CAPÍTULO XLV

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Notas

Soluços, lágrimas, casa armada, veludo preto nos portais, um homem que veio vestir o cadáver,outro que tomou a medida do caixão, caixão, essa, tocheiros, convites,convidados que entravam. Lentamente, a passo surdo, e apertavam a mão àfamília, alguns tristes, todos sérios e calados, padre e sacristão, rezas,aspersões d'água benta, o fechar do caixão a prego e martelo, seis pessoas queo tomam da essa, e o levantam, e o descem a custo pela escada, não obstante osgritos, soluços e novas lágrimas da família, e vão até o coche fúnebre, e ocolocam em cima e traspassam e apertam as correias, o rodar do coche, o rodardos carros, um a um... Isto que parece um simples inventário, eram notas que euhavia tomado para um capítulo extremamente suculento, em que provava que aterra deve continuar a girar em volta do sol; porquanto: — a) a natureza nãoinventou a morte, senão com o fim de dar vida a algumas indústrias — armadores,segeiros, empresas funerárias, tipografias, e outras que ela sagazmente previu; — b) mortas essas indústrias, pela ausência da morte humana, não é improvávelque viessem a morrer os respectivos industriais; o que dava na mesma. Mas tudoisto são apenas notas de um capítulo que não escrevo.

Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora