"Esta é uma obra de ficção, qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações terá sido mera coincidência."
Aldeia de Merchants, região da Podolia na Ucrânia...
__Caro Sr. Sidrailoski, pode parar a carruagem aqui mesmo neste ponto.
__ Svidrailovsk! meu caro retirante, Svidrailovsk! Corrigiu o carroceiro, com certo descontentamento e repugnância.
__Está certo! Bradou Gesmóv Pavlóv com a voz cansada e aflita. Pare aqui mesmo, daqui seguiremos a pé até os nossos aposentos.
Gesmóv Pavlóv pegou a filha caçula no colo com certo desajeito e apressou-se a colocar o xale sobre a cabeça da filha tentando aquece-la do frio, pois era muito intenso, a chuva torrencial não dava trégua e conformou-se por hora na obrigação de proteger sua família com um cobertor provisório.
Logo em seguida, desceram ele, a sua esposa, e suas duas filhas, todos muito cansados de uma viagem longa e ininterrupta. O velho da carroça comoveu-se e deu uma mão para ajudar a descarregar as malas que além de pesadas, apresentavam em seu couro um aspecto surrado e maltratado pelo mau uso e passar do tempo.
__ Obrigado Sr. Sidrailoski. Quero dizer!
__ Deixa pra lá! Sugiro que não saia daqui até que amenize a chuva, Sr. Pavlóv, caso contrário colocará a saúde de sua esposa e suas filhas em risco. Terei que me retirar agora, se precisar de mim, amanhã ao amanhecer estarei passando novamente pela aldeia e estarei à disposição se caso precisar dos meus serviços.
Pavlóv não respondeu com palavras, apenas acenou positivamente com a cabeça e olhou com a frieza costumeira a carruagem desaparecer em meio à tempestade que caia com vontade castigando o solo seco daquela escura e silenciosa aldeia.
__Diabos! Exclamou Anna; (Nome encurtado de Annatévka Katienka), esqueci um documento importante na casa de minha irmã Ivralova, agora só poderei colocar as mãos de volta nele em agosto do ano que vem.
__Mamãe! Onde está a minha pequena Mamitka?
Gecilovra Pavlóv, a filha mais nova do casal perguntava repetidamente sobre a gatinha que a tia o havia presenteado no dia de seu aniversário, nem precisou a mãe responder, ouviu-se um miado estridente dentre ao cesto de roupas amarrotadas onde o pequeno felino fora transportado durante a fatigante viagem da família Pavlóv.
Tatienka Pavlóv era a filha mais velha do casal e estava cambaleando de sono, por isso tinha preguiça até de falar, apenas olhava para a chuva, torcendo para que parasse logo, pois não via a hora de colocar a carcaça magra e desajeitada por cima da cama.
Enquanto a chuva caía sem previsão de parada, a aldeia respirava um odor fétido que exalava dos animais que ficavam nos estábulos e se preparava para que as suas últimas luzes apagassem, já passava das dez da noite e as ruas ficavam desertas, não era uma boa hora para estar exilado com a família em um ponto escuro da aldeia.
Finalmente a chuva perdera sua força e já se tornara uma leve garoa fina, capaz ainda de encharcar as roupas de quem se atrevesse a sair para fora.
Então o Sr. Pavlóv teve uma ideia simples. Destapou o cesto e enfiou as mãos para retirar um lençol, julgando este ser eficiente para cobrir a cabeça das filhas Gecilovra e Tatienka, porém havia se esquecido de que a gatinha Mamitka estava ali secretamente enrolada e levou uma feroz arranhada.
__Ai! Ai! Gritou, fazendo uma cara feia.
__O que foi? Perguntou Anna, assustada.
__Maldito felino! Espero que tenha apetite por ratos, caso contrário, irá padecer de fome.
Na mesma hora passou um filme na cabeça de Gesmóv Pavlóv. O velho vivia distante da realidade, quase sempre acometido por ideias obsessivas, fingia não se lembrar das coisas importantes e quase sempre as ignorava.
Viu-se num cenário vicioso, o coração parecia querer sair pela boca, corou a face e deixou o ódio extravasar em meio aos evasivos e desconcertantes pensamentos. Quando se deu por conta, suas mãos sedentas por justiça atingiram com gosto o pescoço de Mamitka, chegando quase a estrangular o animalzinho sem nenhum sentimento de remorso.
Tentando disfarçar a sua trama diabólica em que seu espírito estava acometido, o velho tentou tapar o focinho do bichano não deixando que nenhum miado escapasse das narinas do animal indefeso, que por sorte do destino conseguiu se desvencilhar das mãos do maldito déspota e desapareceu por hora em meio as ruas escuras que cortavam a aldeia.
Gesmóv Pavlóv sofria de um surto psicótico que aturdia seu espírito o levando quase sempre às trevas interiores, não conseguia se livrar de seu passado obscuro e sua alma adoecia cada vez mais com o passar do tempo.
Ao retomar a consciência, Pavlóv sacou que a esposa o fitava com desconfiança; desistiu de vingar o gato, pensando consigo mesmo, "isso não vai ficar assim", pois sabia que mais cedo ou mais tarde o pequeno animalzinho apareceria de repente.
Demorava a encontrar o trapo de roupa, suspirou com força e desistiu de proteger as filhas, caminhando com raiva na fina e gelada garoa que caía sobre a Aldeia. Quando chegara a sua casa, já se passava das onze horas e comentava com Anna que havia se arrependido em ter passado o final de semana na casa da cunhada.
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As Vítimas de Botero
Short StoryA trama se passa na Aldeia de Merchants, região da Podolia na Ucrânia... Ludovico Carson Howard era um Bacharel em Direito recentemente formado que morava na pequena e tranquila aldeia de Castle Combe. Filho de uma mulher protestante e um pai parapl...