Entry #3

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As filmagens a seguir são das câmeras de segurança do departamento do Hospital Metropolitano de Boise, em Idaho. Foram vazadas pelo conteúdo peculiar que se estendem por vários minutos; na internet viralizou instantaneamente, chegando a quase dez milhões de visualizações no YouTube.

O responsável por disponibilizar na internet o conteúdo dos vídeos fora afastado do cargo, tendo em mente que a exposição neste estilo está contra o regulamento da empresa.

Hospital Metropolitano de Idaho

Câmera 19, ala de repouso

23h12 p.m.

Vivian estava sentada em sua cama, no mesmo cubículo que Harrison e Billie estiveram algumas horas mais cedo naquele dia. Parecia apreensiva, como se alguma coisa pairasse sobre o teto. De fato, havia, uma massa escura similar à sombra de uma pessoa. Descia do canto da parede e serpenteava por toda sua extensão.

A garota, que outrora fora tão bela, agora estava com a aparência desleixada; lábios ressecados, cabelos opacos e oleosos, palma da mão enfaixada por gazes, olheiras profundas e olhos inchados. Ela olhava do teto para a porta de entrada de seu quarto.

Havia alguma coisa na atmosfera, algo maligno. Mesmo que estejamos vendo apenas uma filmagem, podemos sentir ela tomando força, cada vez mais. E Vivian sentia aquela mesma presença. A garota o temia.

As luzes fluorescentes acima de sua cabeça começaram a piscar; ligando, tremeluzindo e, na sequência, se apagando. Ficando alguns longos segundos na tremenda escuridão.

A jovem fechou os olhos e levantou as mãos na altura dos seios, de modo que fizesse suas duas palmas enfaixadas se encontrar. Como em uma prece. Ela estava orando.

As luzes ainda piscavam; a porta, que estava entreaberta, pareceu se mover alguns centímetros, mas bem poucos, de modo quase imperceptível a olho nu; o lençol da cama remexeu-se e, com extrema violência, fora arrancado e jogado na parede em frente ao leito.

Vivian gritou e tentou sair da cama para correr para fora do quarto, e até conseguiu dar alguns passos, mas fora impedida quando ela bateu rudemente no batente, trancando-a; fazendo a câmera chacoalhar.

A lâmpada no teto explodiu. Choveu cacos de vidro por todo o quarto. Tudo se tornou escuridão após isso.

Hospital Metropolitano de Idaho

Câmera 22, ala de repouso

00h33 a.m.

A porta do quarto de Vivian, que ficava ao lado esquerdo da câmera, abriu-se. Duas enfermeiras e uma médica passaram pelo corredor conversando e rindo. Logo atrás, um zelador arrastando um carrinho de mão contendo sacos de lixo, esfregão, vassoura e rodo, trocou algumas lixeiras próximas das fileiras de bancos de madeira onde as pessoas ficavam sentadas durante o horário de visita; naquele momento, tudo estava deserto. Após três minutos e lixeiras completamente esvaziadas, o homem marchou, seguindo o seu caminho, desaparecendo do campo de visão.

A câmera 22 pareceu sofrer alguma interferência; chuviscos digitais borraram a tela, distorcendo a imagem. Quando a tela voltou a ficar estática, Vivian estava parada, ereta, do lado de fora no corredor, encarando o vazio e fazendo movimentos circulares com suas mãos. Igual fazemos quando passamos muito tempo escrevendo e nossos pulsos estão doloridos.

Quando caminhou, seus passos pareciam estranhamente semelhantes ao andar de algum animal; quando firmava seus pés no chão, o corpo acompanhava o balanço de suas pernas, parecendo que a garota trotava no lugar. Talvez estivesse com dor no joelho. Quem iria saber?

Mas se olharmos o histórico acadêmico da jovem, saberíamos que não; tendo em mente que Vivian corria todas as maratonas de sua universidade nas vésperas de páscoa, poderíamos julgá-la uma corredora-nata. Com isso, poderíamos afirmar que ela não possuía problemas nos joelhos. Caminhar era a sua vida, e ela caminhou bastante naquela noite, as câmeras 24, 25, 28, 31 e 33 provaram isso, e ninguém ao menos a notou ali, na empreitada da noite, perambulando por áreas autorizadas para somente funcionários.

Hospital Metropolitano de Idaho

Câmera 33, elevador de serviço

02h06 a.m.

Ela andou por horas, chegando ao elevador de serviço. E, como em um transe hipnótico, a garota pareceu despertar. Tateou as paredes, confusa, e cobriu a cabeça com os braços enquanto chorava e dizia algumas palavras que, por motivos das gravações não possuírem áudio, não fora possível compreender.

Vivian se recuperou e correu em direção ao elevador; entrou dentro, apertando desesperadamente os botões de forma compulsiva. Estas filmagens são as do próprio meio de locomoção entre andares, filmagens internas.

A porta ameaçou fechar e Vivian encostou em uma de suas extremidades, parecendo prender até a própria respiração. Entretanto, a porta automática abriu novamente e permaneceu assim pelos longos minutos que se passaram. O dedo indicador da mulher apertava o botão para que fechasse, mas o comando simplesmente não acontecia.

Dando-se por vencida, fez o sinal sagrado, terminando com um leve toque de seus dedos nos lábios.

As luzes do corredor oscilaram e apagaram-se. Toda a fonte de luz de Vivian naquele momento vinha do painel contendo os números do elevador.

A imagem fora interrompida logo em seguida.

Hospital Metropolitano de Idaho

Câmera 57, terraço

02h44 a.m.

A porta de metal explodiu, fazendo a corrente de ferro voar pelo ar em pedaços. Vivian entrou no terraço andando da mesma forma estranha de antes. Caminhava em direção ao limite do prédio com a cabeça inclinada para trás de maneira tão aterrorizante que seu corpo se inclinava em um ângulo de 190º.

Com o braço direito estendido para a frente do corpo, ela continuou avançando.

A câmera de segurança da cobertura filmou o exato momento que a jovem olhou diretamente para a lente da filmadora. Seus olhos eram totalmente leitosos, sem a íris. Sua língua estava para fora da boca e as pernas arqueadas desproporcionalmente. Seria uma cena que fanáticos na internet assemelharia ao "Exorcismo de Emily Rose", só que com mais intensidade.

Vivian subiu em uma mureta de proteção no parapeito e olhou para baixo; A câmera novamente chiou. Para quem sofre de pareidolia aguda, talvez tenha consigo ver um rosto demoníaco na gravação em questão de segundos.

Um guarda apareceu no terraço, com a mão direita apoiada no coldre, pronto para atirar se notasse que fosse bandidos, mas logo a tirou, correndo para cima da garota, tentando impedi-la de cometer tal atrocidade.

O pescoço de Vivian virou-se em direção ao som dos passos. Com apenas um movimento de mãos, ela o jogou de costas no concreto, nocauteando-o.

O guarda passa bem desde então, mas não se recorda do ocorrido naquela noite.

A moça abaixou o braço, inclinou a cabeça ainda mais para trás e fez alguns movimentos com a perna, como se alguma força dentro de Vivian estivesse lutando para retomar o controle do próprio corpo, porém foi em vão. Seu corpo se inclinou para baixo, e, com um movimento brusco, ela pulou; vinte andares acima do limite do asfalto.

Uma morte rápida e certeira. Naquela madrugada, Vivian Patterson deixou de existir em nosso plano. Marcando Harrison com a perda para sempre.

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