, Ridley? — me sentei prontamente assim que percebi — No gramado dos Auritch. — o encarei.

— Eu... eu não sei oque aconteceu Mirna, do nada, você simplesmente parou de conversar comigo, e desmaiou — ele me olhava confuso — bem, não sei se posso nomear como um desmaio, mas foi bem estranho.

— Não, não, não — levantei, dei pequenos passos ao redor dele,  pensando — isso não pode estar acontecendo, eu deveria ter ficado na escola, eu deveria mostrar a Sarah meu propósito. Como eu vim parar aqui?!

— Ahm?! Que propósito? Mirna, você enlouqueceu?! A aula já acabou. A pouco você estava conversando comigo sobre... nem lembro mais sobre oque. — houve uma pausa confusa, e ele resolveu continuar — Confesso que estranhei, porém, me dei o luxo de ignorar, pensando bem, eu não deveria tê-lo feito.

"Você sabe, eu sempre quis mais uma chance para me redimir, me chamando assim para conversar... desculpa. Foi mais forte que eu."

Revirei meus olhos. Era mais um dos discursinhos inofensivos, de Ridley Scott.

Tragam a pipoca, galera!

E cuidado, muita cautela para não se iludirem.

"Que menino fofo!" Posso ouvir, o extinto de cada um de vocês se manifestando.

Posso ter certeza que pensaram isso, a menos que tenham uma história com algum Ridley Scott distinto, feito sob medida para vocês, explorando cada ponto fraco seu.

E se não, tome cuidado, você está completamente exposta para que aconteça, meus caros.

— Está bem Ridley, já houvi essa história, você não precisava tê-la repetido. — o olhei, ele ainda estava ajoelhado frente a mim — e muito menos sujado sua calça com o gramado dos Auritch, dona M. não saiu para regar hoje, deve estar bastante sujo Ridley. — ele se levantou.

Que pena. — eu disse por fim.

— Mirna, que palhaçada! Você desmaiou, eu fiquei preocupado, assustado, — fez pequenos gestos ao redor de sua cabeça — cheguei até a pensar que eu poderia ter feito algo. Dane-se os Auritch, Mirna. 

— Está bem, legal, vou fingir que acredito Ridley, vamos embora. — me recompus, ele se levantou — já estou aqui com você mesmo.

— Não, nada disso, temos que fazer algo, você desmaiou sem motivo Mirna. Deve haver um, quer dizer, eu acho que ninguém desmaia sem motivo assim.

— Para de besteira, estou bem. Eu devo estar com fome ou algo do tipo, deixa isso para lá. — o olhei.

— Saiam do meu gramado seus imbecis. — dona Magda berrou do segundo andar de sua casa. Nos encaramos, e olhamos diretamente para a janela. — oque estão fazendo ai? Vão se pegar no muquifo, que vocês chamam de casa.

— Está bem. Vamos. — ele concordou.

— Ah, claro, claro, faz 2 anos que todas as suas chances se esvaíram Ridley Scott. — o olhei, — para nunca mais — ele me olhou e fomos embora silenciosos.

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⏰ Last updated: Jan 17, 2018 ⏰

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Dez Degraus SúbitosWhere stories live. Discover now