Capítulo 7 - Estalagmite

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Era inegável que a emoção estava contagiando todos dentro daquela grande sala, mas os professores que haviam passado por maus bocados só conseguiam se olhar sem expressar nenhuma emoção

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Era inegável que a emoção estava contagiando todos dentro daquela grande sala, mas os professores que haviam passado por maus bocados só conseguiam se olhar sem expressar nenhuma emoção. Os dois sabiam que aquilo tudo era culpa deles, as mortes certamente foram o preço pago por eles pelo erro de não terem pensado melhor em abrigar aquela quantidade de alunos, então um olhar tão frio quanto o frio que os rodeava ali, naquele momento, era a única interação que os dois conseguiriam ter por um bom tempo, apesar da quantidade de danos sofridos pelos dois eles sabiam que aquilo não foi o suficiente para se redimirem com os alunos que acabaram sem querer matando de frio e dor.

Enquanto as duas primas se abraçavam e choravam os colegas ficavam lá, todos olhando a cena sem ter qualquer tipo de reação, com certeza aqueles jovens ainda estivavam em choque após a noite conturbada. Após um longo tempo de conversas e choro as duas finalmente entraram em consenso que deveriam estar abrigados para poder tratar dos feridos e de uma situação que ainda assolava a mente de Florence, que era como entrar no grande freezer, afinal ela havia saído para buscar ajuda e agora estava voltando para lá com pessoas para serem ajudadas. Aquilo fez com que o clima pesasse, mas logo foi quebrado à partir do momento em que o professor Jonathan saiu daquela sala de súbito com um certo tom de desespero e raiva na face, algo que ficou subentendido entre eles.

-Temos que ir – disse Florence à Alice, que ainda limpava as lágrimas do rosto e olhava para trás para ver se o professor ainda estava ali – Vamos, ainda temos algo importante para resolver antes de chegar lá.

Foram todos enfrentando a neve e o frio, que já estava se tornando algo estranhamente normal para alguns deles, após a noite congelante, aquela sensação estava cravada na vida deles para sempre. O professor Jonathan seguiu a frente em direção à cozinha, enquanto os outros seguiam logo atrás ouvindo Florence planejar uma forma de abrir a porta do grande freezer com Alice, que ainda estava se recompondo após o reencontro inesperado. Era fato que elas nunca pensaram em se reencontrar ainda mais depois de terem vivenciado a noite de terror. Elas pensavam na família e nos amigos, mas não queriam falar nada para não despertar ainda mais o desespero dos pobres colegas que a julgar pela aparência e pela expressão facial pareciam já terem morrido a tempos.

-Podemos usar talvez o maçarico para poder aquecer a porta – disse Florence buscando uma forma de poder abrir a porta de metal que os separava do conforto caloroso da grande sala.

-Talvez possamos aquecer a neve até virar água quente e jogar nos cantos para lavar o gelo e fazer a porta ser descongelada – Alice ainda carregava o pequeno botijão de gás consigo, ela havia contado à Florence que após conseguir reanimar o professor decidiu ir com ele ajudar os alunos do auditório, afinal eles achavam que os ventos teriam sido fortes demais para que o auditório pudesse suportar, porém não achavam que os danos sofridos pelos alunos não pudessem ser tão grandes como viram que foram. - E ainda precisamos pensar em uma forma de tratar de todos estes feridos.

A última coisa que Florence queria ver era o rosto dos colegas quando viessem que a ajuda que ela foi buscar não passava de uma dúzia de pessoas que precisavam ser ajudadas, então cortaram o imenso campo de neve que os separava da cozinha e quando chegaram perceberam o tamanho dos danos causados pela frente fria da noite passada. O grande telhado de zinco que cobria a grandiosa quadra esportiva da escola, levaram a tela para longe, mas ainda estava na escola, algumas pedras de granizo fizeram buracos em algumas paredes e telhados, assim como galhos pedras e outros objetos que foram trazidos de longe e atirados lá dentro da escola, e foi ai que todos viram que por pior que fossem os abrigos deles, se estivessem na rua ou fora dos abrigos as chances de sobrevivência eram mínimas.

-Então, como faremos para entrar no grande freezer? - Alice ainda não havia decidido com Florence como fariam – Podemos tentar aquecê-la com nossas duas formas, porém com o maçarico temos o risco de abrir um buraco nela, já com a água quente podemos acabar forçando seu enferrujamento.

-Deixem de ser idiotas – gritou professor Jonathan, ele parecia muito irritado, fazendo com que todos se assustassem e ficassem confusos, afinal ele deveria estar feliz por estar vivo. - Claro que na cozinha deve ter algum anticongelante, no pior dos casos algum álcool e isqueiros!

A cena foi deplorável, quando terminou de falar arrochou o manto que o agasalhava e seguiu para os bancos do refeitório que estavam repletos de gelo e neve, então sentou-se. Talvez ele quisesse ficar só, talvez quisesse parar de pensar um pouco ou apenas descansar da longa noite sofrida, mas no seu interior era só raiva e birra de uma pessoa egocêntrica que não aceitava ser derrotada por nada, ele, mesmo depois de tudo o que passou não deixou de ser o grande babaca, que sempre havia sido.

Florence adentrou a cozinha e se comunicou com todos dizendo o que havia acontecido com todos e que agora eles é quem precisariam de ajuda, então após minutos de conversa ela se prontificou de retirar uma parte da neve que cobria os armários da cozinha enquanto Alice agilizava a procura de algum liquido inflamável ou anticongelante. Acabaram por encontrar sacos e mais saco de sal, que posteriormente usariam para descongelar a neve e o gelo nos chão da cozinha e do refeitório, e então depois de muito debater começaram a aquecer a neve em uma grande panela com o bico de Bunsen e o maçarico para terem água quente que acabou não só servindo como solução para a porta, mas também acabou aquecendo os alunos que ainda aguardavam no frio do refeitório congelado com o vapor.

Quando elas terminaram de enxugar a porta com panos humedecidos com a água quente a ansiedade de rever os colegas já estava fazendo com que as duas quebrassem o gelo com as próprias mãos e quando finalmente a porta abriu o vento gélido lançou-se contra todos os que estavam dentro da sala, as expressões nos rostos dos colegas de classe de Florence não pareciam nada agradáveis, eles analisavam-nas dos pés a cabeça e então quando finalmente alguém teve a coragem para falar, Florence e os outros quase não acreditaram no que eles todos haviam determinado entre si mesmos durante sua ida ao auditório, Miguel se lançou à frente dos outros e disse:
-Nós decidimos que não vamos aceitar vocês aqui, se quiserem ficar com qualquer parte da escola podem ficar, mas não deixaremos que peguem nosso freezer e nossos mantimentos.

A expressão nos rostos do professores e dos alunos que estavam do lado de fora era única, era uma mistura de ódio e terror, quase parecida com um desespero mudo e súbito que se alastra quando algo extremamente ruim está por vir e foi o que aconteceu, a reação do professor Jonathan foi a última que se esperaria de alguém de sua competência, todos ficaram abalados e fragilizados com o que ele acabou por fazer.

CRYO - Volume 1 - Nova Era #Wattys2017Where stories live. Discover now