CAPÍTULO CI

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A Revolução Dálmata

Foi Virgília quem me deu notícia da viravolta política do marido, certa manhã de outubro, entre onze e meio-dia; falou-me de reuniões, de conversas, de um discurso...

— De maneira que desta vez fica você baronesa, interrompi eu.

Eladerreou os cantos da boca, e moveu a cabeça a um e outro lado; mas esse gestode indiferença era desmentido por alguma coisa menos definível, menos clara,uma expressão de gosto e de esperança. E não sei por que, imaginei que a cartaimperial da nomeação podia atrai-la à virtude, não digo pela virtude em simesma, mas por gratidão ao marido. Que ela amava cordialmente a nobreza; e umdos maiores desgostos de nossa vida foi o aparecimento de certo pelintra delegação, — da legação da Dalmácia, suponhamos, — o conde B.V., que a namoroudurante três meses. Esse homem, vero fidalgo de raça, transtornara um pouco acabeça de Virgília, que, além do mais, possuía a vocação diplomática. Não chegoa alcançar o que seria de mim, se não rebentasse na Dalmácia uma revolução,dolorosa, formidável; os jornais, a cada navio que chegava da Europa,transcreviam os horrores, mediam o sangue, contavam as cabeças; toda a gentefremia de indignação e piedade... Eu não; eu abençoava interiormente essatragédia, que me tirara uma pedrinha do sapato. E depois a Dalmácia era tãolonge!

Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora