— Estou sim! Estou comendo, não bebo mais...

— Você acha que é fácil? Aqui dentro nós controlamos você, mas lá fora você tomará as suas próprias decisões. Antes de liberarmos você, nós precisamos ter certeza de que você realmente esteja bem, e francamente Alison, você não está nem um mês aqui. Vá para o seu quarto e pense um pouco.

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Eu estava me esforçando, eu queria melhorar e estava dando o melhor de mim, mesmo assim ainda sentia um sentimento estranho dentro do meu peito.

O vento gélido invadiu a fresta da janela e penetrou na minha pele me causando um leve calafrio na nuca. O salão principal da clínica estava vazio, com todas as mesas e cadeiras de madeira lustrada desocupadas. Eu me encontrava em uma cadeira acolchoada perto da janela. Os meus olhos percorriam através da fresta as nuvens cinzas cobrindo o sol, o tempo estava nublado. Me encolhi no suéter azul marinho que eu estava vestida, sentindo o seu tecido roçar a minha pele mantendo-me aquecida.

— Posso sentar com você?

Uma voz feminina e desconhecida perguntou. Ergui os meus olhos que estavam fixos na janela e virei o meu rosto para a direita onde uma jovem mulher robusta com o dobro do meu tamanho estava posicionada.

— Posso sentar aqui? — ela perguntou outra vez enquanto apontava para a cadeira vazia ao meu lado.

— Pode — respondi me inclinando ainda mais perto da janela.

A garota se sentou do meu lado e olhou para mim enquanto eu estava espremida. Me esquivei e pensei em levantar, entretanto ela pigarreou e falou:

— Eu sou Molly.

Pensei em dizer a ela que eu não estava interessada em conversar com ninguém naquele momento e que eu não tinha interesse em saber o seu nome.

—Você é Alison Reak, certo?

Franzi a testa, aquela situação é desconfortável. "Eu não quero falar com ninguém! Me deixa em paz!" pensei, mas acabei balançando a cabeça confirmando a sua pergunta estúpida.

— Por que você está aqui, Alison?

Ela me encarou e eu percebi que os seus olhos eram tão azuis quanto o mar da Califórnia. A garota ou mulher — eu sinceramente ainda não sabia — tinha um rosto encantador, porém estava bem acima do peso, acabei me lembrando de quando eu era assim.

— Por que você está aqui? — perguntei me esquivando da pergunta dela.

— Tenho ansiedade, depressão e tentei me matar no mês passado.

Ela deu de ombros como se aquilo fosse a coisa mais natural do mundo.

— Nossa — não consegui falar.

— E você? — Molly perguntou.

— Álcool e distúrbios alimentares — falei fazendo com que a minha voz soasse de forma tranquila também.

—Distúrbios alimentares? — Ela arqueou as sobrancelhas com a boca entreaberta. — Mas você é tão magra!

Os olhos de Molly percorreram o meu corpo, ela parecia chocada.

— Eu nem sempre fui magra — falei. — Eu era gordinha no ensino médio e quando venci o fama acabei emagrecendo, mas não de uma forma saudável.

Eu não sabia o porquê de estar contando isso tudo a ela, mas Molly era o tipo de pessoa que era fácil de conversar. O fato de ela não ser magra deve ter contribuído com isso.

— Sei como é. — Ela deu um sorriso amarelo. — Me divorciei a pouco tempo, me casei cedo, achei que ele era o homem da minha vida.

— O que aconteceu? — Indaguei.

— Engravidei. Engordei trinta quilos depois que o Ambrose nasceu. Tive depressão pós-parto. É horrível você olhar para o seu filho recém-nascido e querer matá-lo. Depois de vários tratamentos consegui me recuperar, mas não consegui salvar o meu casamento, era tarde demais. Jake, meu marido, ou melhor, ex marido, me trocou por uma mulher mais jovem.

— Eu sinto muito — falei.

— O pior não foi isso — ela falou com uma lágrima descendo pelo canto do olho. — Ele levou Ambrose junto com ele. Disse ao juiz que eu não tinha condições mentais de cuidar do meu filho. Eu perdi tudo e vi na morte a solução dos meus problemas, porém a dose de remédios que eu tomei não fora o suficiente para eu morrer.

— Eu sinto muito mesmo — falei com a respiração cansada.

— Tudo bem — ela disse —, e está tudo bem.

— O que você vai fazer quando sair daqui?

— Bom, vou continuar cuidando da minha saúde e vou lutar pelo meu filho. E você?

— Não sei — admiti. — A minha vida é uma bagunça. Eu tenho namorado, ele me visita nos fins de semana.

— Aquele que escreveu o livro? — perguntou.

— Sim — falei —, como sabe disso?

— Todo mundo sabe. — Ela sorriu. — Eu não li o livro, mas li sobre vocês nos tabloides.

— Não quero nem pensar no que eles estão falando de mim agora.

— Você pensa demais na opinião dos outros. — Ela me repreendeu.

— Infelizmente sim.

— Por que você quis ser cantora?

Boa pergunta. Antes eu achava que sabia a resposta, mas agora não faço ideia.

— Eu gosto de música — falei a primeira bobagem que surgiu na minha mente.

— Eu também, gênio. — Ela riu. — Quero saber por que você canta? O que a música faz você sentir.

— Ultimamente nada — falei e só depois percebi o peso dessa afirmação.

— Bom, temos um problema aqui.

Fiquei em silêncio por alguns minutos até que ela falou novamente:

— Você é tão influente! Podia ajudar garotas que passam pelo mesmo que você.

— Como vou ajudar alguém sendo que eu mesma não consigo me ajudar?

— Alison...

— Eu pensava que quando eu fosse magra eu finalmente seria feliz, mas nada mudou. Eu continuo sofrendo.

— Olha, uma coisa que eu aprendi nessa clínica é que problemas nós sempre vamos ter, ninguém é feliz por completo. O ser humano quer sempre mais, nunca está satisfeito com o que tem.

— É uma boa frase, leu isso em algum livro de autoajuda?

— Obrigada!

Ela sorriu e tirou do bolso do moletom cinza um livro cuja a capa estava amassada.

— Pegue, quero que você leia. — Molly me entregou um livro cuja a capa possuía a imagem de um casal seminu, o livro tinha um título cafona também.

— Não gosto muito de romances, e Deus que capa mais brega! Porque esses livros sempre têm essas capas ridículas?

Nós duas rimos e ela falou:

— Eu sei, a capa é ridícula, mas esses romances estão me ajudando muito enquanto estou aqui. Me fazem acreditar no amor novamente. E você tem namorado, depois que lê esse livro vai querer apimentar o seu relacionamento.

— Ok, obrigada. — Sorri.

— Tenho mais no meu quarto, caso você queira ler mais livros do gênero.

— Obrigada Molly.

Ela se levantou e deu um suspiro e me olhou.

— Inspire pessoas, Alison. Ajude-as.

Molly deu as costas para mim e começou a andar em direção ao seu dormitório. Abri o livro e comecei a folhear as páginas amarelas.

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A GAROTA QUE VOCÊ NÃO QUISWhere stories live. Discover now