- Rafa... – Falei, chorando com as palavras dele. – Eu não queria esconder nada de você. Briguei com a sua mãe pra que ela contasse a verdade ou eu o faria.

- Mas não o fez. – Sentenciou e não parou mais, mesmo com todas as vezes que chamei seu nome, mesmo eu o tendo seguido até a rua. Ele não voltou pra casa dele, nem pra minha, nem apareceu na faculdade no dia seguinte. Também não esteve no estágio e não respondeu nenhuma das minhas mensagens. Eu sei que ele não estava em nenhum desses lugares porque eu fui a todos e cada um deles, procurar por ele. Não estava falando direito com meu pai, muito menos com Cíntia, porque ainda estava com raiva deles, por terem escondido isso dele por tanto tempo, por terem me feito esconder também. No final de semana, resolvi ir até a casa dele novamente, caso ele tivesse aparecido. Cíntia estava péssima, mas não estava preocupada com o sumiço dele, o que só poderia indicar que ela sabia onde ele estava.

- Ele não quer ver ninguém. – Ela falou, com a voz chorosa. – Nem você. Sinto muito, Isa. Não queria que as coisas estivessem acontecendo assim. Não imaginei também que ele fosse ficar tão chateado com você por isso. Não faz muito sentido pra mim. – Ela comentou, fungando, mas não deu muita importância ao assunto, com a cabeça cheia de outras coisas mais importantes, já que o relacionamento dela com o filho era mais importante que o meu com ele. Se ela tivesse com a cabeça fria talvez tivesse percebido o porque de ele estar com tanta raiva de mim também. Porque importava. Porque ele gostava de mim e eu o tinha decepcionado. – Eu só queria que ele entendesse que somos adultos e sabemos o que estamos fazendo.

- Vocês são adultos? Sabem o que estão fazendo? – Finalmente abri a minha boca, incapaz de me segurar diante daquela informação. – Me desculpe, Cíntia, mas eu não vejo diferença nenhuma entre vocês e as pessoas da minha idade, tão perdidos e sem saber o que fazer com a própria vida quanto. Vocês acham que porque viveram alguns anos a mais que nós sabem o que estão fazendo? Eu só vejo vocês cometerem erros, se magoarem e se decepcionarem tanto quanto nós. Estão lado a lado conosco, em busca da felicidade e de respostas para perguntas que não acabarão nunca. – Levei um susto quando ela me abraçou.

- Você é muito especial, Isa. – Me deu um beijo na testa e segurou meu rosto entre suas mãos. – Tão nova e entende muito mais da vida do que muito adulto por aí. Inclusive eu, eu acho. Você tem razão, não sei o que estou fazendo. Só estou tentando ser feliz. – Naquele momento senti pena dela. Estive julgando seus atos esse tempo todo, pensando somente nas coisas que ela estava escondendo do Rafa e em como ele ficaria magoado com ela. Mas esqueci de pensar que nesse meio todo havia uma mulher, que havia sido abandonada e que agora tinha essa pessoa novamente em sua vida. E seja lá qual fosse a explicação do abandono, ela parecia disposta a perdoar e tentar de novo. Sempre correndo atrás de uma felicidade que parecia estar correndo na direção contrária.

- Tudo bem. – Respirei fundo. – Onde ele está? Vou tentar ajudar. Mas não prometo nada. Ele não vai perdoar fácil. – Olhei rapidamente para a porta do corredor, onde o pai do Rafa havia aparecido e parecia tão arrasado e triste quando ela. – A mágoa dele por ter sido abandonado é muito grande, ele... – Desviei o meu olhar pro tapete, sem coragem de dizer o que havia chegado na ponta da minha língua.

- Ele o quê? – Carlos deu um passo à frente, ansioso pra saber o que eu tinha pra dizer.

- Ele... – Seria um choque ouvir aquilo, mas eu queria que eles soubessem o quão difícil seria amolecer o coração de Rafa para deixar o pai entrar novamente. Se é que aquilo aconteceria um dia. – Ele preferia ter perdido o pai, como eu perdi minha mãe, a ter um pai que não o quis. – Cíntia começou a chorar e eu pensei se não tinha sido dura demais ao contar aquilo.

