••••••••

A história de Atargatis nunca falha em me deixar emocionada. Quando a deusa era uma mortal, vivia no antigo território da Babilônia, e se apaixonou perdidamente por um guerreiro chamado Adramalec. Ele era robusto, corajoso e extremamente amoroso, perfeito aos olhos de Atargatis. Lhe proveu comida, carinho e a pediu em casamento logo antes de partir para uma batalha de navio. Meses sem notícias, Atargatis ficou preocupada, ia ao porto diversas vezes ao dia até avistar o navio na linha do horizonte. Adramalec não estava lá, e um tripulante contou que ele havia morrido ao tentar consertar o navio, quando caiu na água e morreu afogado. Atargatis ficou desolada, chorou por horas até que, em um ato de desespero, jogou-se no mar e nadou até a exaustão em busca do seu amado. O oceano teve pena de sua dor, e a presenteou com uma cauda de peixe e poderes sobre o mar, tornou-a uma deusa e tentou ao máximo minimizar seu sofrimento, mas de nada adiantou.

Atargatis sentia falta de seu único amor, acreditava tê-lo perdido, e o oceano não entendia a dor. Ao perguntar-lhe o motivo de tamanho desconsolo, Atargatis simplesmente disse "Eu o perdi para sempre". Então o oceano contou a deusa sobre vidas passadas, reencarnações, sobre o destino das pessoas que não merecem a morte de sua alma. Atargatis se encheu de esperança, mas não podia mais sair da água para reencontrar o seu amado. Resolveu então salvar a alma de garotas que tiveram um fim tão triste quanto o de seu noivo, e as mandava para a terra em busca dele.

Elas são chamadas de guardiãs e eu sou uma delas. 

Nossa missão em teoria é bastante simples: Nos apaixonamos, e enviamos nosso parceiro para o mar. Se o mesmo for a reencarnação de Adramalec, a deusa o salvará. Caso contrário, prepare-se para se mudar e começar a sua busca novamente.

Já me mudei quarenta e duas vezes. Quarenta e duas cidades costeiras em cinco continentes e mais de vinte países. São quarenta e dois homens inocentes sacrificados "em nome do verdadeiro amor". Quarenta e duas almas que precisam recomeçar e quarenta e duas famílias que sofrem. A cada morte que passa pelas minhas mãos, sinto menos vontade de cumprir minha tarefa e deixar Atargatis orgulhosa, mas não tenho mais escolha, minha vida depende dela e de cada alma inocente. 

Porém nem tudo são dores. Nestes 119 anos você aprende idiomas, passa por alguns eventos históricos, várias tendências de moda e cria várias conexões ao redor do mundo, isto é, até elas envelhecerem e você continuar com vinte anos e um rostinho de dezoito.

Minha localização atual? Avalon, Califórnia. Dois meses de sol, calor e nenhum romance. O que particularmente eu sou agradecida, pois ainda não me recuperei do último ocorrido. Tristan tinha vinte e quatro anos, um diploma de arquitetura e olhos azuis que não mereciam perder o brilho tão cedo. Várias vezes me encontro revendo as fotos salvas no meu celular e me arrependendo da decisão de tê-lo entregado. Me adiantei, não estava nem perto de ter certeza e me culpo todos os dias por ser tão precipitada.   

Larguei o celular na mesa de cabeceira ao lado da minha cama e olhei o relógio: 2h45min. Tecnicamente não precisamos dormir, mas o sono tem um efeito calmante como nenhuma outra coisa.

A não ser quando vem acompanhado de pesadelos.

Memórias que não deveriam mais estar comigo me atormentam o sono, uma sensação de afogamento misturado com a culpa, me debato e acordo suada e mais exausta do que quando deitei. Abro a porta da sacada e sinto a brisa marinha como um carinho no rosto, o cheiro salgado do mar me abraçando e a voz calma e sábia de Atargatis invade meus pensamentos. "Sonho ruim, minha criança?"

"O de sempre, mas com Tristan dessa vez... Ele realmente não merecia", respondo em voz alta, sabendo que ela me ouviria se eu deixasse.

"Sinto muito, Siena", responde a deusa. "Você sabe que parte meu coração tanto quanto o seu."

Ouço a sinceridade em sua voz. Atargatis sente muito por cada um que sacrifica, mas seu amor por Adramalec é maior que qualquer tragédia humana. Eu assinto e fecho as portas da sacada, antes de deitar novamente. O medo de me apaixonar mais uma vez me assombra. O sonho de milhões de mortais é minha maldição, e eu não tenho saída.





  • • • • • • • • • • • • • • • •• • • • • • • •• • • • • • • •• • • • • • • •• • • • • • • •• • • • • • • •• • • • • •

Olá pessoa! Se você chegou ao final deste (muito curto) capítulo, obrigada! Você oficialmente é uma pessoa que eu adoro! haha 

Sirena começa devagar, mas é importante para compreendermos toda a  história da nossa menina. Não sei qual vai ser a frequência da postagem, mas como eles não são capítulos extremamente longos, provavelmente duas vezes por semana! :D

Se você gostou deste começo singelo, por favor clique na estrelinha e deixe seu comentário! Obrigada <3

SirenaKde žijí příběhy. Začni objevovat