Capítulo 46 - 4 de agosto (Sofia)

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4 de agosto de 2016

A lua há muito que tinha dado lugar ao resplandecente sol de verão. Mesmo assim, o calor que se fazia sentir era notório e foi ainda mais notório quando vi o Pedro, ao pé da estátua do Rodrigues Lobo, tal como me dissera minutos antes. Trazia por cima da pele bronzeada uma camisa branca e uns calções de ganga que lhe deixavam à mostra a perna tonificada pelo exercício.

"Que raio de pensamento, Sofia! Controla-te!", ralhei-me mentalmente.

Aproximei-me mais do sítio em que me esperava e apressei-me a saudá-lo.

- Olá! Desculpa o atraso...

Na verdade, até estava adiantada cinco minutos, mas a parvoeira tomava agora conta do meu cérebro. Não havia já nada a fazer. Só esperar que o rapaz não se assustasse. Claramente, que estou com um problema grave no raciocínio!

Abanei a cabeça, exausta já da maluquice, e, rapidamente, vi-o aproximar-se de mim. Mas a aproximar-se mesmo! Mesmo muito!

"Meu Deus! Vai beijar-me. Já? Logo no início? Ainda nem nos sentámos... Oh Sofia, porque raio querias tu estar sentada para ele te beijar?" pensei eu enquanto o olhava.

- Olá! Olha, que acho que estás mesmo errada... - disse-me, cumprimentando-me com um beijo.

UM BEIJO NA BOCHECHA! Não nos lábios.

Claramente, que o meu córtex estava com um mal funcionamento. E dos graves!

Concentrando-me no momento e abstraindo as ideias parvas que me assolavam o espírito, cumprimentei-o também com dois beijos rápidos e seguimos os dois para a esplanada mais próxima.

- Estás muito bonita... sim senhora! Sinto-me honrado!

Na verdade, estava com uma simples blusa, cortesia das Gémeas que não me tinham deixado sair de casa com o que tinha, e umas calças de ganga. Contudo, independente disso, só me poderia contentar com as suas palavras.

- Tu também não estás nada mal, deixa-me que te diga! – comentei, olhando novamente de alto a baixo para ele.

Ele pareceu corar com o gracejo e sentámo-nos, chamando o funcionário mais próximo.

- Queria um chocolate quente... - pedi, para o jovem rapaz que me sorriu.

- Serão dois! – proclamou Pedro, tirando os olhos do empregado de cima de mim.

Será que tinha sido de propósito? O seu tom de voz parecia confirmar...

- Estás muito cansada da corrida? – perguntou-me, mal o empregado virara costas.

- Por acaso até me sinto bem. Como se estivesse renovada, sabes?

Ele assentiu, sorrindo-me com os seus olhos traiçoeiros, que ora andavam entre o meu olhar, ora o meu peito.

- Compreendo perfeitamente! E ainda bem que te sentes assim. Amanhã, se quiseres, podemos repetir a dose. – convidou, claramente divertido, desviando a sua atenção para o telefone que dançava nas suas mãos.

- Nervoso com o convite? – atirei, entrando na brincadeira.

E pensei... "Porquê perder mais tempo? Qual o sentido? O verão não tarda em acabar. Tenho de aproveitar estes momentos." Momentos em que estou com um rapaz giro e simpático. Até o seu cabelo meio despenteado do gel lhe dava um ar meio que selvagem, meio adulto. Com isto quero dizer que, apesar desta "beleza" toda, também me sinto segura com ele. Sinto que há também "beleza" dentro dele.

- Nããooooo! Nada disso! – disfarçou, deixando o telemóvel cair em cima da mesa. – Mas aceitas? Quero dizer, queres ir correr comigo?

Na minha cabeça passavam agora fragmentos daquilo que as Gémeas me tinham revelado... ele com outra rapariga... E, mesmo sabendo aquilo que ele me provocava e fazia sentir, parte de mim não conseguia avançar para o que quer que isto pudesse sem saber o que ele tinha a dizer.

- Claro! – acabei por responder. – E a tua amiga do Anúbis? Também pode vir, se quiseres...

Sentia as minhas faces escaldarem e o meu coração ribombar dentro do meu peito. Nunca fora rapariga para dizer uma coisa destas desta maneira. E nem sei se poderia chamar ciúmes à minha reação. Mas, claramente, estava agora a explorar um campo completamente meu desconhecido.

Ele parecia também ter ficado sem resposta. O seu bronze parecia ter desaparecido, ficando lívido, e nem mesmo a quebra do silêncio o ajudou quando o empregado apareceu com as nossas bebidas quentes.

- Desculpa... fui brusca e...

Ele levantou a mão, fixando finalmente o seu olhar ternurento no meu.

- Eu já sabia que isto podia acontecer. "Este" assunto. Sim, estive com essa rapariga com quem as Gémeas me viram, mas eu não estava em mim, tinha bebido... e acho que bastante. O que te quero dizer foi que foi algo de passagem...

- Passagem?

"Será que eu também era de passagem?", fiquei a pensar...

Mas depois conclui "Ok, Sofia! Não sejas paranoica. Não sejas aquele tipo de rapariga parva e estúpida que não sabe ouvir e pôr-se no lugar dos outros".

- Não é isso! Meu Deus!

Ele parecia mais atarantado do que eu.

– O que quero dizer é que aconteceu. Não havia nada que me ligasse a ela, a não ser um curso. E ela já nem está cá. Era uma aluna de Erasmus. Um momento de passagem. Mas tu não o és... - confessou, quase num sussurro, desviando o olhar para o chocolate quente que ainda fumegava.

Nem tinha pensado o engraçado que era ele também beber algo tão quente em pleno verão. Seria um sinal? Ou teria ele pedido só porque eu o fizera?

Acabei também por beber do meu chocolate apreciando, não só o seu sabor, mas também as suas últimas palavras: que eu não era de passagem. Nunca ninguém me dissera isso. Nunca ninguém me tinha demonstrando, em tão pouco tempo, tanta ternura.

- Desculpa-me também, por favor. Não é normal este meu comportamento. Não de todo... Mas sim, vamos correr!

E foi assim! Tal e qual, meu diário.

Voltámos a combinar mandar mensagem pelo Messenger assim que estivéssemos prontos para sair de casa.

Agora estou aqui à espera, ansiosa e sem conseguir antever como se irão desenrolar as próximas horas. Do que iremos falar. Se nos vamos cumprimentar e despedir novamente com um beijo educado, mas ternurento.

"Estou pronto para sair!"

Como vão as coisas por aí, corredora?"

A minha resposta não tardou a seguir caminho e já estou verdadeiramente pronta. Menos mentalmente, falta essa parte, mas ninguém precisa de saber, pois não?

Beijinhos,

Sofia

P.S.: Ficas Comigo? (Nova Edição)Where stories live. Discover now