Capítulo 5

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Francesca foi a primeira. A notícia de seu aprisionamento correu pela vila e isso causou um efeito dominó. Dois dias depois dela ser levada a interrogatório, Allegra, que esperava ansiosamente vê-la voltando, viu da janela de seu quarto uma pessoa, furtiva como um rato, se esgueirando até a capela. Depois desta foram duas, no outro dia, quatro pessoas. 

Uma semana depois, Francesca não havia recebido permissão para voltar para casa. Todos na família Bellini estavam muito preocupados, mais com a possibilidade de ela ser erroneamente julgada do que com a possibilidade de ela ser realmente uma bruxa. Todos ali sabiam que Francesca fazia poções, mas isso não a tornava uma bruxa adoradora do diabo, ela apenas ajudava os aldeões como sabia e podia.

Allegra, desesperada pela falta de notícias foi até a sala e disse à sua mãe:

- Vou até a igreja hoje. Talvez o padre Lorenzo possa me deixar ver Francesca ou pelo menos me dar alguma informação sobre o motivo de estarem mantendo-a trancada por tanto tempo.

- Fique em casa. Você não percebeu que qualquer coisa que fizer poderá atrair atenção indesejada para si? Você quer realmente que aqueles inquisidores saibam seu nome e venham te buscar para um interrogatório? - questionou sua mãe.

- Não, não quero. - respondeu Allegra, olhando contrariada para o chão.

- Ora então guarde a língua dentro da boca antes que ela te traga problemas! E não ouse sair desta casa sem minha permissão! - Bradou a mãe.

- Mas mamãe, eu penso que não está certo esses homens mant...

- Você não tem que pensar Allegra, você tem que obedecer me obedecer. Eu sei o que é melhor para você. Nós vamos todos orar por Francesca aqui, dentro de nossa casa. E a vontade de Deus, seja ela qual for, será feita.

- Sim, mamãe. - disse Allegra com a voz trêmula e os olhos carregados de lágrimas.

Se retirou da sala e foi para seu quarto. Da janela observou enraivecida os homens de preto que guardavam a igreja. Quem eles achavam que eram para perturbar a paz das pessoas desta maneira? Para aprisionar inocentes? Allegra não podia mais aguentar a agonia de esperar na escuridão, sem respostas. Decidiu que iria encontrar sua querida amiga Francesca e tirá-la de lá com argumentous ou não.

Andando de um lado para o outro, roendo as unhas e olhando constantemente pela janela, ela esperava todos irem para a cama. Como havia observado nas noites anteriores, ao badalar da meia-noite os homens que guardavam a igreja eram substituídos por outros, e as vezes um demorava para chegar, deixando assim o posto desprotegido.

O plano de Allegra era aproveitar esse momento de falha, para adentrar a igreja.

Sua casa foi lentamente ficando silenciosa, na medida em que todos foram para seus cômodos. A lua cheia estava alta, indicando que a meia noite estava próxima. A primeira badalada do sino da igreja soou e Allegra deixou sua casa, como um fantasma.

Um manto negro a cobria por inteiro e seu rosto era irreconhecível dentro da escuridão do capuz. Andando sorrateiramente, ela se escondia nas sombras enquanto dava a volta na vila para assim alcançar a entrada posterior da igreja. A entrada que era usada pelos homens de preto.

Escondida atrás de uma carroça, esperou e observou. Quando viu que o homem que guardava a capela durante a madrugada estava demorando para entrar, decidiu que esta era sua chance. Abaixou ainda mais o capuz do manto para que seu rosto não pudesse ser visto. Aguçou os ouvidos para captar qualquer passo que não fosse o seu e correu em direção à porta da igreja.

Ao entrar, a visão a assustou. O chão abaixo da capela havia sido escavado para dar lugar a uma prisão. Monticiano nunca havia comportado uma prisão.

Descendo os degraus criados na terra, Allegra chegou à um corredor parcamente iluminado. Buracos haviam sido cavados e encerrados por grades de ferro para serem usados como celas. Haviam doze buracos, em cujas grades Allegra pôde ver, espantada, mãos agarradas ao ferro.

Francesca não era a única acusada. Dormindo sentada, pôde reconhecer a viúva Lucrezia, Agnes a louca também estava lá. E uma menina que aparentava doze anos, chorava com a face escondida entre as mãos. Como uma criança poderia ser uma bruxa? Como esses homens podem ser cruéis a ponto de prender uma criança pura? Allegra estava tremendo de frio ou de medo, não sabia ao certo, quando reconheceu sua querida Francesca, caída num canto escuro de sua cela. 

Francesca, ao reconhecer o manto negro, se arrastou para perto das grades. As duas agarraram as mãos umas das outras e se olharam por longo tempo sem dizer nada. O rosto de Francesca estava repleto de feridas, seus cabelos haviam sido raspados e em apenas alguns dias ela estava assustadoramente magra.

- O que fizeram com você? - choramingou Allegra.

- Me bateram, me torturaram e me humilharam de todas as maneiras possíveis. Me acusaram de bruxa, de adoradora do demônio e quando nego suas falsas acusações eles me torturam mais. Oh minha pequena... acredito que não viverei muito mais tempo. Eles não irão conseguir tirar a mentira de mim então vão me matar. - disse amargamente.

- Não, eles não vão, você é inocente! Se Deus não protege uma inocente em seu momento de maior necessidade, eu protegerei!

- Isso é blasfêmia menina! Você por acaso se considera melhor que Deus? Se alguém te ouvir falando assim você também será trazida para cá, e então como ficaremos? Quem vai nos salvar? - questionou amorosamente Francesca.

- Eu vim pra te tirar daqui, vim para te ajudar a fugir. Você sabe aonde eles guardam as chaves das celas? - perguntou Allegra.

- Não menina, não. Por favor não se arrisque por mim, sou só uma idosa. Já não tenho muito mais a fazer no mundo mas você tem toda a vida pela frente, não a desperdice por mim.

- Não Francesca. Não vou virar as costas em seu momento de necessidade, me diga como posso te ajudar. - disse Allegra.

Após breve momento em silêncio, Francesca disse:

- Temo que meu caso será encerrado em breve, então não temos muito tempo. Preciso que você me traga um erva. Uma erva chamada Belladonna.




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A Fogueira Da BruxaWhere stories live. Discover now