Prólogo

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Estou sempre com você.

Eu estava presente no momento em que nasceu, na sala de parto. Seus pais, parentes e médicos não podiam me ver, acanhado no canto escuro do cômodo, com meu olhar sombrio sobre o pequeno bebê.

Você ficava trancada no quarto, enquanto crianças da sua idade brincavam na rua. Éramos só eu, você e os papéis com desenhos diferentes. Te observava de todos os ângulos possíveis, tentando entender como alguém da sua idade preferia lápis e a solidão ao invés de brinquedos e amigos.

Mas você tinha a mim.

Estava no banco de trás do carro de sua mãe, segurando a mão delicada ao meu lado, quando ele foi contra aquela árvore. No funeral, observando suas lágrimas que queria tanto poder secar ou ao menos entender a dor que as motivavam a cair tão desesperadamente.

Na cabine do banheiro da escola, chorando, enquanto eu estava do outro lado. Minha cabeça encostada na única coisa que nos separava. Sussurrei através do ferido buraco em minha garganta que iria ficar tudo bem, na mais tola esperança de que poderia me ouvir de alguma forma.

Debruçado sobre a pia, olhando meu reflexo no espelho embaçado, ouvindo o barulho da água morna caindo sobre sua pele, admirando as palavras que saiam como melodia de seus lábios, aguardava e depois lhe seguia.

Não sou visto. Quase não existo. Você nunca me notou ocupando o assento ao seu lado no ônibus escolar. Nem mesmo chegou a saber dos sorrisos sem jeito que dava quando te via durante aqueles pouquíssimos momentos de felicidade. Jamais percebeu como tentava inutilmente afastar aquelas garotas que te maltratavam no colegial. Às vezes, me pego pensando se sabe que estou aqui. E acho que, no fundo, a resposta é sim, só não compreende o quanto somos ligados.

Conseguia ouvir seus pensamentos, ler suas feições. Enquanto você não tinha noção de como a ideia de poder traçar meus dedos pelo seu rosto se repetia constantemente, de como eu queria poder ter seus olhos, que na maioria das vezes estavam melancólicos, sobre mim.

Tudo estava normal, mas não demorou muito para as mudanças repentinas surgirem. Parecia que a cada dia que se passava, precisava mais de você. Até que naquela noite, enquanto respirava próximo de seu ouvido, deitado ao seu lado, meus olhos que antes estavam focados no teto do quarto tomado pela noite pairaram no rosto perto de mim. Observei os cabelos escuros e ondulados espalhados na fronha, os cílios cheios, a boca com um formato único, no tom rosado mais precioso. Eu sorri. Tentei encostar em sua face e por um momento, pude sentir algo. As pálpebras se abriram, revelando os olhos âmbar. Eles estavam assustados. Sua feição era quase a mesma que a minha. Tentava ouvir os pensamentos, mas tudo que conseguia escutar era o silêncio mais profundo que nunca havia experimentado.

Estava atordoada e confusa. Não era necessário mais nada para saber. Cogitei a ideia de que havia acabado de ter um pesadelo. Logo se deitou novamente. Me aproximei e repeti o ato pela segunda vez. Seus olhos se abriram. Só que, ao contrário de antes, eles não fitavam o vazio. Tinham acabado de encontrar os meus na escuridão.

Naquele momento, pude ter certeza de que uma chama se acendeu dentro do meu corpo sem vida. Sabia que era impossível. Mas algo provava completamente o contrário. E mesmo não entendendo nada de sentimentos, soube na mesma hora que era amor.

Sky. {Mingyu} EM MUDANÇAOnde histórias criam vida. Descubra agora