No final das contas - Parte 04

1.8K 343 58
                                    

Davi chegou no bar já subindo nas tamancas. Ou melhor, atirando tamancas para todos os lados. Especialmente na minha direção. Ele adorava brigar comigo, mesmo quando a culpa dos acontecimentos não era minha. Eu, sinceramente, nem ligava mais. Davi estava longe de ser o motivo que me mantinha trabalhando naquele bar. Pedro era um deles. As comissões, outro. Dinheiro para pagar minha faculdade de Design, o principal.

— Quem é aquele garoto servindo a mesa 15? – Davi perguntou.

— É um suplente – Pedro explicou. – Como eu avisei no telefone, Dani teve uma indisposição e...

Davi não estava mais ouvindo. Ele já estava caminhando na direção de Marcelo, para averiguar sua procedência e fazer um monte de perguntas. A mesa 15 ficou sem atendimento durante todo tempo que Marcelo estava ocupado respondendo tudo, mas acho que ele passou no teste, pois foi liberado pelo chefe para voltar ao trabalho.

— Ele disse que vai me dar toda comissão da noite, a partir do momento que eu assumi o lugar da Daniela – Marcelo explicou, quando nos reunimos no balcão de Pedro.

— Justo – Pedro palpitou.

— Sim – concordei.

— Luísa, posso falar uma coisa com você rapidinho? - Marcelo perguntou, tocando meu braço.

— Claro - respondi, olhando fixamente para o lugar no qual sua mão apertava meu braço.

Ele me puxou um pouco para o lado e, pelo canto de olho, vi Pedro dando uma gargalhada. Também o vi levantando o dedo como se estivesse me chamando atenção. Estava me chamando atenção para música, que tocava "Do jeito que você me olha, vai dar namoro". Estirei um dedo do meio para ele, discretamente. Pelo menos eu acho que Marcelo não viu.

— Seu ex vai pedir a conta a qualquer momento. Queria saber se você não gostaria de entregá-la.

— Eu? Entregar a contar para Gregório? Nem pensar - respondi, subitamente inquieta.

— Entendi. Você ainda nem entregou a conta da sua vida, não é mesmo? - Marcelo disse, sacudindo a cabeça.

Assisti ele andar na direção da mesa de Gregório e interpretei o gestual. Gregório estava mesmo pedindo a conta. Marcelo fez sinal para o responsável por fechar as contas. Era um disparate que ele agisse dessa forma, sinceramente. Sabendo que eu trabalho nesse bar, ele escolhe vir logo para cá, mesmo com tantas opçôes na cidade. E, tendo vindo até aqui, não se dá ao trabalho nem de olhar na minha cara. Quem ele pensa que é? Eu já havia sofrido o bastante por causa dele. Já era hora de entregar a conta. Da minha vida.

Quando a conta ficou pronta e o responsável a colocou no balcão, me apressei para pegá-la. Segurei aquilo nas mãos, olhando como se fosse o reflexo de nosso relacionamento mal terminado. Circulei de vermelho a parte que mostrava os 10%. A caneta começou a coçar na minha mão e, antes que eu pudesse me impedir, já tinha escrito logo embaixo do cálculo.

Você deveria pagar o dez vezes mais, como taxa pela sua canalhice.

Marcelo me olhou por cima do ombro, enquanto servia a mesa 9. Eu dei um sorrisinho e levantei a conta para que ele entendesse o que eu estava fazendo. Então comecei a desfilar na direção da mesa do filho da p... Quer dizer, do Gregório. Cheguei por trás dele, então ele não viu minha aproximação e foi pego de surpresa.

O mais de surpresa que alguém pode ser pego quando sabe que está no restarante onde trabalha a ex, pelo menos.

— Aqui está sua conta - eu disse, estendendo a nota em sua direção - Vai pagar com dinheiro ou cartão?

Nossos 12 mesesOnde as histórias ganham vida. Descobre agora