VIII - Traição

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Louisy Anderson

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As vezes você perde o chão, as vezes as coisas a sua volta ficam disformes e você sente vontade de cair e muitas vezes cai.
Mas naquele momento eu me sentia viva, mais viva que nunca, o chão era firme e minhas pernas que deveriam estar bambas, não estavam. Da onde vinha aquela coragem eu não sabia. Mas uma coisa eu tinha certeza, alguém ia ter que começar a me dar explicações. E plausíveis de preferência.
Liguei para o Guilherme pedindo que me encontrasse naquele momento em minha casa. E para a biblioteca avisando que não iria. Como eu nunca faltava eles não fizeram muitas perguntas.
O carro do Guilherme ainda não estava na entrada da garagem, o que me daria alguns minutos para pensar. Que na verdade não foi exatamente bom, já que fiquei andando pela sala de um lado ao outro entre meu sofá de couro e uma estante velha repleta de livros com uma TV de tubo preta no centro.
Ouvi o barulho da porta da frente abrindo. Bem a tempo de não fazer um buraco no chão.

- O que aconteceu? - Guilherme perguntou quando me viu olhando-o furiosa.

- Quem é você? - minha voz saiu mais calma do que eu esperava.

- Como assim Louisy? - confuso, seus olhos encaravam os meus. Um misto de preocupação e perplexidade.

- Bom, irei reformular minha pergunta... - Respirei fundo - Gostaria de saber, por que um cara todo encapuzado, esbarrou em mim assim por acidente sabe, com as mãos na minha garganta. Mandando que eu me afastasse dos meus cãezinhos de guarda. Inclusive o adestrado loiro? - praticamente gritei as últimas palavras.

E então a confirmação que eu precisava, ele sabia do que eu falava. Estava estampado em seu rosto.

- Ele te machucou Lou? Fez algo com você? Por Deus, não devia te lá deixado sozinha. - Seus dedos esguios que outrora me encantavam, mas naquele momento só me davam repulsa, percorreram os fios de cabelo, bagunçandoos ainda mais.
Poderia até acreditar em seu desespero - um tanto tangível - mas a raiva me consumia.

- Da pra me explicar que porra é essa toda que está acontecendo? - explodi em grande estilo, com direito a mãos exaltadas e boca espumando. Nada muito bonito de se ver, mas me senti orgulhosa de mim mesma por estar aguentando firme até aquele momento.

E como uma deixa, Thomás irrompeu pela porta, como um furacão, com uma faca na mão, em posição de ataque.
A cena era tão ridícula que gargalhei.
O que mais poderia fazer? Afinal fui ameaçada por causa desses dois caras, mãos macilentas horríveis quase me enforcaram. Eu estava no meu limite.

- Porque você está rindo Louisy? - Thomás me perguntou cautelosamente.

- Da onde você conhece esse cara Lou? - Guilherme disse em seguida indignado.

- Como assim da onde cara? Eu devia fazer a mesma pergunta, afinal você prometera não se aproximar mais dela.

- Okay! - Falei mais alto que os dois - deixa eu ver se entendi direito. Vocês dois se conhecem? Guilherme pela última vez e em nome de tudo o que tivemos...

- Tivemos? - percebi que dizer aquilo no passado o havia magoado, pois sua voz saiu um pouco mais fina que o normal. Afinal havíamos passado por um bocado de coisa juntos. Mas o que mais eu poderia dizer?

- Por favor, só me diga quem é você? - Supliquei.

Nós encaramos demoradamente. Olhos escuros, com olhos claros. Eu tentando procurar aquilo que eu via em meu amigo a algumas horas atrás, confiança. Mas me decepcionou.

- Lou eu estava no dia do ataque. Eu era um deles. Mas me arrependi e prometi que jamais faria aquilo novamente. Você me perdôo em outras vidas, mas não sei se perdoaria nesta.

- O ataque...? - olhei para Thomás buscando confirmação e ele assentiu.

