Capítulo 3

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Quase um ano se passou desde que Margarida chegou a Gramado, e, naquele sábado, ela e o primo ficaram completamente sozinhos.

Vânia, o esposo e as filhas viajaram no início da manhã para Gravataí, para visitar a mãe de Jonas, que completara setenta anos de idade naquele dia. O casal temia que a idosa, que padecia há alguns anos de câncer no intestino, não resistisse por muito mais tempo, tendo em vista encontrar-se cada vez mais debilitada.

Apesar do apego que Marcos tinha com a avó paterna, ele não quis acompanhar os pais, já que estava se preparando para o vestibular e não queria faltar o cursinho, justamente, para não perder a matéria que, desde criança, tinha maior dificuldade, e a qual havia recebido a pior nota em seu último simulado das provas: matemática. Aquilo, porém, não o desmotivou. Suas aspirações e planos a médio e longo prazo eram muito claros: ele queria ser médico e salvar vidas. Por isso, há quase dois anos, praticamente relegara a vida social para um segundo plano, a fim de dedicar-se ao estudo.

Após um momento de hesitação, Vânia decidiu que Margarida também ficaria, para cuidar dos serviços domésticos e da alimentação para Marcos. Afinal, pretendiam voltar no final da tarde daquele mesmo dia. Portanto, não havia motivo para preocupações, refletiu ela.

Quando estavam chegando a Gravataí, porém, o carro apresentou um problema mecânico que obrigou a família a pernoitar na cidade, já que o veículo só ficaria pronto na manhã seguinte.

Vânia ligou para o filho e o aconselhou a manter-se distante da prima, a não trair sua confiança. Nesse momento, ele teve vontade de dizer à mãe que não era nenhuma criança para ser tratado como tal, mas preferiu não criticá-la porque sabia que qualquer coisa que falasse apenas pioraria as coisas. Também reconhecia em seu interior que Vânia tinha motivos para ficar tão apreensiva em relação à Margarida, pois, de fato, estava cada vez mais fascinado por ela. Mas se sua mãe soubesse o desprezo que a garota lhe dispensara durante todo aquele dia, ela não se preocuparia, pensou, enquanto servia o próprio jantar.

Ele havia permanecido no curso por toda a tarde e, desde que chegou, às 18 horas, Margarida não saíra do quarto por nem um instante sequer. Também não fora jantar e muito menos para a varanda, como costumava fazer. Será que ela escutara, pela extensão do telefone, a conversa que tivera com a mãe? Ele não conseguiria dormir direito se não soubesse o que estava acontecendo. Embora a verdade fosse que há muito tempo queria conversar a sós com a prima.

Quando terminou de jantar, foi ao banheiro escovar os dentes; em seguida, deu algumas batidinhas na porta do quarto de Margarida, antes de abrir uma pequena brecha e perguntar:

— Podemos bater um papo?

Imediatamente, ela largou o livro que estava lendo e puxou o lençol, a fim de se cobrir.

— Agora?!

— Sim. Por quê? — perguntou, com ar desapontado. — Algum problema?

Era a primeira vez que ficava sozinha em uma casa com um homem, depois do que lhe acontecera. Por isso, ainda que ela não desconfiasse do primo, naquele dia, não conseguiu deixar de se sentir apreensiva.

— Não, mas... ahn...

— Prometo que não vou demorar.

Ainda que fosse evidente que continuava receosa, ela concordou:

— Ok. Entre.

Marcos se aproximou devagar, sem saber exatamente o que dizer. Estava decidido até o exato momento que chegou ali. Mas ficara confuso ao ver tanta cautela no olhar de Margarida.

Impossível esquecerOnde as histórias ganham vida. Descobre agora