XVI - O BEIJO

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Naquele momento, Lú estava indefeso, ele olhava assustado para a sua arma a metros de distância. Projetar outro escudo seria impossível naquele estado e dependendo do humor do seu mentor, ele poderia ser perfurado novamente. E não era nada agradável sentir a dor da morte.

Mas uma mão foi estendida em sua direção. Para a sua sorte, Karlo estava de bom humor. O garoto sorriu, então aceitou a mão do mentor e se deixou ser levantado. O homem suspirou, pausando em seguida sua palma no ombro do garoto.

— Você foi bem — disse ele com seriedade. — Mas ainda precisa melhorar.

Lú assentiu, enquanto Karlo guardava sua espada na bainha.

— Me perdoe — disse Lú. — Eu tentei, mas...

— Não se lamente. Eu espero mais de você, garoto. Eu sei que tem muito mais a me oferecer.

Karlo sorriu, dando tapinhas no ombro do garoto, em seguida virou-se aos demais.

— Já que está escurecendo, estão liberados por hoje!

Os garotos começaram a se movimentar emitindo murmúrios, saindo em grupos do local de treinamento que sempre frequentavam. O pôr do sol emanava sombras escuras nas árvores, ao mesmo tempo em que pintava a terra e o céu de alaranjado.

Lú viu se aproximar dele a figura de pele negra, mostrando o seu sorriso branco, com seu cabelo escuro repleto de tranças finas preso em um rabo de cavalo. Ela usava um vestido comprido verde-oliva, deixando seus ombros nus, enquanto os braços eram cobertos por um tecido fino. Uma alça de couro cruzava o seu tórax, prendendo a bainha em suas costas onde carregava a sua espada.

— Oi! — ela saudou timidamente.

Lú corou com a presença dela, ficando com as mãos mais trêmulas do que já estavam.

— Oi... — ele respondeu, ainda sem jeito.

Lucy era a irmã de Otto, a filha mais nova de Néfi, tinha quinze anos e desde muito pequena já era familiarizada com armas. Ela era uma das melhores da turma e a única garota também, embora a sua mãe não concordasse com essa ideia da sua caçula lutar.

— Minha nossa! Suas mãos! — ela disse, preocupada.

A garota pegou as mãos de Lú, deixando-o ainda mais vermelho. Ela fitava seus membros, que sempre ficavam paralisados e trêmulos quando projetava um escudo, e massageava com seus dedos com a intenção de deixá-lo relaxado.

Karlo observou todos os seus alunos irem embora, então olhou para trás ao sentir falta do garoto azul.

— Garoto! — ele o chamou. — Não vai embora?

— Eu... estou indo — ele respondeu sem tirar os olhos de Lucy.

Karlo sorriu ao ver os dois adolescentes e percebeu com malícia o propósito do garoto.

— Certo. Estarei na taberna, se precisar de mim. — Com isso, o homem foi embora, deixando os dois sozinhos.

Lucy pareceu feliz em ficar a sós com o feiticeiro, desfrutando desse momento, então ela o levou de mãos dadas para debaixo de uma velha árvore. Sentaram-se no chão gramado, enquanto o garoto observava as marcas de cortes feitas por espadas no tronco espesso.

Lú ficou nervoso novamente ao notar o quanto aquela garota o encarava. Desde que ele fez treze anos, ela se tornou próxima dele de uma forma estranha. Apesar de ser mais novo, eles pareciam possuir a mesma idade — já que os homens azuis eram mais altos que homens comuns. Sem contar que Lú tinha se desenvolvido muito nos últimos tempos. O seu corpo franzino ganhou mais massa muscular, o seu cabelo cresceu até a altura dos ombros, e mesmo que estivesse sempre preso, mechas mais curtas se soltavam na sua face. Ele usava uma blusa preta sem mangas que destacava seus braços e em seus pés, botas — por incrível que pudesse parecer, ele acabou se acostumando a usá-las.

O tempo estava escuro o suficiente para Lú não conseguir enxergar mais nada, apenas o vulto de Lucy.

— Não acha que está muito escuro? — Lú perguntou com receio.

— Você não é medroso. Relaxe! — Ela parecia à vontade.

Lú olhava em volta, sabendo que o seu receio não era da noite, mas sim daquela garota. Lucy entrelaçou as suas mãos nas de Lú, deixando-o desconfortável.

— Você lutou muito bem hoje.

— Bem, você escutou o que Karlo disse. E eu também não consegui manter meu escudo por muito tempo — Lú disse, não concordando com o elogio dela.

— Você realmente se importa com o que ele fala? Só acho que ele exagera contigo.

Com isso Lú concordava. Era o que todos falavam sobre o método especial de treinamento que Karlo fazia com ele.

— E sobre o seu poder... — ela continuou. — Eu acho que você deu o seu máximo e não devia abusar disso. — Ela apertou a sua mão na dele. — Tenho medo que se machuque.

— Bem...

Lú não tinha palavras. Ele sentiu as batidas do seu coração se acelerarem ao notar a aproximação de Lucy. As suas faces estavam quase coladas, ele tentou se distanciar, mas ela segurou em seu ombro enquanto puxava o seu braço com a outra mão, pausando em sua cintura.

Lú nunca havia beijado uma garota antes, e nem imaginou que um dia isso poderia acontecer, principalmente com uma humana comum. O que ela viu nele? Ou melhor, o que ela viu em um garoto azul?

Ele sentiu os lábios dela tocaram os dele e embora tímido, estava conseguindo acompanhar o ritmo da garota, que pacientemente desfrutava daquele momento sonhado por meses.

Lú tentou não pensar muito e apenas se entregou a ela. Apertou forte sua mão na cintura fina da garota, levando a outra mão para a nuca. Isso a fez beijá-lo com mais intensidade, deixando-o sufocado. Lentamente, ela foi diminuindo o ritmo do beijo até que mordeu levemente o lábio inferior do garoto e ficou olhando fixamente em seus olhos por alguns segundos. Lucy o abraçou inesperadamente, envolvendo seus braços no pescoço do garoto.

— Lú, eu... gosto de você — disse ela.

Lú correspondeu ao seu abraço, porém, não disse nada. Ficou pensativo, tentando entender realmente os seus sentimentos.

...




Legend - O Feiticeiro Azul ( Livro 1)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora