Capítulo 04 - Letícia

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Vozes exaltadas irrompem pelo andar e levanto-me para saber o que acontece. Caminho até a sala de reuniões e vejo o cliente exaltado. Kevin e o responsável pela pasta desse cliente tentam miseravelmente acalmar o homem. Não costumo me meter nos assuntos dos meus colegas de trabalho, mas a situação estava fora de controle e ninguém fazia nada.

Entro sem pedir licença e todos se calam ao me observar pegar alguns papéis sobre a mesa. Pude ler o relatório que apontava um caixa dois e uma amante sem noção que tinha acesso à conta da empresa. Seu capricho em Miami custou uma pequena fortuna. Esse é um dos piores tipos para lidar, velhos babões amantes de ninfetinhas com a empresa da família beirando a falência.

O contrato não é da minha responsabilidade, só que eu não poderia permitir que aquele circo continuasse. Pessoas com o rei na barriga acham que podem tratar os outros de qualquer maneira, mas não podem! Kevin tentou intervir, mas não teve êxito e minha paciência estava por um fio. O cara conseguiu atrapalhar o serviço de todo mundo.

Ainda olhando os papéis, dirijo-me diretamente ao presidente da minha empresa:

— Qual o problema, Kevin? – eu já sabia, só queria a confirmação, antes de falar o que não devia.

— O senhor Monteiro está insatisfeito com nosso trabalho. Quer que eu troque o consultor porque, segundo ele, o Camargo não serve nem para limpar banheiros – Kevin fala, apontando para o infeliz do cliente.

Fui até o Camargo e perguntei onde o problema estava pegando.

— Ele não mencionou que a secretária também tinha um cartão corporativo de outro banco. Aliás, conta que não tínhamos conhecimento até então. E, com os boatos de falência, alguns bancos credores não querem renegociar a dívida da empresa. Só que há uma solução. Na auditoria, encontramos uma conta robusta para quitar as principais dívidas e tirar a empresa da lama. Mas, segundo o senhor Monteiro, se usarmos esse recurso, ele não terá como sobreviver.

— Quem é ela? – o "tiozin" pergunta.

Antes que Kevin pudesse responder, falo:

— Sou sua nova consultora.

O homem fica ainda mais vermelho.

— Era só o que me faltava, tirar um velho e colocar uma mulher. Isso é trocar seis por meia dúzia – bastardo.

Com toda educação que tenho, coloco as folhas sobre a mesa e encaro-o:

— O senhor está à beira da falência e acredita mesmo que pode exigir alguma coisa? Aqui na Global, senhor Monteiro, o ditado "o cliente sempre tem razão" não funciona! Se nos contrataram, é porque estão com a corda no pescoço. Se estão com a corda no pescoço, é porque não tiveram razão! Então, o senhor deve ficar bem tranquilo e nos deixar fazer o que estamos sendo pagos para fazermos. E, comigo, educação vem no pacote. É bom que lembre-se disso.

Aponto para as linhas no meio de uma página e volto a falar:

— Pelo que vi aqui, sua amante gastou mais do que deveria e o senhor não quer que sua família saiba desse pequeno detalhe. Eu compreendo que seja difícil contar a eles que estão ficando pobres por causa da péssima administração do pai. Também acho constrangedor dizer que a amante tem mais gastos que eles.

— Você não pode falar assim comigo. Quem você pensa que é? – ele questiona irritado.

— Eu sou aquela que vai salvar sua empresa da falência. Agora, responda-me, o senhor quer sair do buraco, senhor Monteiro? – pergunto com meu tom falsamente doce.

A Vitrine - 2ª Edição     (Degustação)Where stories live. Discover now