~•|| Capítulo 06 ||•~

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O dia seguinte amanheceu com um peso estranho no ar. Eu tinha dormido mal — a conversa com Latte ainda martelava em meu cérebro, misturada à imagem peculiar de Shadow rindo enquanto derrubava o tabuleiro de xadrez e se escondia debaixo do cobertor como uma criança ferida e desconfiada. Mas tinha decidido: não dava mais para colocar remendos no silêncio. Eu precisava conversar com o paciente de forma direta, clara, profissional... e, principalmente, honesta.


Tomei meu café correndo, prendeu o cabelo num meio rabo de cavalo mais firme, e entrei no carro já respirando fundo várias vezes, como se estivesse prestes a entrar num tribunal.


Ao chegar no hospital, cumprimentei dois enfermeiros, respondi a um "bom dia" arrastado de Latte, peguei meu crachá e o bloco de anotações. À medida que caminhava pelo corredor, eu tentava montar mentalmente a conversa perfeita: equilibrada, profissional, neutra... mas toda vez acabava imaginando Shadow zombando de mim no meio da fala. Era meio inevitável.


Quando chegou na porta do quarto, respiro fundo. Bati com as costas dos dedos, porque bater com nós parecia agressivo demais para Shadow naquele estado.


O vigia abriu a porta.


— Shadow? — Chamei, entrando devagar.


Shadow estava sentado na cama, desta vez sem montar cabanas, sem rir, sem gritar. Apenas sentado, com uma das pernas balançando no ar, o olhar fixo no teto como quem busca constelações que só ele podia ver. Quando ouviu o som da porta, virou o rosto devagar, como se estivesse voltando de muito longe.


— Ah, você. Vanilly encantado — disse com uma ironia fria, mas sem a provocação exagerada do dia anterior.


— É Vanilla, Shadow. Vanilla — corrigi, com a voz mais calma que consegui.


— Tanto faz — murmurou, cruzando os braços.


Entrei e puxei a cadeira de metal, sentando-me diante da cama. Não queria começar com perguntas pessoais. Não queria dar brecha para que Shadow fizesse o mesmo joguinho de ontem. Então respirei fundo e disse:


— Eu vim conversar. Normalmente. Sem jogos, sem provocações. Só... conversar.


Shadow virou o rosto, desconfiado. A testa franziu, o maxilar travou. Ele nunca gostava de quando alguém tentava ser gentil com ele — parecia desconfortá-lo mais do que qualquer confinamento.


— Conversar sobre o quê? Sobre minhas psicoses? Sobre minhas alucinações? Sobre o que escrevem no seu clipboard sobre mim? — perguntou, com um sorriso torto.


— Sobre o que você quiser — respondi, com sinceridade.


Shadow ergueu uma sobrancelha.


— Tá. Então conversa sozinho, já que eu não quero falar nada.


Mantive a calma. Eu já esperava resistência. Precisava apenas continuar, devagar.


𝐋𝐨𝐫𝐚𝐳𝐞𝐩𝐚𝐦 𝐕𝐢𝐯𝐨 (𝐒𝐡𝐚𝐝𝐨𝐰𝐯𝐚𝐧𝐢𝐥𝐥𝐚 𝐞 𝐏𝐮𝐫𝐞𝐒𝐡𝐚𝐝𝐨𝐰)Where stories live. Discover now