02 de maio

506 53 15
                                    

Já passava de meia noite quando cheguei em casa, mas, mesmo assim, quando sentei em meu sofá de couro preto, peguei meu celular e disquei o número tão bem decorado em minha mente completamente calculista. Um telefone africano desta vez.

Como o combinado, ninguém falou nada quando atendeu, para que não houvesse o problema de eu, sem querer, discar o número errado e acabar denunciando que eu era o cabeça de todas essas mortes. Se alguém respondesse, saberia que algo estava errado.

— Tudo pronto. Está na hora. — falei, e então a chamada foi encerrada.

Com um suspiro, deitei-me no meu confortável sofá e joguei o celular para longe. Agora, eu iria continuar a confundir a polícia. Tinha sócios nos países mais influentes do globo. Pagava-os muito bem para que fizessem esse trabalho para mim: matar e retirar o intestino delgado das vítimas e os enviar para mim quando conseguissem dezesseis deles. Fazendo as contas, no final, eu ficaria com exatos quatrocentos intestinos. Trezentos e cinquenta e quatro, na verdade, já que, como eu disse anteriormente, o meu sócio italiano não estava mais no mundo dos vivos. Mas mesmo que fossem apenas trezentos, já estava bom para o meu plano. Além disso, a polícia está louca tentando descobrir quem é que está comandando tudo isso. Afinal, o cabeça poderia estar em qualquer um em vinte e cinco países, isso considerando que ele realmente estivesse em algum citado. Sim, vinte e cinco. Vários, não?

Depois que a África sofresse de duas mortes, seria a vez da China. Depois disso, não haveria mais ordem. O verdadeiro caos começaria.

Há! Eu era um gênio.

Liguei a televisão e assisti um pouco do noticiário. Em algum momento, Katherine apareceu novamente. Não deram tanta importância como da primeira vez, apenas repassaram os fatos de anteontem e mudaram para uma notícia de um acidente que ocorrera mais cedo naquele dia.

Desliguei a televisão e fui para o banheiro tomar uma ducha e tirar aquele sangue todo de minhas roupas e rosto. Tenho sorte de morar em uma região onde as luzes das ruas não funcionam muito bem. Não que eu tivesse cruzado com muitas pessoas na rua, mas se eu topasse com algum observador, com certeza estaria com problemas. A pouca luz das ruas foi uma vantagem muito boa.

Despi-me e joguei as roupas ensanguentadas no chão do quarto. Antes que eu entrasse no chuveiro, observei-me por alguns segundos no pequeno espelho que tinha na pia e sorri para a bela imagem que via. Admito que sou muito bonito. Meus olhos são castanhos escuros e meu cabelo é cortado em estilo reco, com uma franja um tanto grande, da qual eu costumava deixar para cima de um jeito despojado. Mas não era apenas minha beleza que fazia eu sorrir em frente ao espelho naquela noite, mas sim meu rosto anguloso pintado com vários respingos de sangue. Minha barba não era muito grande, então, mesmo em cima dela eu conseguia ver o belo vermelho.

Lindo.

Gravei aquela encantadora imagem em minha mente antes de, com um último sorriso de satisfação, entrar no box e começar a me lavar. De fato, matar é bom em todos os estágios. Desde a preparação até o último segundo antes de entrar no chuveiro.

Acho que foi por isso que matar se tornou a minha droga.

🔻🔻🔻

No dia seguinte, eu acordei com um mau humor que nem mesmo o meu café favorito conseguiu me animar. Deve ser porque naquele dia minha agenda estava vazia. Não cometeria nenhum assassinato ou planejamento dos meus próximos passos.

No consultório, fingi o máximo possível que estava alegre. Admito que foi bem difícil. Apenas de olhar para a cara angelical de Márcia, eu já sentira uma vontade incontrolável de matá-la de uma forma bem torturante. Retirando seu olhos com um bisturi e depois fechando todos os seus buracos com uma linha de pesca, talvez. Seria bem acalmante.

— Hey, Allan, está tudo bem, cara? — a voz grave de Dale, o cirurgião plástico do consultório, distanciou-me dos meus pensamentos psicóticos.

— Sim, obrigado. — respondi rapidamente, voltando minha atenção para a mulher desacordada em cima de minha mesa de trabalho. Nenhum dos meus ajudantes havia chegado ainda. Era uma cirurgia convencional de vesícula. Nada de mais, mas mesmo assim eu precisaria de algumas mãos extras.

De qualquer forma, quando Dale invadiu meu escritório — pois se alguém entrar sem bater antes eu chamo de invasão — eu já estava separando as ferramentas que iria usar naquele procedimento.

— Tem certeza? Você parece nervoso...

— JÁ DISSE QUE ESTOU BEM. — rugi irritado, fazendo com que minha bandeija com as ferramentas caísse no chão, fazendo uma bagunça. — Droga. Márcia!

— Não. Definitivamente você não está bem. — insistiu Dale, aproximando-se de mim e me ajudando a pegar as ferramentas. — Vá para um bordel, cara, fazer tricô, sei lá. Você precisa desestressar.

Suspirei. Ele estava certo. Eu realmente não podia ficar estressado. Isso poderia delatar minha verdadeira natureza.

— Desculpe-me, Dale. — disse ao me levantar com a bandeija na mão. — Ontem foi um dia estressante. Minha avó anda meio doente e eu temo que... — coloquei a bandeija sob meu balcão. — Bem, você sabe. De qualquer forma, não deveria ter descontado isso em você, perdão.

Dale colocou um braço sobre meu ombro, seu semblante triste.

— Se quiser conversar sobre isso... — ele começou, mas neguei com a cabeça, como se estivesse segurando o choro. Dale tirou a mão de meu ombro e se dirigiu até a porta. — Estarei sempre aqui se mudar de ideia.

— Obrigado. — respirei fundo e endireitei meu jaleco. Dale então saiu e fechou a porta.

Dei um leve risinho enquanto voltava a arrumar as ferramentas para as esterilizar. Manipular é sempre divertido.

The KillerWhere stories live. Discover now