Capítulo 7 - Memories

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Acordei de manhã ainda pensando sobre tudo que vi e sobre a conversa que tive com Samuel no dia anterior. Como se fosse transmissão de pensamento, o bilhete costumeiro que ele deixara em cima do balcão da cozinha dizia:

"Vamos lá, Harry! Não desanime, tudo dará certo hoje. A propósito, gostei da conversa que tivemos ontem. Você é um cara legal, Styley, fico feliz por ter escolhido você. 
PS: Me desculpe pelo copo quebrado, já o concertei.

Samuel."

Ao lado daquele bilhete, encontrava-se um copo de vidro perfeitamente intacto. Olhei para a pá de lixo com a qual catei os cacos na noite passada, e ela estava vazia. Samuel havia concertado, não sei como – talvez tenha poderes mágicos de anjo. Sorri, impressionado com o feito.

Mas algo mais naquele bilhete me chamou a atenção. Samuel disse que estava "feliz por ter me escolhido". Ao ler aquilo, uma dúvida surgiu em minha mente.

Por que eu fui o escolhido?

O que será que eu estava fazendo ou pensando naquele momento, que levou o anjo a ter pena de mim e da minha noiva e nos dar uma nova chance para ficarmos juntos? Será que foi destino, que era pra ser assim? Será que alguém falou a Samuel que deveria ser eu? Difícil dizer. Acho que só Deus pode me responder isso, se é que ele existe.

Preferi deixar essas dúvidas de lado, afinal tinha um trabalho a fazer. Decidi seguir o conselho de Samuel e não desanimar, pois ainda me restavam duas chances para escolher a pessoa certa para o acidente. E eu preciso acreditar que conseguirei, já que Samuel confiou em mim pra isso.

Fui para a 5ª Avenida me sentindo determinado. Vasculhei diversos rostos na multidão, alguns que, depois de tanto tempo repetindo esse mesmo dia, já me eram até familiares. No entanto, alguém com quem nunca tinha cruzado o olhar me chamou a atenção.

Era um senhor de idade, que me parecia muito velho e doente. Ele estava tossindo e carregava um olhar triste no rosto, e aquilo despertou minha curiosidade. Decidi investigar sua mente e a história que ele carregava, e assim o fiz.

Arthur Hall era o seu nome. Tinha 85 anos, e muita história para contar. Ele parecia ser um idoso muito solitário. Sua esposa, Emily, a quem tanto amou e que até hoje domina seus pensamentos, já era falecida há muito tempo. Ele vivia numa casinha pequena em Nova York, com apenas dois quartos, sala, banheiro, cozinha e uma varanda aconchegante. Apesar disso, era um homem simpático. Possuía uma rotina diária, que consistia em acordar cedo, ir até a padaria para comprar sonhos de creme, dar uma longa e lenta caminhada pelo parque durante a tarde e depois voltar para casa para assistir o noticiário. Arthur tinha uma vida urbana e ordinária, e parecia satisfeito com a sua longa trajetória até aqui.

Aquele senhor tivera uma vida e tanto. Nasceu e cresceu no interior do Kansas, ajudando os pais e seus oito irmãos mais velhos a cuidar da fazenda que possuíam. Quando se tornou adulto, Arthur lutara na guerra e perdera seus pais numa epidemia de febre que aconteceu no campo enquanto estava fora. Mudou-se para Nova York com a esperança de uma nova vida, e foi onde conheceu sua tão amada esposa Emily, que trabalhava em uma livraria próxima a sua casa. Arthur trabalhou como operário em diversas fábricas, e fez isso até se aposentar aos cinquenta anos. Ele e Emily tiveram apenas um filho, chamado Thomas. Sua esposa o deixou há cerca de quinze anos atrás, devido a uma doença pulmonar, e então ele ficou sozinho.

Até ali, nada que me fizesse cogitá-lo como uma opção. Exceto pelo fato de que eu não conseguia prever o seu futuro. Parecia que havia uma espécie de bloqueio, algo que me impedia de ver o resto da sua vida. Tudo que eu vi não passou de flashes: uma risada feminina, cabelos loiros e uma carteira de motorista – foi tudo que consegui identificar.

Six | HARRY STYLESWo Geschichten leben. Entdecke jetzt