As crianças

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Olá.

Camila Cabello-Jauregui

Depois da descoberta da gravidez, os dias que se seguiram me foram confusos, acho que porque eu fiquei muito chocada, perdida e arrasada num tanto. Nunca em mil anos eu imaginaria que engravidaria antes de tanta coisa que eu planejava para minha vida. Eu não me sentia preparada, não me sentia capaz, eu era uma menina com vinte e três anos que queria desbravar o mundo. Eu só queria realizar meus sonhos primeiro, aproveitar o meu namoro, crescer, ter a minha independência, casar e ter a minha casa antes de sequer cogitar ter um filho. Mal tinha acabado a faculdade, estava entrando na Broadway, me preparando para estrear, realizar meu maior sonho e ainda faltava quase dois anos para Lauren ser totalmente dispensada da aeronáutica, mas aconteceu, foi um descuido nosso e eu não tinha a quem culpar além de nós mesmas. Lauren tinha muitas dúvidas sobre sua condição, realmente não sabia se seria capaz de engravidar alguém um dia. Fomos irresponsáveis. Eu tentava não sofrer, tentava não me cobrar tanto, mas era inevitável, a ficha não caia, eu não aceitava e me culpava por não aceitar.

Eu já tinha retornado para casa dos meus pais quando terminei a faculdade e lá continuei depois de descobrir a gravidez. Estava desempregada e o dinheiro que Lauren recebia mal dava para ela, ajudava financeiramente da forma que podia. Minha mãe me apoiou 100%, eu não sei o que seria de mim sem ela. Ela me cuidou, me paparicou, conversava, tinha toda paciência do mundo para me explicar tudo sobre a gravidez, só faltava me dar comida na boca. Meu pai levou dias sem falar comigo, totalmente revoltado, ele não aceitava que tudo o que ele tinha planejado para mim caiu por terra. Ele era o maior apoiador dos meus sonhos, era como se eu o tivesse decepcionado e isso me matava. Lauren chorava toda santa vez que nos falávamos ao telefone, estava insegura, com medo, dizia que não seria uma boa mãe, que mal sabia cuidar dela.

O quarto que antes era só meu passou a ser nosso, meu, dela e do bebê. Nos dias de dispensa, Lauren dormia comigo e me ajudava nas coisas. Vez ou outra ela e meu pai entravam em atrito, discutiam. Ela achava que ele passava na cara o fato de que ela me engravidou e não tínhamos nem onde morar, que vivíamos as custas dele. Eu entendia que era uma situação difícil para ela, era para mim também. Meu pai resmungava toda vez que tinha oportunidade, qualquer coisa era uma confusão sem necessidade, mas não tínhamos jeito a dar, era isso ou passar por mais dificuldades e eu levar a gravidez sozinha, porque ela não tinha como estar comigo todo dia. Foi nesse período também que Lauren decidiu que deveríamos fazer uma união estável, era mais rápido que o casamento e menos protocolado, me dava direito ao plano de saúde da aeronáutica e diminuiria as despesas altas que teríamos com médicos e exames, me resguardava em alguns casos também. Acho que também foi uma forma de mostrar a meu pai que ela era responsável, que me assumiria e que não estava brincando comigo.

Foi no terceiro mês que eu realmente aceitei que seria mãe e o nó em minha garganta e a pressão sobre mim se desfez um pouco, a nuvem negra saiu e o sol raiou. Foi ao ouvir os batimentos cardíacos do bebê que tudo realmente clareou para mim, eu entendi que as coisas não seriam fáceis, que eu precisaria de coragem e forças, dar o melhor de mim e não desistir independente do que estava por vir. Naquela consulta onde ouvimos os batimentos do bebê muita coisa mudou, nossas relações mudaram. Meu pai e Lauren fizeram as pazes. Meu choro naquele dia foi de alívio, foi de emoção, gratidão. Eu estava gerando uma vida, um milagre. Acho que o peso sobre os ombros de Lauren aliviaram também, foi a primeira vez que a vi sorrir com tanta leveza. Saímos da clínica direto para comprar o enxoval. Foi apenas algumas peças de roupas, mas foi com muito amor.

Eu comecei a ajudar meus pais no restaurante que eles têm até hoje de comida mexicana para amenizar um pouco as despesas que eles tinham comigo, era uma forma também de agradecê-los por ter nos aceitado e por todo o apoio. Eu até tentei procurar um emprego, mas não achava, ninguém queria contratar uma gestante que logo sairia em licença maternidade. Eu sequer tinha experiência em outras aéreas, eu era uma bailarina e só.

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