- Ah quantas saudades senti Bea, conte-me tudo sobre sua última viagem! Com licença mãe, já volto! - Disse para Donatella antes de agarrar o braço de sua amiga e caminhar pela praça.

- Allegra este mundo é tão vasto e majestoso, gostaria muito que você pudesse me acompanhar.

- Um dia minha querida, um dia. Agora conte-me sobre...aonde você foi mesmo?

- Fui à Turin, uma bela cidade... muito diferente desta vila. Lá há muitas pessoas e há um grande castelo! Ah como era lindo! E os cavaleiros em suas armaduras brilhantes! Hahaha, quero voltar lá o mais depressa possível!

- Hahaha, controle-se Bea! Você é uma mulher casada lembra? Enfim, conte-me mais! Quero saber todos os detalhes.

- Em Turin vi muitas coisas belas, muitas coisas novas que me deixaram boquiaberta, no entanto, também vi coisas que me fazem tremer ao lembrar.

- Vendo sua expressão fico preocupada, estava tão animada agora pouco e subitamente está soturna. O que você pode ter visto de tão terrível para ficar assim?

- Eu vi... o horror Allegra. Estávamos há alguns dias na cidade, quando, na taberna, ouvimos todos comentando sobre uma bruxa que finalmente pagaria por toda desgraça que causou à cidade. Sem entender o que estava acontecendo, perguntamos ao dono do local sobre essa tal bruxa. Ao que ele respondeu:

"Nos últimos meses algumas crianças daqui morreram de uma doença que ninguém nunca viu antes. Alguém descobriu que a mesma velha curandeira deu algumas ervas supostamente para curar as crianças. Mas todas morreram e então o padre a acusou de bruxaria e convidou a Santa Inquisição para vir até aqui e julgar seus crimes. Os inquisidores vieram e a bruxa velha será executada amanhã. Vocês estão com sorte, chegaram bem a tempo para ver!"

Fiquei apreensiva pois eu só ouvi histórias sobre feiticeiras, nunca vi uma de verdade, mas mesmo assim, meu esposo e eu decidimos ver a execução da bruxa.

No dia seguinte fomos acordados pela gritaria nas ruas. Uma multidão vociferava "Queimem a feiticeira!" enquanto seguiam para a praça central que cercava a grande catedral da cidade. Meu marido e eu corremos para o local da execução e chegamos bem a tempo de ver a bruxa chegando. Era uma coisa terrível de se ver. A tal bruxa era uma senhora de cabelos brancos e costas curvadas pela idade, estava presa por correntes que machucavam seu pescoço, seus pulsos e pés. Quando tropeçava nas correntes e não conseguia levantar, era arrastada. Pude ver suas lágrimas, e não pude evitar derramar as minhas.

No centro da praça havia um poste de madeira envolto por palha e galhos pequenos. Ali, amarraram a senhora e pude ver através das lágrimas, que seus olhos tinham cores diferentes, um azul e o outro preto. Era impressionante e assustador ao mesmo tempo. Despiram-na e foi então que um senhor chegou, com vestimentas que indicavam sua alta posição no clero, seguido por dois rapazes também visivelmente religiosos.

O mais velho falou:

"Eu, Bispo Alessandro, represento o Santo Ofício e estou aqui para punir esta mulher por heresia e feitiçaria. Mas como sou benevolente vou conceder uma última chance à ela." Então se dirigindo à idosa, disse: "a senhora admite ter usado feitiçaria para assassinar crianças desta cidade? "

Entre lágrimas e soluços a velha falou:

"Eu não matei ninguém! Eu tentei ajudar de todas as formas que pude, como sempre fiz. E agora esses ingratos me acusam de bruxa. Eu não sou uma bruxa!"

Ao que o bispo respondeu: "Pois bem, como a herege não se arrepende de seus pecados e continua à mentir, será punida no fogo purificador."

O povo gritou, sufocando o triste lamento da anciã. O carrasco ateou fogo à palha que a envolvia e suas labaredas lambiam a pele da bruxa. A multidão silenciou ao ouvir os gritos de dor que pareciam vir do fundo da alma da mulher. O fogo a consumiu e já não era mais possível vê-la. Com suas últimas forças ela gritou:

"Vocês falsos padres vão queimar eternamente por isso! Mas as mulheres... nós todas vamos queimar agora!

Allegra olhava sua amiga Beatrice que contava angustiada sua história. E enquanto ouvia as últimas palavras proferidas pela anciã, sentiu que alguém a observava. Olhou a sua volta e seus olhos foram atraídos para uma senhora de cabelos brancos vestida em trapos. Esta a encarava, e Allegra imediatamente reconheceu seus olhos.

Um preto e outro azul.

Uma lágrima rolou no rosto distorcido da velha, enquanto levantava o braço que apontava para Allegra seus lábios sussurraram:

"Você..."






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A Fogueira Da BruxaDonde viven las historias. Descúbrelo ahora