Capítulo 24 - De Novo-u-joss a Dun-u-dengo

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Os quatro músicos da banda Buscando deixavam Novo-u-joss às oito horas em ponto da manhã do vigésimo-nono dia de inasi-u-sana. Subiram algumas colinas, passando por outras jirs mais ao norte, e logo chegaram a uma extensa ponte de corvônia por sobre o rio da cidade. Aquele era o Rio Pudro, cuja nascente ficava na Montanha Umejinsel, contornada pela estrada para o Oeste.

Beneditt carregava um conjunto mínimo da bateria, o que já era peso o suficiente para ele. Leila carregava as duas guitarras; a dela e a de Leo. Este, por sua vez, carregava a mala com frutas, verduras e pães compridos, quase roscas de tão secos. Fjor levava seu baixo e uma pequena mala com roupas. Recebiam cumprimentos alegres de trabalhadores das jirs por onde passavam, já que alguns os reconheciam como músicos. Sentiam-se curiosamente apreciados, invadidos por boas sensações de justiça e autoestima.

Com uma decisão de partir tão rápida, motivada por incidentes tão repentinos, eles não sabiam muito o que ou como pensar agora que estavam indo --- a despeito de todas as discussões. Não sabiam que tipo de público os esperava em Jinsel. A esperança variava entre eles.

--- Vamos passar pela floresta Inasi. --- Observou Fjor, olhando no mapa.

--- O que ela tem a ver com Inasi-u-een? --- Perguntou Beneditt.

--- Logo vamos encontrar um rio. --- Respondeu Fjor. --- o Rio Inasi. Nele a estrada se bifurca. Se formos para o norte vamos acabar em Inasi-u-een.

logo de Fjor demorou a chegar. Depois de horas de paisagens semelhantes e pessoas cada vez menos corteses, o desjejum parecia ter minguado completamente no estômago, e o entusiasmo de aguentar aquele ritmo de caminhada por dias a fio diminuiu consideravelmente.

--- Não está na hora de comer? --- Perguntou Leo, tentando não parecer muito cansado.

--- É melhor a gente comer quando chegar na floresta. --- Argumentou Fjor.

Ainda que os cedros e pinheiros começassem a ficar cada vez mais presentes, campos ermos mais limpos desenrolavam como tapete o mundo ao norte e ao leste. O caminho que até agora percorreram fizera a volta na Montanha Umejinsel, da qual começavam a ver a face norte, mais recortada que a oriental. Passadas as duas horas da tarde apenas chegaram ao que parecia ser o início da floresta de fato. Havia uma pequena clareira no ponto em que a estrada abria caminho por entre as coníferas, com folhas de um verde escuro, porém pálido. Compartilharam algumas frutas, sentados em um círculo, incertos sobre o quanto deveriam comer. Preferiram poupar o que tinham, comendo pouco.

--- E então, Beni --- chamou Leo. --- como foi ontem à noite?

--- Hmm... Bem. Meu pai não estava em casa... Mas falar com a mãe foi bom.

--- Isso é bom. --- Disse Leila, balançando positivamente a cabeça.

E a conversa terminou. Depois de planejar a viagem no dia anterior, entregaram-se ao palco de memórias da noite. Nenhum deles foi capaz de olhar para o futuro, na distância confortável e ameaçadora em que ele estava, sem tropeçar em um passado de peças incompletas. A mãe de Leo e Fjor fora embora há tempos --- assim como o pai, que foi primeiro. A mãe de Leila também foi, mas sabia-se que já não estava mais em Heelum. Não retornaria mais, nunca mais. O pai, viúvo, vivia em Rirn-u-jir cuidando de uma família que tinha entre os membros mais doentes que sãos. Há algum tempo não se viam, pai e filha.

Beneditt, no entanto, tinha os dois pais vivos. A mãe, Serena, era uma atriz. Ficava em casa a tempos comparáveis aos do pai. Beneditt não sabia se deveria sentir alívio ou inveja ao olhar para os amigos. Sentia-se culpado por pensar daquele jeito, mas sempre que o fazia sorria com uma rápida expiração pelo nariz, abaixando os olhos para as mãos, como num cacoete; lembrava da imagem difusa da mãe levando pela mão um menino como ele. Com um cabelo como o dele, com uma roupa como a dele, caramelo, densa, de mangas e pernas longas. Ele resistia, começando a espernear. Serena, com uma expressão de profundo incômodo, lançou-lhe um intenso olhar verde, e as pupilas logo dilataram-se no reconhecimento de um erro. Depois o par de olhos que Beneditt herdara, mais calmos, voltam-se para o ponto de vista, e a farra musical da festa de torn-u-sana some numa nota que ecoa, polêmica, mais alto que o resto do arranjo.

A Aliança dos Castelos OcultosOnde as histórias ganham vida. Descobre agora