56: fase um

17K 2.1K 1.3K
                                    


Pergunta: já teve algum sentimento que você simplesmente não conseguia se livrar? Pode ser em relação a amigos, família, romance, escola, trabalho, tudo. Quando a emoção venceu a razão para você?

O apartamento ultra iluminado de Tomás Barth ficava num prédio de tijolos, entre duas casas de mais de duzentos anos

Ops! Esta imagem não segue as nossas directrizes de conteúdo. Para continuares a publicar, por favor, remova-a ou carrega uma imagem diferente.

O apartamento ultra iluminado de Tomás Barth ficava num prédio de tijolos, entre duas casas de mais de duzentos anos. Uma árvore bem diante dele parecia estar adiantada para o outono, deixando várias folhas e gravetos na calçada em frente, tão ressecadas que faziam um crec-crec irritante toda vez que alguém caminhava sobre elas.

O ruído não ajudava em nada os nervos de uma Alana paralisada do outro lado da rua, completamente sozinha, uma vez que Silvia precisava estar em poder de uma rede wifi boa o suficiente para performar suas estripulias de hacker, e Brenda e Thales, ambos altos, morenos e atléticos, chamariam atenção demais em uma rua estreita como aquela, razão pela qual aguardavam pelo sinal de Alana em um café ali perto.

Alana alisou a saia branca estilo tenista no corpo, e arrumou os cabelos atrás da orelha. Nos vidros de um carro estacionado ali perto, deu uma boa olhada em sua imagem: a perfeita reversão dos ensinamentos de Mika nos últimos meses ("cabelo dividido no meio é coisa de maria mijona", "garotos não prestam atenção em quem não mostra pele" e "nunca mais use meias de gatinho nessa vida a menos que você pretenda ser uma virgem para todo o sempre"). Ela sabia que aquilo funcionaria, porque todo o resto não funcionara com Tomás.

O estralar de gravetos e o ranger de um portão de ferro muito antigo indicavam que alguém saía do prédio. Ela segurava um pedaço de papel no punho fechado com tanta firmeza que suas unhas curtas quase perfuraram a pele. Não era segredo, como Silvia fazia questão de lembrá-la, que era uma péssima mentirosa. Mas Alana era uma boa escritora, e por isso redigira à mão todas as mentiras que pretendia articular, uma a uma, em ordem de significância.

E ela diria as mentiras como se declamasse os maiores poemas já escritos, e ele acreditaria.

Ou era o esperado, ao menos.

Tomás Barth vestia uma camiseta branca simples, um par de mocassins e shorts escuros, dobrados acima do joelho. Alana riu internamente do comentário ferino que Brenda faria sobre ele ser um maldito metido a europeu sofisticado, antes de prestar atenção em como a luz do sol dourava o topo de sua cabeça e seus cabelos escuros. Era como se o sol fosse parente da íris de seus olhos, e essa era sua coisa favorita sobre ele.

Costumava ser. Ela quase almejava ainda enxergá-lo da mesma forma de antes, através da própria inocência. Mas os olhos de uma garota, uma vez abertos, nunca deixarão de perceber o que está diante deles; e toda inocência, uma vez rompida, jamais poderá ser retomada.

Quer dizer, não é como se Tomás não fosse mais um homem atraente a seu ver (ele era atraente e ponto final), só que agora ela o admirava como se admira um retrato. Adicionado ao fato de que ela não gostava do que era retratado. Ela sentia por ele o que sentia pelas garotas bonitas e babacas do Colégio: beleza não era o suficiente para tirá-la de seu tédio profundo e infinito.

Não Confie Nas Boas MeninasOnde as histórias ganham vida. Descobre agora