Capítulo 01

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APENAS ALGUNS CAPÍTULOS PARA DEGUSTAÇÃO


Domingo era o dia da semana mais chato para Maria, o dia em que as vizinhas se juntavam na casa da tia para falar da vida alheia. Maria saiu para andar pela cidade, talvez pudesse descobrir mais ruas, ou quem sabe houvesse mais lugares jovens que ela ainda não havia visto. Colocou seu capuz cobrindo o rosto e foi andando de cabeça baixa, só quando sentiu um frio gelar sua espinha, levantou a cabeça e percebeu que estava novamente em frente ao castelo da rua abandonada. Maria não fazia ideia de como fora parar ali. Era o primeiro dia da primavera, e as flores do grande jardim do castelo estavam começando a aparecer. Algumas lindas flores já haviam aparecido, e da mesma forma morreriam se esse jardim não fosse cuidado. O castelo ainda parecia assustador e a julgar pelo estado do jardim e o mato que cobria quase toda a entrada, podia jurar que estava abandonado, mas no dia anterior alguém estava lá. Pensou se a pessoa que morava ali não tinha dó do que aconteceria com as flores, e olhando o tamanho da construção, e a riqueza de detalhes com que a frente do castelo era feita, era alguém que teria condições de pagar um jardineiro se não queria se envolver com as plantas. Maria observou a janela no terceiro andar, onde tinha visto o vulto no dia anterior, tentando ver novamente. Se visse, deixaria de lado o fato de estar espiando uma residência privada e chamaria o dono, ou dona para uma conversa sobre aquele jardim. Ela esperou por uns quinze minutos e nem sinal do vulto novamente, a torre esquerda onde ficava a janela, estaria vazia se não fossem os vários pássaros pretos pousados em cima dela. Pensou que talvez a pessoa tivesse saído, afinal era domingo, e resolveu ir embora. Mas quando deu a última olhada para a torre, sentiu o frio incomum dessa vez na nuca, e uma presença atrás dela. Pronto! Fora pega espiando a casa, virou-se lentamente e soltou um grito. Não era uma pessoa atrás dela afinal, e sim um enorme e feio corvo. Sentiu as pernas bambearem e segurou-se no portão para se apoiar. Nesse momento, os corvos que estavam na torre voaram e Maria avistou novamente a sombra na janela do terceiro andar olhando para ela, sentiu um medo fora do normal e correu para fora dali o mais rápido que pôde.

Andando de volta para a casa da tia, Maria pensou que estava ficando louca, afinal, era só um pássaro e o morador do castelo estava muito longe para fazer qualquer coisa a ela. Quando chegou em casa a reuniãozinha já havia acabado, tendo ficado somente a mulher que morava em frente ao bar. Ela era uma mulher baixinha, de cabelos grisalhos, e uma cara bondosa. Marta levantou-se puxando Maria para perto da senhora.

— Finalmente apareceu. Veja Lucena, essa é minha sobrinha Maria, vai ficar comigo esse ano só até completar vinte e um, aí vai poder receber a herança do pai dela e ir embora.

Lucena levantou-se e apertou a mão de Maria sorrindo. Ela era a primeira moradora da cidade que não a encarava como se ela fosse algum espetáculo ao vivo. Maria apertou a mão da mulher e retribuiu o sorriso. Então se sentou no sofá em frente a ela para descansar, havia corrido mais da metade do caminho.

— Onde você estava Maria? Por que está cansada? — perguntou a tia desconfiada.

— É que eu estava correndo.

— Correndo? Por que estava correndo?

— Nada demais, eu me assustei com um corvo e corri, mas não foi nada.

A expressão de Marta mudou no mesmo instante.

— Um corvo? Não há corvos nessa cidade! A não ser que você estava onde não deveria estar! Onde você estava?

Maria se assustou com a reação da tia que agora gritava.

— Não estava em lugar nenhum! Foi só uma rua que achei e havia corvos nela.

Marta ia recomeçar a gritaria, mas Lucena a impediu:

— Calma Marta, ela não sabia. — Então sentou-se ao lado de Maria para explicar o que estava acontecendo. — Olhe Maria, se você é uma moça inteligente como eu acho que é não volte àquela rua.

— Mas... — Maria começou a interromper, mas Lucena continuou falando.

— A Rua Londrina está abandonada por um motivo, é perigoso lá, e uma menina bonita como você não deve andar por uma rua deserta.

Maria assentiu e desistiu de tentar explicar.

— Não quero que volte lá Maria. Imagina o que acontece se alguém mal intencionado encontra você sozinha numa rua onde não há moradores? — repreendeu Marta.

— Pensei que a senhora conhecia todo mundo aqui. — defendeu-se Maria.

— O fato de eu saber os nomes não quer dizer que possa confiar nas pessoas. Não volte mais lá ou eu proibirei esses seus passeios.

Maria concordou e se levantou, mas antes de sair, lembrou-se de uma coisa.

— Tia, quem mora naquele castelo estranho no final da rua?

Marta, que havia pegado uma xícara de café engasgou-se jogando o café para fora.

— Castelo? Não mora ninguém naquele lugar, como eu disse a rua foi esvaziada por uma razão, é perigosa e ninguém mora lá.

— Não é verdade. Eu vi hoje mesmo um vulto na janela do terceiro andar do castelo.

Marta levantou-se abandonando a xícara de café e foi até Maria com os olhos arregalados.

— Você entrou lá?

— Não! Claro que não! Eu vi pelo portão alguém aparecer na janela. Então imagino que seja o morador de lá.

— Não é possível! — sussurrou Marta olhando para Lucena, que se levantou também e foi até Maria perguntando:

— Ele viu você?

— Ele quem?

— Quem você viu na janela.

— Ah! Sim, acho que me viu, mas não falou comigo. Nem sei se era ele ou ela, mas se bem que olhando o estado do jardim, deve ser um homem.

— Maria me escute, não volte mais lá. Já aconteceram coisas ruins o suficiente por lá. Não vá mais lá — Lucena falava com Maria não dando uma ordem, mas apelando para que ela não fosse.

— Tudo bem, se é tão importante eu não volto lá. Não tem graça mesmo.

— Ótimo, vamos fazer o seguinte, vá a minha casa amanhã e eu vou te levar a biblioteca. Lá tem uma moça da sua idade, vocês podem ter assuntos em comum.

— Aqui tem uma biblioteca? Eu vou adorar conhecer, e alguém da minha idade também.

Marta e Lucena estavam aparentemente mais tranquilas, mas Maria não pretendia esquecer essa história tão fácil. Decidiu que não voltaria mais à rua, mas ia descobrir o que afinal aconteceu lá.

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O assassino - DEGUSTAÇÃOWhere stories live. Discover now