Com a mão que estava livre a senhora puxou de dentro de seu avental um anel fino com uma pedra escarlate no topo. Colocou no dedo de Pandora.

- Não tire, meu bem, esse é o teu chamado, tua proteção! - O coração apertou, não era medo, na verdade sentia que confiava naquela forma estranha que a prendia pelo pulso, mas ao mesmo tempo sentia que não queria ter ouvido o que ouviu.

Seu braço foi liberado.

- Eu peço desculpas, mas não entendo, eu já estive aqui... isso... isso é um sonho? - Teve que reunir coragem para perguntar.

- Sim meu bem, mas tudo que falei é real. Você realmente tem belas mãos.




Mesmo com os olhos fechados sentiu a extrema claridade do lado de fora.

- Ei acorda, chegamos! - A lateral esquerda de seu corpo foi empurrada.

Levantou o tronco e viu o mar, nem precisava tê-lo feito para saber que tinham chegado, o som das ondas era notório e inconfundível. Sentiu alívio imediato. E com o alívio se lembrou porque se sentirá aliviada. Esse é o lado ruim de coisas boas. Você só sabe o que é felicidade quando sabe o que é tristeza, assim como Pandora só se sentiu aliviada porque minutos antes estava angustiada, sabedoria antiga que é vendida em banquinha de jornal, não me dê muito crédito. A menina olhou rapidamente para a mão e viu lá algo que não tinha visto a um mês, desde a tarde do aniversário de Gustavo, um anel enfeitando seu anelar esquerdo a encarava de volta.

- Eu acho que tive um pesadelo... - Confessou tentando não parecer uma criança assustada.

- Eu acho que estou matando serviço para ir a paia. - Gustavo a olhou sem esperar por uma reação afetuosa.

- O que você quer dizer com isso?

- Quero dizer que é algo normal, relaxa. A gente está na praia, deixa as paranoias para São Paulo.

Pandora sabia que o amigo tinha razão, mas então por que não conseguia relaxar? Seria o anel que jurava ter jogado fora e agora de novo estava em sua mão? Em sua bela mão, corrijo. Sentiu o rosto ser tomado pelas palmas do amigo, quase em forma de concha espremendo as bochechas fazendo-a sentir como se tivesse menos de 10 anos.

-Deixa as paranoias para São Paulo. - falou pausadamente dando um beijo na testa da menina a cada palavra dita.

Bufou antes de abrir a porta do carro. Ao sair olhou novamente para o anel, sibilou tirar-lhe do dedo e as palavras voltaram a mente como um filme "Não tire, meu bem, esse é teu chamado, tua proteção! ". A mão recuou e teve medo dos próprios pensamentos. Sacudiu a cabeça tentando achar a razão, deixou o anel na mão como superstição, largou a paranoia guardada no carro e foi aproveitar o dia. Ia tudo ficar bem. Ia.




Algumas pessoas corriam para terminar a organização antes que a primeira leva chegasse. Um clima de excitação contaminava a atmosfera. Na clareira principal havia uma espécie de altar, o cheiro de pinheiros predominava, o vento tinha decidido levar e trazer aromas naquele fim de tarde, a fogueira já tinha sido acesa e as pessoas tinham começado a sentar, de fundo persistia aquele murmúrio de várias pessoas falando ao mesmo tempo. Todos pararam quando viram ela chegar. Uma capa com cores que lembravam muito o pôr do sol cobria-lhe as costas, o busto era revestido de uma túnica trabalhada em finos detalhes com linha de ouro, na barra da peça flores tinham sido bordadas com cobre. O corpo era alto e esguio, beirando quase aos dois metros. A face dura de feições finas não tinha emoção. Os pés caminhavam com propriedade que só a última da espécie teria, com serenidade se posicionou no altar e começou o discurso.

Despertar - Batalhas InvisíveisOnde histórias criam vida. Descubra agora