1.

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Pedro:

Mais uma vez ela estava ali, chorando com seus fios de cabelo escapando do penteado que havia feito pra ficar em casa. Ela tinha o olhar fixo na televisão, enchendo suas mãos de pipoca, levando-as em direção a sua boca e depois derrubando tudo.

— Lucy, para de chorar — eu disse cansado, passando meu braço envolta dela e puxando-a um pouco mais perto.

— Você não sabe bem o que é ter sentimentos. — ela esbravejou.

— Não por alguém que me faz mal.

— Geralmente porque você é quem faz mal, Pedro – ela disse e soltou um riso nasalado, agora tentando me olhar.

— Não arranco lágrimas das garotas, eu arranco gemidos — disse, olhando-a. Ela riu, revirando os olhos. — Ta vendo? e eu te faço sorrir, diferente do Thomas.


Poucas mulheres tinham um papel marcante em minha vida. Nunca havia sido um cara disposto a ter relacionamentos sérios depois da minha primeira namorada, mas o jeito com que eu me importava com a Lucy sempre tomava um espaço diferente. Nos conhecemos por conta do emprego de nossas mães: as duas viajavam muito e eu ficava encarregado de cuidar dela, que tinha 14 ou 15 anos. Hoje ela já estava começando sua faculdade, e eu administrando uma banda de garagem com os meus amigos irresponsáveis.

Não foi nada imediato. No início ela era uma adolescente cheia de frescuras que me tirava do sério, admito. Era tão chato que se tornou engraçado e acabamos por ceder um dia e conversar um com o outro; ensinei a ela um pouco de violão e ela me fez assistir a alguns filmes que gostava. Tentou ler diversos livros pra mim, por vezes, mas eu sempre acabava dormindo.

O difícil era que, agora, ela estava se tornando mulher, saindo dos seus 18 anos e cada dia mais atraente, e com mais encrencas.

Lucy se envolveu com o cara mais errado do bairro, e era assim desde que começaram a reparar muito mais em seus decotes do que em seu rosto. Mesmo conhecendo-a como uma adolescente fresca, ela sempre foi bem bonita: tinha os olhos grandes e esverdeados, a cor deles se misturava com o castanho claro dos cabelos finos e compridos. Lucy era magrinha, mas era complicado até pra mim não reparar nos decotes quando ela os usava.

— Vou dormir — ela resmungou desanimada, jogando seu celular no sofá

— Vai lá.

— Você está bravo? – ela perguntou.

— Não – e não estava mesmo.

— Está sim, você nem pediu pra eu parar de chorar de novo. O que foi?

— E você atende aos pedidos?

— Pê... —ela disse manhosa, puxando as mangas de seu moletom — É que eu não queria terminar com ele — ela continuou o mesmo falatório que eu já conhecia do início ao fim, e que me deixava demasiadamente irritado por ela continuar ficando com um cara desses.

— Acho uma boa ideia dormir, amanhã nós vamos na festa do Jared e você se distrai um pouco lá, certo? —disse cortando o assunto, já desligando a televisão e me levantando do chão.

— Você podia, pelo menos, fazer um cafuné pra eu dormir?

— Ah, faz tanto tempo que você não dorme aqui... Eu nem me lembro como você gosta disso. —

Ela sorriu engraçado e puxou meu braço pelas escadas, sua outra mão segurava o edredom enrolado em seu corpo, fazendo-a parecer um sushi.

Ela se deitou na cama do quarto de hóspedes e eu me sentei ao lado dela, que arrastou seu corpo pra apoiar sua cabeça em minha perna. Comecei a mexer em seus cabelos de qualquer jeito enquanto mexia em meu celular com a outra mão.

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