Capítulo 14 - Parte II

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Quando eu era menino, falava como menino, sentia como menino, discorria como menino, mas, logo que cheguei a ser homem, acabei com as coisas de menino.  - I Corintios 13:11


Bruno

Estamos sentados um de frente para o outro em minha sala. Analiso sua inquietude. Felipe está nitidamente nervoso, mas mesmo assim espero que ele inicie a conversa. Enquanto isso, aproveito para também analisar sua postura. Suas mãos apertando o braço da cadeira acolchoada põe em evidencia um desconforto intrigante. Continuo avaliando-o até que, num impulso, levanta-se e vai até a janela. Olha para baixo e bufa exasperadamente, como se tivesse encontrado algo ainda mais perturbador.

— Eles nos seguiram — diz enquanto vira-se para mim e me encara sério.

Levanto-me rapidamente e abro uma brecha na persiana, a fim de entender de quem se refere.

— Quem? — pergunto, sério.

— Vê aquele Tucson preto do outro lado da calçada?

— Sim. O que tem ele? — olho interrogativamente para Felipe.

— São os capangas do meu pai. Estão nos seguindo desde o Jardim Elite — Encara-me com uma expressão preocupada.

Mas por que razão Inácio Teixeira iria mandar capangas me seguir? Eu não o confrontei; não o desafiei; sequer fiz ameaças ou explanações sobre sua vida corrupta. Então, por que o cara estava mandando capangas atrás de mim? E para tudo ser mais confuso, por que o filho estava entregando o pai daquela maneira?

Olho novamente para Felipe. Ele está abalado. Percebo seu olhar vago, como se estivesse tramando alguma coisa. Suas dedos batem a todo instante na parede em sinal de ansiedade e nervosismo. Mas o que,  afinal, estava acontecendo aqui? Como se ele lesse meus pensamentos, responde:

— Bruno, suas fotos publicadas hoje mais cedo não foram coincidência.

A esta altura, se o Felipe pensa que não estou ciente da armação que fizeram, ele é mais inocente do que imaginei.

— Sei que alguém fez isso propositadamente, mas não sei quem foi — respondo sério. Afinal, aonde ele quer chegar?

— Foi meu pai — caminha lentamente até a cadeira e senta-se e balança sua perna a todo instante. — Acho que Inácio já sabe. — Ele fala como se estivesse confirmando algo mais para si mesmo.

— Felipe, seja claro — imponho

Ele me olha fixamente.

— Inácio sabe que estou aqui e pode desconfiar — o que será que ele cheirou? Encaro-o interrogativamente. — Se você sabe que ele é meu pai, então é de seu conhecimento as falcatruas que ele cometeu ao longo da vida na política.

Cruzo os braços. Se Felipe souber interpretar linguagem corporal, entenderá que não estou gostando nada do rumo daquela conversa. Minha recusa em falar qualquer coisa sobre o tema está explícito em meus braços cruzados. Ele pode ser um espião tentando pescar toda a informação que sei sobre o pai. Mas como ele não diz nada, entro no jogo. Eu sou bom nisso.

Descruzo os braços e encosto-me relaxadamente na ponta da mesa sem quebrar o contato visual, no intuito de dar veracidade nas minhas mentiras.

— Na verdade, descobri com meu agente de relações públicas, numa de nossos conversas, sobre a estratégia de marketing pessoal do Inácio Teixeira. Ele citou você e o prefeito com naturalidade, imaginando que eu soubesse do grau parentesco. Talvez eu descobrisse antes se vocês utilizassem o mesmo sobrenome, ou se estivessem frequentemente juntos nas campanhas eleitorais.

Orgulho e Desejo (Revisando)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora