Capítulo 43 - O papel do agente

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A banda entrou sem demora em uma charrete espaçosa e confortável. Vermelha por fora e por dentro, tinha janelas diminutas cobertas por uma fina cortina azulada, depois da qual era possível ver, de uma forma borrada e imprecisa, a grande montanha aos pés da qual a cidade havia crescido. Circundavam-na devagar, com o transporte movendo-se lentamente pelas estradas cheias de irregularidades. A montanha não era inspiradora, bela ou mesmo a mais alta de Heelum --- era, contudo, notável baluarte de força bruta, intimidante.

A guitarrista permitiu que Beneditt, que sentava ao seu lado, segurasse sua mão. Leo conversava com Fjor, mas sua mente já pouco presente absteve-se ainda mais quando viu aquela cena. Tentando fingir que não vira nada, voltou-se para Fjor o tempo inteiro.

A paisagem mudou sem que percebessem; viam-se não mais envolvidos pela ambiguidade do centro, e sim por uma região de casas espremidas umas nas outras, compartilhando paredes e segredos. Crianças sem muitas roupas quentes ou, coincidentemente, muitos dentes, caminhavam nas sombras magras nas ruas, virando o rosto para a charrete com expressões retas, bocas mudas abertas para o lado. Na densa jir, arranjada em torno de uma praça, ficava um galpão amarelo de dois andares. A parede à direita da porta metálica, que parecia um improviso, estava suja e remendada com amontoados de madeira e pregos, mas nenhum deles se importou o suficiente para comentar em voz alta. O condutor da charrete confirmou o lugar, e avisou que estaria de volta para pegá-los no pôr do sol.

Leo foi o primeiro a entrar. Por dentro, o galpão era cinza com muitos minérios de luz azuis. Era alto o bastante para conter dois andares, mas tinha apenas um. O teto curvo era sustentado por colunas de corvônia distribuídas mais lateralmente, deixando um grande espaço central no qual estavam dispostos, em um círculo, os instrumentos musicais.

Um homem estava ajoelhado sobre o baixo de Fjor, terminando de afiná-lo. Vestia roupas simples, de sólidas cores neutras, e um gorro negro. Ele havia percebido que os músicos chegaram, mas nada disse. Levantou a cabeça, e então viram seu rosto cheio de dobras, marcado por um escuro bigode desalinhado e pequenos olhos escuros. Tornou a baixá-la. Os músicos se olharam, dando de ombros, mas terminada a tarefa o empregado levantou-se e veio, com um sorriso estanque, cumprimentá-los com apertos de mão.

--- Boa tarde! Meu nome é Mumba. Vou ser o técnico de som de vocês. Qual é o nome da banda?

--- Buscando, senhor. --- Respondeu Leo.

--- Ah, excelente, excelente! --- Respondeu ele, parecendo ansioso ao tentar olhar para os quatro ao mesmo tempo, sem sucesso. --- A maioria das bandas c-como vocês fica meio chateada quando ganha um técnico de som. Estão acostumadas a lidar com os próprios instrumentos. Vocês não se incomodam, não?

Leo balançou a cabeça, sem saber se deveria responder tão rapidamente pelos colegas. Beneditt vira de relance o rosto de Fjor enquanto Mumba arrumava o baixo e resolveu logo aplacar as coisas.

--- A-acho que não.

--- Ah, ótimo! --- Os dentes cheios de contraste se mostravam agora em seu sorriso quase frenético. --- Ótimo, ótimo... --- Ele fez um rosto de estupefação, como se agora se lembrasse de algo, e um abrangente gesto para trás com a mão. --- Querem tocar alguma coisa enquanto o senhor Seimor não chega?

--- Por favor... --- Murmurou Leila enquanto avançava com a cabeça baixa em direção à guitarra vermelha.

***

Já estavam na metade da quinta música quando Seimor chegou, fechando a porta e fazendo um sinal para que fossem até o final. Mumba ficara o tempo todo encostado em uma das colunas, observando-os sem sinais de reprovação --- mas sem, contudo, se entusiasmar muito. Viam sua cabeça balançar no ritmo da bateria, e só.

A Aliança dos Castelos OcultosOnde as histórias ganham vida. Descobre agora