Capítulo 32

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Três anos depois...

A partir do dia em que montamos a nossa clínica, eu me dediquei inteiramente ao bom andamento dos atendimentos. Não deixei o hospital, pois eu não poderia ficar longe das cirurgias. Sendo assim, não é nenhuma novidade o fato de que eu tive que trabalhar dobrado.

A vida de casada com o Guilherme era uma mistura de fantasia e realidade. Quando saíamos para trabalhar, erámos os profissionais, competentes e responsáveis que sempre fomos. Mas quando finalmente nossos horários coincidiam, aí era pura farra. Nem mesmo duas crianças sozinhas dentro daquele grande apartamento fariam tanta bagunça. O mais interessante de toda essa diversão? Nós sempre terminávamos na cama, e o sexo com ele ficava cada dia melhor.

Em uma noite de folga de ambos, saímos para jantar em um restaurante italiano que ficava bem perto de nossa casa. Foi uma noite muito agradável. Dançamos, tomamos um bom vinho italiano e comemos um espaguete à carbonara que eu adoro, sendo acompanhado posteriormente por um zabaione italiano, uma sobremesa deliciosa, uma das mais tradicionais da culinária italiana . Eu literalmente me acabei naquela iguaria.

Depois de algumas horas naquele clima gostoso e ambiente agradável, nós decidimos pedir a conta. O garçom se aproximou da mesa, entregando a nota já paga e nos olhando com um sorriso travesso e enigmático. Eu tinha que abrir a minha boca.

— Posso saber o motivo do sorriso ou vai guardar só para você? — Eu tinha uma certa intimidade com alguns funcionários da casa, pois sempre que nos sobrava um tempinho livre, íamos até lá. Então ele respondeu sem nenhuma cerimônia:

— Nada demais, senhora. É que vocês são sempre muito alegres, mas hoje pareciam estar em clima de comemoração. Como já são casados há algum tempo, eu e os meus colegas fizemos uma aposta a respeito do motivo. A maioria apostou que é a chegada de um herdeiro, e como sou eu a atender à mesa de vocês, fiquei encarregado de tentar descobrir.

Toda a alegria e felicidade que eu sentia segundos atrás foi arrancada do meu peito, e meus olhos ficaram inundados pelas lágrimas que afogaram o meu sorriso.

Percebendo o meu desconforto e mudança de feições, ele se desculpou inúmeras vezes e saiu, me deixando muda e paralisada, na mesma posição de antes.

Senti as mãos do Guilherme me puxarem pela cintura, me levantando da poltrona, e me guiando até o nosso carro. Chegamos em casa e eu me tranquei no meu closet, deixando o choro finalmente emergir com toda a sua força e angústia, até adormecer ali mesmo no chão frio. O herdeiro nunca chegaria.

Duas semanas já haviam se passado desde o desagradável incidente no restaurante. O Gui tentou conversar comigo inúmeras vezes sobre o assunto, mas eu o cortei. Era doloroso demais pensar que, por minha culpa, a nossa família nunca aumentaria, seriámos apenas eu e ele, para sempre.

Naquele final de semana, eu estaria de plantão no hospital, ao contrário dele, que teria todos os dois dias livres. Fiquei mal humorada só de pensar no quanto poderíamos nos curtir se eu também estivesse em casa. De repente, faríamos até uma pequena viagem para espairecer a cabeça e namorar um pouquinho mais. Mas não seria desta vez. Assim sendo, cheguei ao hospital e fui direto para o vestiário, troquei a minha roupa e sapatos, e saí para começar mais um dia de rotina.

— Dra. Vasconcelos? Por gentileza, me acompanhe até a minha sala — Dei um pulo ao me assustar com a voz do diretor, me intimando a acompanhá-lo.

— OK! — Me limitei a dizer.

— Não precisa assumir o plantão, você está liberada até a próxima semana.

— O que? Como assim, eu estou liberada por uma semana? Que eu me lembre, eu não pedi nenhum recesso do trabalho, eu não estou doente e nem quero ficar tanto tempo em casa sem pelo menos saber o motivo. Vamos, me diga sem rodeios, o que está acontecendo?

— Koany, eu fui intimado a te liberar por estes dias, então facilite a minha vida. Se quer explicações, pergunte ao seu marido. Eu sou o diretor, mas como sócio majoritário, é ele quem dita as ordens por aqui e você sabe disto.