- Guilherme me mordeu e me fez quem eu sou hoje. - Enfim a revelação temida, Guilherme era um monstro. Não apenas o monstro sangue suga. Mas um monstro desalmado que estragara minha vida e a de Thomás em outra época. Certamente isso não fazia o menor sentido, mas era assim que eu me sentia.

Dei dois passos para trás buscando apoio e encontrei a bancada da cozinha. Ela era firme, mas eu parecia um fio da macarrão cozido. Senti o granito gelado esfriando minha coluna e espalmei as mãos por cima dela, o frio era bem vindo.

- Então quer dizer que você quase matou o cara que eu amava? Interessante, me conte mais como eu teria te perdoado? Por que estou com problemas em entender esta parte. - Senti a frieza com que minha voz o atingiu.

- Não foi assim Lou... - Guilherme suplicou, enquanto Thomás apenas observava a cena.

- Não me chame desta forma mais, você mentiu para mim todos estes anos. Eramos amantes, amigos e parceiros e você mentiu.

- Não Lou...

- Louisy, para você de hoje em diante meu nome é Louisy!

- Certo, não foram assim que as coisas aconteceram. Depois daquilo, depois que soube o que havia acontecido, prometi proteger você e suas vidas futuras, venho lhe protegendo a anos, as vezes como um amigo, as vezes um pouco mais distante...

- Então falhou feio duas vezes em ser meu protetor. - cortei o, já cansada daquele papo todo. - Olha acho que no momento não preciso de nenhum dos meus dois cãezinhos. Quero ficar sozinha. Fechem a porta ao sair. - E antes que eles dissessem mais alguma coisa, subi as escadas de dois em dois degraus, sem olhar para trás.

Não sei quanto tempo fiquei trancada dentro do banheiro. Simplesmente perdi a noção do tempo, até que ouvi batidas na porta do quarto.
Me levantei e fui abrir para quem quer que fosse, a aquela altura já não me importa quem era.

- Achei que pudesse querer conversar - a voz de Thomás era tranquila.

- Não sei se quero. Acho que tive informação demais por um dia. - Respondi, esperando que fosse a deixa para ele ir embora, mas ao contrário, adentrou mais pelo meu quarto.

Era um cômodo simples, chão de madeira clara, uma cômoda simples e branca com alguns cremes e perfumes que eu quase não usava e minha cama box, forrada apenas com um lençol branco e um travesseiro.
A janela que ficava na parede ao lado da cama mostrava que o dia já ia longe, quase anoitecendo. E uma brisa fresca entrava fazendo as cortinas balançarem preguiçosamente.
Thomás se dirigiu para a cama e sentou na beirada, me puxando junto. Ergueu a mão e passou o polegar pela lateral de meu rosto. Não pude quebrar o silêncio. Era confortável demais.

- Sabe Lou... - ele exitou, acho que pelo nome, e quando não disse nada, continuou. - Não posso desfazer o que foi feito, mas posso prometer que farei de tudo para que as coisas sejam resolvidas. O Guilherme fez errado, mas por mais que me doa dizer isso, ele realmente se arrependeu.

Confirmei com a cabeça, ainda não confiava na minha voz ou no que poderia falar caso abrisse a boca.

- Vem cá - ele me aninhou em seus braços e me puxou até que ficamos deitados, minha cabeça apoiada em seu peito. Suas mãos faziam cafuné, bagunçando meus cabelos e me deixando com sono.
Senti seu cheiro, algo como Thomás, sangue e colônia. Mas não era ruim.
A última coisa que me lembro é da sensação de conforto, e do som de seus lábios no meu coro cabeludo. Depois disso dormi um sono sem sonhos.

...

Que difícil escrever este capítulo. Ficar com raiva do Guilherme foi tão difícil, ele era um dos meus personagens favoritos kkkk
Pessoal estão gostando? Que tal uma estrelinha?
Beijokas da magra

PS: Capítulo dedicado a minha leitora mais assídua é escritora mara Mands (AmandaPartenazi)

Thomás Black - PAUSA TEMPORÁRIAWhere stories live. Discover now