[28] RAFAEL

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Fiquei parado igual a um babaca olhando para a cara dela, sem saber o que dizer. Sinceramente, o que se responde ao descobrir uma coisa assim? Eu não fazia idéia do que dizer para ela. Milhares de coisas passavam pela minha cabeça, lembranças, nossas brigas e eu me peguei tentando analisar se em meio à qualquer uma daquelas brigas haviam indícios ou pistas de que ela ainda pudesse gostar de mim de alguma forma. Aquilo era impossível, muito anos haviam se passado afinal. E mais uma vez eu me perguntei porque era relevante ela ainda gostar de mim ou não. Certamente viraria nossas vidas de cabeça para baixo e tornaria tudo, toda a convivência muito mais complicada. Mas o pior foi a sensação ruim que eu senti ao pensar que ela não gostava mais de mim. Abaixei a cabeça, escondendo meu rosto nas mãos e fiquei assim por um tempo pensando que eu precisava parar de pensar nela daquela maneira. Por que saber que ela poderia não gostar mais de mim me fazia ficar tão chateado? Eu queria que ela gostasse de mim? Não, não. Eu não posso estar começando a gostar dela. É óbvio que ela me odiaria até o fim da vida, me abominaria por sequer pensar nela dessa maneira agora que nossos pais estavam juntos. Só mais alguns dias e logo eu estaria livre dessa convivência intensa. Tinha certeza que estava apenas confuso com todo esse lance de nos aproximarmos e começarmos a agir mais civilizadamente um com o outro. Mas eu também não poderia afastá-la completamente para me evitar de fazer merda, senão ela pensaria que eu estava com raiva pelo que ela havia me contado, e eu não estava. Não estava mesmo. Era infantil? Sim. Mas quem sou eu para julgar o que algumas palavras podem fazer com o psicológico de uma pessoa?

- Não precisa ficar desse jeito. – Ela parecia levemente ofendida com a minha reação. – Eu tinha dez anos, não sabia o significado de gostar de alguém. Fica tranquilo, esse sentimento está morto e enterrado. – Mas que droga, se ela soubesse que saber daquilo me fazia sentir muito pior.

- Eu não... – Voltei a olhar para ela, mas ela estava evitando me olhar. – Desculpa. Não estou assim porque fiquei com medo de você ainda gostar de mim. Afinal, seria uma coisa muito louca. – Não seria? Me diz que não, que não seria. Se ela dissesse que não achava uma loucura, talvez eu me convencesse que não era.

- Seria um absurdo. – Ela completou e eu mordi minha língua pra não falar nada.

- Exatamente. – Que raiva. – Mas... eu só fiquei sem palavras. Não queria te fazer sentir mal por isso. Eu não sabia que você gostava de mim. Isso realmente dá uma nova dimensão aos acontecimentos, na perspectiva de uma menina de dez anos.

- Não é como se tivesse feito muita diferença você saber que eu gostava de você. – Ela deu de ombros. – Eu tinha dez anos, que droga. Não teríamos sido namoradinhos nem nada. – Eu ri meio sem humor, imaginando a cena e ela acabou me acompanhando. De repente a gente estava rindo de verdade. Puxei seu ombro e a abracei de lado. Ela ficou um pouco tensa mas não se afastou.

- Desculpa. Se serve de consolo, você não se parece em absolutamente nada com a Dora, A Aventureira agora. – Ela riu. – A Dora é muito mais bonitinha. – Me deu um tapa e tentou se afastar, mas eu a segurei. – Tô brincando.

- Você continua sendo um idiota. – Falou rindo, me empurrando. – Me solta.

- Amigos? – Soltei Isadora do abraço e estiquei a mão para ela apertar. Eu não tinha escolha. O que eu poderia dizer? Sabe o que é, Isa, eu acho que estou começando a gostar de você e acho que não tem problema nenhum o fato de nossos pais estarem namorando, a gente poderia tentar fazer o mesmo. Ou falar que naquele momento eu queria muito beijá-la? Nem louco. Ela não parecia a pessoa mais contente do mundo ao concordar comigo, talvez ainda tivesse suas dúvidas quanto ao meu caráter, mas apertou minha mão mesmo assim.

- Fazer o que, né? – Pois é. – Não tenho escolha. – Não temos, né?!

Deixamos o parque logo depois, voltando para casa. Queríamos tentar chegar antes deles, para que não ficassem fazendo muitas perguntas. Afinal, ambos demos a desculpa que estávamos cansados e queríamos ir para casa. Não fazia sentido a gente ter continuado passeando então. Quando eles chegaram, estávamos os dois no sofá, vendo, finalmente, o resto do filme. Coisa que não havíamos feito em Paris. Acabamos saindo para jantar fora e a noite foi ótima. Os últimos dias de viagem passaram rápido e ao mesmo tempo que não víamos a hora de chegar em casa, dormir em nossas camas, não queríamos voltar pra rotina do dia a dia. Eu precisaria começar a procurar estágio, Isadora começaria a faculdade, ou esperava que sim, já que preferiu não saber os resultados que saíram na semana que viajamos porque não queria estragar as férias. O pai tentou argumentar que ela poderia usar as férias para comemorar, que deixasse de ser pessimista. A verdade é que ela estava nervosa, sabendo que suas amigas haviam passado, tinha medo de ser a única a ficar para trás. Tivemos, inclusive, uma conversa sobre isso dois dias antes de voltarmos para o Brasil.

Ele e Ela [Os Dois Lados da História] [COMPLETO]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora