Capítulo 15

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Eu corria contra o tempo. Percebi isso quando o calendário me disse que faltavam apenas dez dias para o prazo de Théo se expirar e não tínhamos nenhuma solução.

São Joaquim ainda se encontrava um caos sob a neve, porém, mais controlado. Tratores limpavam as ruas diariamente, e todos os dias elas voltavam a se encher de neve. Aos poucos, o isolamento da cidade diminui e conseguíamos, no mínimo, ir até o banco, tínhamos luz elétrica e dava pra ir a pé até o mercado pra comprar comida. Até as aulas estavam quase normalizadas.

Porém, o prazo estava praticamente esgotado. Minhas esperanças há muito já haviam me abandonado, e, assim que percebi que faltavam meros dez dias para aquele que provavelmente seria o pior dia da minha vida, tratei de passar mais tempo com Théo.

Todos os dias, ele ia comigo da escola até em casa, e ficava lá até anoitecer. Nem meus pais, nem Loren, nem ninguém gostava muito disso. Keyla parecia ser a única capaz de entender – como sempre. Eu estava me despedindo. Me despedindo, pois não havia absolutamente nada a ser feito.

Cada hora, cada minuto me parecia o último. Me perguntei se, agora que faltava tão pouco, as coisas não deviam estar definitivamente piorando, mas não. O clima manteve-se estável na casa dos inexplicáveis vinte e dois graus abaixo de zero, Úrsula desapareceu e mais nenhum demônio veio nos visitar. Keyla, contudo, parecia cada dia mais fraca.

- A cidade está cercada. – Théo me explicou, em voz baixa, num daqueles dias frios em que ele estava em casa, enrolado num cobertor comigo. Era bom tê-lo perto. Enquanto podia.

- Mas não apareceu mais ninguém. – apontei, olhando pros lados pra ter certeza de que não havia ninguém pra escutar nossa conversa.

- Eles não podem chegar perto demais. – me disse – Não agora. A coisa toda está no auge. Só eu e Úrsula podemos ficar dentro do perímetro da cidade, porque a missão cabe a nós.

- Por que Úrsula? – fiz uma careta. Ele bufou.

- Ela é minha mentora. Minha "protetora". – me olhou profundamente – Sei que não gosta dela, mas ela está fazendo tudo o que pode pra ajudar. O que é realmente difícil pra alguém tão enterrada em maus sentimentos.

- Grande ajuda. Onde está ela agora?

Ele se calou. Parecia pensar se devia ou não me responder àquela pergunta. Por fim, deu de ombros.

- Ela só me disse que iria achar uma solução. – respondeu-me. Eu ergui as sobrancelhas.

- Você acha que ela vai conseguir? – indaguei. Ele pensou nisso por um instante.

- Acho que ela vai tentar. Mas não, não acho que ela vai conseguir.

O silêncio caiu entre nós dois, e de repente eu senti aquela onda de desespero que sempre vinha associada ao fato de que, inevitavelmente, eu iria perdê-lo em menos de dez dias. Segurei as lágrimas por um minuto inteiro, antes de desistir e começar a chorar ruidosamente.

Théo me abraçou e me embalou, me segurando com força junto de si. Queria poder ficar daquele jeito pra sempre. Queria que nada daquela loucura sobrenatural fosse verdade, que o perigo não existisse. E, já que existia, queria poder morrer no lugar dele. Queria poder salvar a ele e a Keyla, me sacrificar se preciso. Como eu poderia deixá-lo morrer?

- Eu não quero que você vá! – murmurei, entre os soluços. Ele beijou meu rosto molhado de lágrimas.

- É assim que tem que ser. – ele me disse. Mas seus olhos completavam a frase que ele nunca seria capaz de me dizer: você escolheu assim.

Chorei ainda mais.

- Eu vou te buscar no inferno, Théo. – solucei, e minha voz saiu esganiçada – Nem que eu precise me tornar uma assassina, eu vou até lá te buscar, eu j...

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