Capítulo 4

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    Eu poderia me culpar, dizer que isso é coisa de outro mundo, poderia mesmo. O que as pessoas normalmente fazem quando descobrem que não são o que a sociedade as moldou a ser, é negar. Elas negam para si, elas dizem que não vão mais fazer, que vão se curar, como se atração e amor tivesse cura.

    Diferente da maioria, eu Fernanda, a garotinha do papai, o grude da mamãe, o dengo dos padrinhos, a luz da família, não me senti mal por nadinha, eu só queria mais e mais. Talvez a dor de sermos de determinada forma (que não siga o senso comum), não venha de uma vez, para algumas pessoas ela pode levar tempo, pode ser que só sintamos isso quando algo nos atingir pelo que somos. No meu caso, ainda não tinha sentido essa tal dor, e tudo seguia muito bem.

     Tinha um grande problema, mesmo não morando do outro lado do mundo, eu morava a uns 70/100 km da cidade da minha madrinha... E as férias não duram pra sempre. Aproveitei ao máximo, saímos algumas vezes e a Letícia acabou descobrindo, ela riu muito:

- Eu não acredito... - ria - ... Seu pai vai te matar... - ria mais um pouco - ... Logo você fer!

- Aconteceu, eu não sei o motivo cara!

Era inacreditável isso vindo de mim. Ninguém esperava, nem eu.

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    Eu fui embora, meu coração apertou, não era de ansiedade por um momento marcante, ele apertou porque eu tinha acabado de me apaixonar, eu tinha acabado de olhar nos olhos de alguém e conseguir ver a alma, eu tinha acabado de dar os beijos mais maravilhosos e intensos que alguém poderia dar. Pelo vidro do carro alguns viam a cidade ficando para trás, eu via um sentimento grudando cada vez mais forte em mim.

E logo depois das férias acontece o grande dia: Meu aniversário de 15 anos!!!

    Eu convidei ela, ela me disse que iria, fiquei muito feliz, precisava matar a saudade. Nosso contato se baseava em mensagens, o whats ainda não era o oficial, mensagens eram. Tínhamos conversas muito boas, que só faziam crescer ainda mais aquilo que eu sentia.

- Eu tô curtindo você, e quero te fazer muito feliz, mesmo morando longe, vou fazer dar certo.

Ela me mandava mensagens desse tipo, eu retribuía.

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    Quando criamos expectativas de ter um relacionamento com alguém, e nos dedicamos pra isso, só esperamos uma coisa: que dê certo. A paixão nos deixa fixada numa pessoa, fazendo com que nada mais tenha graça... Eu estava completamente apaixonada por ela, foi isso que fez com que minhas expectativas me destruíssem. Ela me destruiu.

    As mensagens diárias, cada dia que passava ia diminuindo, o carinho também, até que tudo se tornou frio, Ana simplesmente sumiu. Eu me preocupava com ela, inventava desculpas para que tudo parecesse melhor do que era:

- Deve estar sem celular... Ou então sem crédito... Provavelmente é isso! Mas ela ainda vai vir para o meu aniversário, eu sei que vai... E se não vir? Caralho, ela tem que vir.

    Eu queria que fosse verdade, falava tanto isso sozinha que em certo momento cheguei a acreditar. Até que conversei com a Aninha, sempre que dava trocávamos umas ideias, ela demorou para conseguir me dizer o que estava acontecendo, até que não conseguiu esconder:

- Olha, você não vai ficar mal né?

- Não aninha, eu não vou, pode falar, o que aconteceu?

- Ela namora uma menina faz um tempo, quando você estava aqui elas tinham terminado, mas é sempre assim fer, vai e volta, depois que você foi embora elas voltaram.

- Então ela não vem?

- Acho que não, e nem faz sentido você se prender nisso, você vai encontrar muitas outras, não fica mal, qualquer coisa é só me chamar. Te contei porque não acho justo você ai longe sem saber de nada, sem nenhuma resposta.

- Tudo bem... Obrigada

    Eu estava embaixo de um prédio de 1000 andares e ele desmoronou na minha cabeça. Meu coração foi triturado, nós sabemos que não é o fim, que existirão muitos romances, coisas boas e ruins, porém quando algo assim acontece nós sentimos parte do nosso corpo morrer.

     Conversei com a Aninha de madrugada, quando eu li "ela namora uma menina faz um tempo" uma lágrima se formou e depois dela vieram várias. Deitei na minha cama, e chorei, chorei como se precisasse libertar algo, tinha vontade de gritar, mas meus pais estavam dormindo, então eu só chorava, a música me deixava pior, e ao mesmo tempo queria me dizer algo, deixei ela tocando várias vezes:

... Sua boca me faz sorrir, as outras, só ter lembranças da tua. Entre fumaça e copos, sujos como porcos, é mentira se disser que não é você que busco em outros corpos: Pra depois vir mó deprê com o amanhã e quer saber se consegui te esquecer? hãn hãn.. É que esses papo de amor, que de fato compensou, não sei só vou saber se isso passar, sei lá.. Se Deus quiser com você vou, e vou ficar..

    Já chorei muitas vezes depois disso, mas antes disso eu nunca tinha chorado dessa forma, nunca tinha sentido essa coisa agoniante gritando dentro do meu peito. Eu tinha me apaixonado por uma menina, e ela amava outra.

Volo - Desejo entre meninasOnde as histórias ganham vida. Descobre agora