O criador

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 Amanda saiu correndo pela porta e a bateu com força, e eu me sentia triste... eu estava muito mal, eu precisava correr atrás dela mas as pequenas mãos de Ib seguraram meus braços, ela queria que eu ficasse. Era mais fácil na galeria quando eu... fui insensível. 

—Ela está sozinha Ib, por que temos que deixá-la de novo? —Suspirei e encarei a pequenina me sentando na mesa novamente.

— Você ainda acha que ela é Mary? Ela jamais poderia ser, se bem que... de uns tempos pra cá ela não tem sido mais tanto assim minha amiga.

—Seja lá do que estão falando, aquilo é um espírito materializado possuindo um corpo. Eu não sei como explicar, ela não é um espirito que morreu que está atormentado, ela é a personificação de sentimentos ruins, talvez de algum desejo... ela parece ser um espirito velho, bem velho. 

—É possível que ela seja o espirito de um quadro? —Ib perguntou.

— Eu precisaria fazer uma consulta com ela para entrar em seu subconsciente e tentar tirar algo dela, mas é estranho... eu nunca vi algo assim. Eu tenho certeza de que ela não é humana, mas tem desejos de uma. —Ele fez uma pausa. —Vocês tem ideia de algum desejo ou ambição que ela possa ter?

— Ela é um dos quadros de Gueterna, a conhecemos na galeria em seu mundo... ela parecia desesperada para sair de lá, parecia desesperada para ser amiga de Ib e eu sempre achei que ela me olhava com desprezo... mas eu não sabia porquê.

— Se ela queria sair do mundo dela, conseguiu, mas algo me intrigou agora. — Ele suspirou. — Gueterna, há vários boatos de que ele era envolvido com ocultismo, é um pintor bem antigo. 

— O que isso quer dizer? — Ib parecia curiosa, espero que ela não surte ou desmaie.

— Se ela sentiu raiva de Garry, talvez você tenha sido Gueterna na vida passada. Quando fizemos sua consulta havia muitas coisas que você não podia me contar, por exemplo como você morreu, ou como ficou famoso do nada, ou da onde herdou o dom de pintar...

— Não faz sentido, se eu fosse Gueterna ela não iria querer estar se envolvendo amorosamente comigo, quero dizer... se eu a pintei eu sou como o pai dela, afinal eu a criei.

— Talvez para se vingar, esse seria um ótimo jeito de se aproximar. —Bufou. —O que me intriga é que a mulher que está tendo seu corpo usado por ela parece ter certa afinidade com o espírito, ela autorizou que o quadro do qual estamos falando usasse seu corpo, mas ela está há tanto tempo lá que as memórias da pessoa possuída já foram bagunçadas completamente. Se me chamou para que eu tirasse ela de lá, não vou poder ajudar.

— Você... por favor a chame de Mary, esse é seu nome. — Eu falei sem olhar para o Dr, me senti culpado, eu fiz com que ela de novo se sentisse de lado, se eu for mesmo Gueterna eu abandonei minha pintura por tanto tempo... 

—Não é sua culpa, nessa vida você é você. Não precisa ir atrás dela... — Ib segurou minha mão, tentando me acalmar.

—Ib... não teria sido melhor se Mary tivesse saído com a gente também? Eu soube que ela era um quadro e temi o pior, quis me livrar dela, eu sou o problema de tudo. Se ela pensar mesmo que eu sou o seu criador, isso faz de mim um péssimo pai.

— Você não é o Gueterna, você está louco! Esse negócio de vida passada as vezes nem é real Garry. Vamos apenas ficar juntos e deixar a galeria para lá, já não sofremos de mais com isso?

— Ela não é sua amiga?! Está com medo agora porque ela é um espírito cheio de ódio e tristeza? Que se foda isso, já não a abandonamos de mais? ELA TINHA SÓ NOVE ANOS, COMO VOCÊ IB.

— Você tem razão... mas prometa que não vai deixar nenhuma de lado?

— Eu prometo, por favor leve Dr. William até a saída, eu vou correr atrás dela. —Corri o mais rápido que pude na esperança de que ela não estivesse longe, estava chovendo, isso dificultaria um pouco as coisas, mas... não posso acreditar que ela seja ruim, não posso acreditar que... ela vá me odiar pela eternidade.

Eu me lembroOnde as histórias ganham vida. Descobre agora