Escudeiro

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Após ser aceito como escudeiro, Sir Royce e eu seguimos para a capital, Roystone, onde o meu treinamento começaria. Não houve perguntas sobre onde eu estivera mais cedo ou sobre o que acontecera com o coração do cervo que eu limpara. Só houve tempo para lágrimas de minha mãe e um sorriso orgulhoso de meu pai.

Eu estava certo sobre comer e dormir melhor, mas o trabalho de um escudeiro se revelou mais árduo do que imaginei. Carregar o estandarte de meu senhor era o de mais leve que fazia. Além disso, era incumbido de carregar armaduras e armas, e também fazer a manutenção das mesmas, polindo metal e afiando lâminas. Cuidar de seu cavalo, lavando e alimentando o animal. Na iminência de qualquer torneio, partíamos apressados para a cidade onde o evento seria empreendido. Eu vestia Sir Royce em sua armadura e lhe entregava uma espada cega para combate singular ou uma lança de madeira com ponta de metal embotada para uma justa. Substituía suas armas e cuidava de seus ferimentos quando necessário. Todo o trabalho me rendeu músculos e calos por todo o corpo.

Mas nem tudo era apenas trabalho. Também aprendi muito. Fui instruído nas armas da guerra desde o inicio. Espada, adaga, lança e arco. Dominei a maioria de suas técnicas que me seriam úteis futuramente. Também aprendi a ler e escrever, atividades requintadas e raras demais para qualquer camponês. Nunca imaginaria que também me seriam úteis num momento vindouro.

O tempo passava e tudo isso se tornava insuficiente. Começava a sentir algo dentro de mim. Algo que me corroía profundamente. Ser apenas um escudeiro não bastava. Toda essa labuta já me parecia trivial e eu queria mais.

Foi por isso que me senti aliviado quando, depois de todo esse tempo, foi contado a mim que Keford estaria no caminho para o nosso próximo torneio. Com palavras suaves e olhar singelo convenci Sir Royce a pararmos na vila por dois dias, para que eu pudesse visitar meus pais. O homem acreditou e isso era tudo que eu precisava.


* * *


Nossa chegada foi vista com bons olhos pela maioria da vila, que ainda se lembrava do cavaleiro. Enquanto Sir Royce ficaria hospedado em uma pousada, eu visitaria minha família.

Meu pai continuava o mesmo, até mais feliz. Ter um filho como escudeiro era algo para se orgulhar e ter uma boca a menos para alimentar também não era nada mau. Já minha mãe parecia mais fraca que nunca. A doença sem nome continuava a apodrecer lentamente sua carne e órgãos.

Passei um bom tempo com eles, mas minha mente estava em outro lugar.

No final fui embora, me desculpando e dizendo que precisava ficar com Sir Royce o tempo todo, mas voltaria no outro dia.

Saí de casa, porém meus pés seguiram um caminho contrário ao da hospedaria. Eles me levaram para a floresta.


* * *


Passaram-se três anos desde a última vez que vira a cabana da bruxa. Diferente do lugar, eu havia mudado muito. Crescera em músculos e estatura. Meu cabelo negro já não era curto, mas caía sobre meus ombros. Imaginei que a velha não me reconheceria, mas é claro que estava errado.

− Ora, ora, se não é o pequeno – a bruxa falou quando cruzei a soleira da porta. – Você demorou... Hihihi...

− Não brinque comigo, velha! – enunciei em tom intimidador. – Quero saber o que você fez comigo.

− Eu não fiz nada, pequeno. Você que fez.

− Besteira! – gritei. – Eu não sou o mesmo desde que você me deu isso. – Mostrei-lhe o elo de metal preso a uma tira de couro ao redor de meu pescoço. – Eu pensava que ficaria feliz sendo um escudeiro e depois me tornando um cavaleiro, mas estava errado. Todo esse tempo algo em minha cabeça sempre me dizia que não era o suficiente.

A Ascensão de Ryne MeadowWhere stories live. Discover now