- Me ajuda, Isa. – Ela falou, entre lágrimas. – Se ele falou sobre Carlos, é porque confia em você. Eu devia estar cega que não vi o que estava acontecendo debaixo do meu nariz.

- Do quê você está falando? – Perguntei, sem entender. Ela sorriu, mesmo chorando.

- Nada, deixa pra lá. Ele está na casa da avó dele, você sabe onde é, já foi algumas vezes. Se ele se negar a falar com você, insista. Só você vai conseguir fazer com que ele aceite isso.

- Eu tenho minhas dúvidas. – Falei, abrindo a porta da cozinha pra sair.

- Eu não tenho mais. – Ela tinha ficado estranha de repente. Ignorei e saí, o mais rápido possível do prédio, pegando um táxi que me levasse até a casa da avó dele. E não sairia de lá até que ele aceitasse falar comigo e me desculpasse. Nem que eu tivesse que dormir na calçada dela pelo resto da vida.

Cheguei em Jacarepaguá relativamente rápido, considerando que era sábado, direção contrária da praia, então o trânsito estava milagrosamente fluindo bem. Parada na frente do portão de ferro da casa dela, toquei a campainha e não demorou muito pra que ela viesse abrir.

- Mocinha. – Ela me recebeu com um sorriso, o que indicava que não sabia que o neto estava com raiva de mim e provavelmente não queria me ver. E me chamava de mocinha porque nunca lembrava meu nome. Abriu o portão de ferro e deixou que eu entrasse. – Vou chamar o Rafa. – Me deixou na porta da casa e sumiu no corredor. Alguns minutos depois ela voltou devagar, com uma carinha triste e eu já sabia o que ela tinha pra dizer.

- Ele está indisposto. – Indisposto, ok.

- A senhora pode falar pra ele que eu só vou embora se ele falar comigo. – Ela me olhou com pena e se virou devagar pra andar o corredor novamente. – Me desculpe.

Quando ela voltou, eu não tive coragem de fazê-la andar tudo novamente só pra dizer que eu estava falando sério, não iria embora enquanto ele não falasse comigo.

- Não vou fazê-la de portadora de recados. – Falei séria. – Não precisa voltar pra me dar a resposta dele. Mas só o diga uma coisa: eu não vou embora. – Saí da casa e passei pelo portãozinho de ferro, mas parei ali e sentei no chão. Umas quatro horas mais tarde, dona Consuelo saiu e me entregou dois sanduíches, um pedaço de bolo e um copo de suco.

- Ele está muito magoado, mocinha. – Ela disse antes de entrar. – Mas a culpa não é sua, uma hora ele vai entender. – Então ela sabia e estava do meu lado, sorri triste e agradeci o lanche, que na verdade era meu café da manhã e almoço. Mandei uma mensagem pro meu pai, dizendo que estava na casa da Bia e que talvez fosse dormir lá. Ele não gostava que eu ficasse assim na casa das minhas amigas, sem pedir com antecedência, mas com o tempo ele estava se acostumando ao fato de que eu era mesmo maior de idade e algumas coisinhas não fazia sentido proibir, como me deixar ficar na casa de uma amiga, por exemplo. O que ele não podia saber era que eu estava na verdade sentada no chão da calçada da avó do Rafael há mais de sete horas, que estava começando a escurecer e que eu não pretendia sair dali, nem pra dormir em um lugar mais seguro. Rafael era teimoso, mas eu era muito mais. Ele já deveria saber disso.

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Nota: Mil desculpas pelas duas semanas sem atualizações, eu estava viajando e sem acesso ao meu livro pra poder postar. Sei que não tem desculpa e que não haja uma próxima vez, mas se houver e quiser saber meu paradeiro, me segue no Instagram @stefania_ak , prometo muitas fotos de bebê, cachorro, comida e alguns lugares legais. 

Agora, sobre o capítulo... espero que gostem e comentem o que acham da situação. É bem delicado lidar com confiança e nem todo mundo é bom em perdoar. Mas quase sempre é bom também falar a verdade, mesmo que vá magoar. Vamos ver o que o Rafa pensa sobre isso tudo...

Stef Raducanu

Ele e Ela [Os Dois Lados da História] [COMPLETO]Where stories live. Discover now