Eu fiquei totalmente sem palavras e soltando fogo pelas ventas. Eu saí de casa junto com o Gui e ele não comentou nada sobre o assunto. O que estaria acontecendo? Girei nos calcanhares e saí como uma fera indomada, ele teria que usar um argumento muito forte para me convencer a não o partir ao meio por tomar uma decisão destas sem me consultar.

Meus instintos estavam apitando, havia algo de errado, ele nunca faria isso. Mas eu só saberia quando chegasse em casa. Então eu pisei fundo e acelerei, gastando a metade do tempo de costume para estacionar em nossa garagem.

Ao descer, eu notei que havia um carro diferente em uma de nossas vagas, e pela placa de Governador Valadares, eu logo soube que era do Jaime.

— Deus, agora eu sei que há algo de muito errado acontecendo, meu irmão está aqui e sem me avisar.

O elevador estava demorando demais, então eu resolvi subir de escada mesmo. Cheguei ao hall de entrada quase sem fôlego algum, e nem precisei abrir a porta, meu marido já me esperava.

— Bom dia novamente, meu amor! — Ele fala, olhando para mim com ternura e com aquele sorriso nos lábios, aquele que me faz ter gelatinas no lugar de pernas.

— Guilherme Avery, pode começar a me explicar o porquê de o senhor usar a sua autoridade de sócio do hospital para me manter uma semana de molho em casa? — Eu gritava sem controle, como se ele tivesse cometido um algum crime. Ele não tomaria decisões por mim, isso eu não poderia deixar.

— Não grita, meu amor. Eu só quis te fazer uma surpresa — Um choro, vindo de dentro do nosso apartamento, me chamou a atenção, e eu me lembrei do meu irmão. Por um momento, eu havia esquecido do carro dele lá embaixo.

— Isso é um choro de bebê? — Falei sem olhar para ele, entrando em nossa casa, indo em direção ao local de onde vinha aquela voz.

— Calma, lindinho da titia, a mamãe já vai chegar e então você vai se apaixonar por ela. Ela é linda!

— Karen? Jaime? De quem esse bebê? Meu Deus, e como foi que transformaram esse quarto em algumas horas? — Eu lutava para não acreditar em meus instintos, mas algo me dizia que eu estava prestes a ter uma boa notícia. Então eu vi meu marido passar por mim, pegar o bebê em seus braços e caminhar ao meu encontro.

— Baby, eu peço a você que não surte agora, pois tem um bebê aqui que precisa dos seus cuidados. Koany, eu quero que conheça o nosso filho.

Para tudo, espera aí! Eu devo estar dentro de um sonho e preciso me concentrar para não acordar. Como assim o nosso bebê? Não se vai até a uma loja de presentes e simplesmente se compra um filho como se fosse uma mercadoria.

Vendo a confusão em meus olhos, ele estendeu aquela bolinha embrulhada em uma manta azul e me abraçou pelos ombros.

— Feliz aniversário, meu amor! A lista de espera para adoção estava enorme, e o processo lento demais. Então, conversando com o seu irmão um dia desses, ele me falou de uma moça que estava prestes a ter um filho, mas que já havia sido intimada a deixar o filho sob custódia do juizado por ser uma constante usuária de crack.

— Nós não pensamos duas vezes e decidimos dar uma forcinha — Diz meu irmão, com o olhar terno e carinhoso em minha direção — Karen e eu já estávamos trabalhando para tornar esse seu sonho possível.

A partir daquele momento, um misto de confusão e sentimentos tomou conta de todos nós. Todos me abraçaram, me parabenizando pelo meu aniversário, do que eu nem estava me lembrando, e pelo bebê, que mesmo sem ser gerado por mim, já havia invadido o meu coração, me transformando em sua mãe.

Depois que a ficha caiu, eu finalmente entendi que eu precisaria mesmo de um tempo para me adaptar. O pequeno Rafael Vasconcelos Avery era um bebê de dois dias de vida, e eu teria que me dedicar ao máximo para aprender a ser a mãe da qual ele precisava. A pobre moça que trouxe meu filho ao mundo não resistiu e morreu durante o parto e, como meu irmão já era um influente empresário da região, não foi muito difícil chegar às pessoas certas e conseguir a guarda para nós. Traçamos uma rotina e nos adaptamos a ser uma família que, daquele dia em diante, nunca mais seria incompleta.

Uma paixão sem limites (Completo)Where stories live. Discover now