Prólogo

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Fecho a minha mala e solto um suspiro nostálgico. Coloco ela junto com as outras que já estão arrumadas e esperando para serem carregadas para baixo. Sinto um aperto na minha garganta e começo a repetir o mantra que vem me acompanhando há alguns dias. Não vou chorar... não vou chorar..., e sigo até conseguir respirar novamente e de maneira quase natural.

Começo a fazer uma caminhada de revisão em casa cômodo, para ver se não esqueci de nada. Já que se isso acontecer, com certeza, reaver não vai ser uma tarefa fácil. Em cada espaço que entro, porta que abro e fecho, sinto como se fosse desmoronar. E sigo com o meu mantra....

Morar por cinco anos e meio em um mesmo lugar, e depois de tudo que passei aqui, ir embora, vai deixar um vazio imenso dentro de mim. Sempre soube que iria "voltar para casa", por assim dizer, mas quando acordei hoje pela manhã, eu não estava nenhum pouco preparada para me despedir. Não conseguia, assim como ainda não consigo, acreditar que essa data havia chegado. Passou tão rápido, que parece que foi ontem que o meu pai abriu a porta da frente, soltou um assovio longo e se virou para mim e soltou um:

"- Tem certeza de que tu quer isso, filha?"

O sorriso largo dele, uma marca registrada na nossa família, não chegava aos seus olhos, com o mesmo tom de azul acinzentado que nós compartilhamos. Genética sempre foi um ponto marcante dos Lavorinis.

"-Podemos voltar para casa amanhã mesmo, ou ficar mais alguns dias para curtir umas férias e depois voltamos para casa, como se esquecêssemos isso tudo."

Nesse momento eu hesitei. Meu coração bombeava litros e mais litros de sangue que mandavam eu aceitar essa proposta dele. Voltar para o Brasil, para a nossa casa e estudar em uma faculdade local e bem mais próximo do meu pai.

Porém, o meu cérebro mandou a minha língua soltar um sonoro não. E nesse momento, o sorriso do meu pai desceu mais um pouco e eu me senti a pior filha do mundo.

Sei que muitos me chamaram de desgarrada e ingrata. Ele fez tudo por mim. Tudo mesmo. No momento em que saímos do enterro da minha mãe, meu pai abandonou tudo. Vida social, estudos, profissão de médico e todas essas coisas. Se colocou em segundo lugar e me deixou e primeiro plano. Sua existência se baseou em me cuidar, e nos momentos que ele não estava fazendo isso, chorava, lamentava e não superava a partida recente da minha mãe. E depois de tudo isso, eu o abandonei.

Os primeiros anos, aqueles que eu nem me lembro de muitas coisas, pela minha pouca idade, eu recordo da sua tristeza. Os momentos em que conseguíamos manter uma vida normal, era quando ele se esforçava para fazer isso, dar a uma criança/pré-adolescente um pouco de rotina. Porém, por mais que ele tentasse e se esforçasse ao máximo para isso, minha vida nunca mais foi a mesma e parecida com a das outras gurias da minha idade.

Enquanto as minhas amigas tinham as mães para levar aos shoppings para comprar roupas, maquiagens e até o primeiro sutiã, eu tinha um pai tão perdido como eu. A primeira vez que eu comprei um sutiã, ele me levou à loja e ficou observando a atendente me explicar os modelos e qual seria mais recomendado para o meu corpo. Um desastre, mas nada comparado a minha primeira menstruação.

Hoje eu até me mato rindo da situação e o fiasco que isso foi. Mas naquela época, nós dois ficamos assustados. Ele pela situação em si, e por descobrir que a sua filinha estava "virando mocinha", e eu por estar com sangue escorrendo por perna abaixo. Eu tinha treze anos, nunca mexido em um absorvente na minha vida e muito menos como colocar um. Quando a mãe morreu eu nem dava bola para as coisas dela, estava mais interessada em costurar e brincar. Descobri, nos meses seguintes, pela instrução do absorvente, que não dá para se guiar pelo forro da calcinha. E, por isso, tinha que sair da sala de aula em direção à diretoria, pedir para um dos meus dindos, Gê ou Beto, ligar para o meu pai me buscar.

Luiza DEGUSTAÇÃOOnde as histórias ganham vida. Descobre agora