Simon abriu os olhos e tateou a mão pela escrivaninha ao lado da cama, em busca do despertador. O aparelho tocava descontroladamente, tremendo sobre a madeira da pequena mesa, fazendo Simon odiar ter um daqueles em casa. Na verdade, ele sempre odiou. Achava-os invasivos, barulhentos e insistentes. Mas era obrigado a conviver com um, infelizmente.
Ele tocou os dedos no metal, apertando o botão com força ao ver o horário. 08h34. Então percebeu: Estava atrasado. Muito atrasado. Se corresse, talvez pudesse chegar a tempo, mas teria que acreditar em milagres para que isso acontecesse. E para Simon, milagres não existiam. Pelo menos não em sua vida.
- Merda! Merda! Merda! - disse, enquanto se levantava num pulo da cama.
Chutou os lençóis que se enrolavam nos pés e vestiu a calça, com desespero, quase caindo no processo. Merda, merda, merda, pensou, que merda! Não posso me atrasar! Quando já abotoava os botões da camisa branca, notou os lençóis se mexerem sobre a cama. Julie havia acordado. O cabelo loiro e brilhante da garota tampava seu rosto, enquanto o corpo saía do amontoado de lençóis.
- Meu plano deu certo. - disse, sorridente, tirando o cabelo do rosto e encontrando os olhos de Simon.
- Que plano? - Simon perguntou, sentando aos pés dela na cama e calçando os sapatos, ainda meio desesperado.
- Planejei te embebedar ontem para você perder o vôo essa manhã.
Simon se levantou, pegou as malas que havia arrumado há dois dias e pousou-as no chão, aos pés da cama. Em seguida, colocou seu relógio no pulso e colocou seus óculos escuros, então fitou Julie, num sorriso meia-lua.
- Por isso tenho um despertador, bobinha. -admitiu, dando um beijo rápido nela. - Agora preciso ir.
- Não! - ela reclamou, fazendo beicinho e puxando-o pelo colarinho para mais perto. - Não quero que você vá, Simon!
- Não comece com a mesma ladainha dos meus pais, Julie, por favor. - ele bufou, deixando que ela o abraçasse, mas se mantendo rígido em seus braços.
Julie afundou o rosto em seu pescoço, então sussurrou em seu ouvido:
- Você fica mais bonito ainda quando fala ladainha. - então mordeu a ponta da orelha de Simon. - Por que não passa o resto do dia aqui, repetindo ladainha, ladainha, ladainha...
- Julie, é sério, preciso ir. Os rapazes estão me esperando no aeroporto, estamos planejando essa viagem há meses. Você sabe. - Simon deu outro beijo rápido nela e se levantou, arrumando o colarinho da camisa. - Estarei de volta antes que você perceba minha ausência.
Julie franziu o cenho e afundou nos lençóis, chateada.
- Está tendo uma guerra lá, Simon. Você não assiste tv não?
- Assisto Julie, mas como sabe, eu não me importo. Estou indo com meus amigos num safári, não vamos entrar em nenhum território hostil. Não somos malucos.
- Então, ok, Simon! - Julie disse, se virando para o outro lado da cama, onde a parede estava a poucos centímetros do seu rosto. - Estarei aqui quando você voltar, como sempre.
Simon a olhou e sorriu, mesmo sabendo que ela não estava olhando-o agora. Ele gostava de Julie mais do que qualquer pessoa. Ele amava suas piadas, suas birras e a preocupação que vinha dela. Ele a amava mais a cada dia.
- Tente sair um pouco, até eu voltar. Que tal ver a Wanessa? - sugeriu ele.
- Eu disse. Tchau. Simon. - Julie disse, ainda virada para a parede.
- Não, não disse. - Simon riu, então, tomado por uma vontade imensa de abraçá-la, se jogou em cima dela, beijando seu rosto e ouvindo-a gargalhar entre seus beijos. Eles se abraçaram por alguns segundos, então, Julie ficou de frente para ele, sentindo o corpo de Simon pressionando-a sobre os lençóis.
- Promete que vai voltar? - ela perguntou, com olhos suplicantes.
- Prometo que vou. Ou acha que eu perderia a chance de olhar esses olhos de novo, hein, sua bobinha?
Julie sorriu e o beijou. Simon fez o mesmo, sentindo-se como se deixasse uma parte do coração ali. Então, se levantou, ainda encarando Julie, e pegou as malas aos pés da cama, andando lentamente até a porta.
- Simon? - Julie chamou quando ele já abria a porta.
Simon a olhou, esperando.
- Eu te amo. - ela disse, com os olhos brilhando. - Nunca se esqueça disso.
- E você acha que eu poderia esquecer? Nós somos um, Julie, sempre.
- Sempre. - ela repetiu, então Simon se foi.
Você não disse que também me ama, Julie pensou, você nunca diz.
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As Cartas de Simon Dodger
RomanceDepois de viajar com dois amigos num safári pelo Congo, na Africa, deixando namorada e família para trás, Simon Dodger se vê perdido numa guerra civil que abala o país. Agora, preso num lugar onde crianças são feitas escravas, mulheres são estuprada...