episódio 01 :: Sangue de Rato

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Texto de: Edson Lemes Júnior "Druida das Pradarias"
ANO DE ERA: 1649

Quelenthor, capital do reino de Belthor, uma cidade imensa e próspera de se viver se você for humano, mas nada amigável para aqueles considerados NÃO-HUMANOS principalmente para um que tenha a aparência de um homem rato.

Seu nome? Não, ele nunca teve um nome. Não é comum de sua espécie receber nome de seus pais, como são muitos, cada um escolhe seu próprio nome quando atingir a idade. Mas ele nunca precisou de um nome. Nunca ninguém lhe chamou, sempre viveu a mercê da sociedade, escondendo-se, arrastando-se por becos, sem ser visto ou percebido por olhos humanos. Não, ele não precisa de um nome.

Sobreviver era seu único objetivo e o objetivo de todos de sua espécie. Comida não era o problema, isso se você não se importa em comer aquilo que os outros não querem, o seu principal problema é sobreviver em meio a oitenta e cinco mil pessoas. Passar despercebido e jamais ser visto.

***

Naquela tarde chovia muito, a cidade estava movimentada, algo incomum iria ocorrer. Pessoas chegavam de todas as principais saídas. Um casamento! Um casamento na corte. Cavalos reviravam a lama das ruas, mas nada disso lhe incomodava. Ele sabia que tal evento era uma oportunidade única de adquirir uma refeição mais refinada e quem sabe algum utensílio extra que pudesse ser "recuperado" de algum andarilho bêbado. A única coisa que lhe incomodava, e não era a chuva, era o grande volume de pessoas na cidade. Mantendo sua forma de rato ele corria por cantos e becos, mas só pela manhã duas pessoas já haviam lhe visto.

Uma mulher gorda na porta de uma taverna que tentou lhe atingir com sua vassoura e algumas crianças que correram atrás dele atirando-lhe pedras. Nenhum incômodo que ele não pudesse resolver, mas isso o deixava apreensivo, pois sabia que as chances de ser capturado aumentavam.

Mas ele não podia se esconder e esperar tudo terminar, sua curiosidade era grande demais. Queria ver os cavaleiros que chegavam, queria ver as oportunidades que surgiam, ele queria ver... queria sentir... queria tocar a cidade a sua volta, ser parte daquele evento, mesmo que não fosse parte daquela espécie, ele não conhecia outra e sentia-se como parte da cidade. Uma parte invisível talvez, mas eles eram tudo que ele conhecia.

A principal vantagem de ser quem ele era, é o fato de não haver barreiras para ele. Enquanto a população era restrita a cidade baixa, ele tinha total acesso a cidade alta e até mesmo a cidade interna. Certa vez chegou a entrar nos aposentos do rei, mas achou o fato muito arriscado e jamais repetiu esta façanha, invejada pelo mais hábil dos ladinos.

***

O fim da tarde se aproximava e a noite começava a alongar as sombras da cidade. Ele sentia-se melhor neste horário, as sombras eram sua principal aliada. O cheiro dos cozidos da cidade interna chegava a suas narinas super-apuradas e isso fazia seu estômago doer. A festa prometia ser luxuosa e ele não se importava com ela em si, mas sim com os restos que sobrariam no fim da noite.

Deixando o beco onde estava, ele atravessou a rua lamacenta até uma taverna próxima, ele pretendia saciar sua fome antes de se banquetear com a comida dos convidados do rei.

A chuva havia parado, apenas um vento frio chegava com o por do sol. Mas isso também não lhe incomodava, estava acostumado a passar por frio muito piores.

Ao chega num canto escuro ao lado da taverna um forte cheiro a sua esquerda atraiu sua atenção. Algo que ele nunca havia sentido, um cheiro doce e excitante. A fome foi logo esquecida e sua mente pareceu confusa. Por um momento ele não desejava ir, pois desconhecia aquele cheiro, mas todos os músculos do seu corpo o levavam até ele. Assim ele desceu a rua, correndo pelo canto na parede até chegar a uma pequena casa de onde vinha o cheiro.

ERA Novels - a sua novela medievalWhere stories live. Discover now