Capítulo 4: Monitor

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Ricardo estacionou sua moto em frente ao portão e ele já se abriu sem precisar tirar o capacete. Brunno já devia saber da notícia. Definitivamente, sabia. Passar horas e horas em frente aqueles monitores, assistindo câmeras e notíciarios, tinham sua vantagem. Alguns exibiam o que as câmeras posicionadas dentro e ao redor da casa filmavam, outros, e isso era o mais doente de sua obsessão, eram câmeras de segurança hackeadas de diversos lugares. Havia empresas, bancos, delegacias, ruas particulares, eram tantas que era impossível listar todos os lugares que ele podia assistir. E se houvesse algum que ele queria vigiar e ainda não estivesse em seus monitores, ele conseguiria em questão de horas.

Alfredo estava parado com a porta aberta quando a moto foi desligada. Ricardo desceu, tirou o capacete e o prendeu no guidão, só então olhou para Alfredo que estava emocionado e de braços abertos.

Ricardo subiu os degraus pulando alguns e jogou-se nesse abraço paterno como quando tinha 12 anos e veio morar nessa casa. Diferente de Brunno, que sempre se mostrou distante e frio com ambos, Alfredo e Ricardo criaram um laço próximo e amoroso, como pai e filho.

- Não sabia que tinha voltado para a cidade! Nem me ligou, nem me convidou pra assistir um dos seus shows!

- Foi recente, de última hora. E também foi só um show de nada. – entraram abraçados, um com a mão no ombro do outro.

- Quero que me conte tudo dessa banda e principalmente dessa moça!

Ricardo não estava muito animado e Alfredo percebeu.

- Esse desânimo é com a moça ou por causa da notícia?

- Ele já soube? – perguntou.

- Ele não me disse nada, mas você sabe... passando tanto tempo naquele quarto com aquele monte de parafernália...

- É, eu sei. É impossível que ele não tenha visto ainda.

- Você vai lá? Falar com ele?

- Eu... – Ricardo já começava a se arrepender de ter vindo até a mansão.

- Pode não parecer, mas ele sentiu sua falta.

Ficaram um tempo em silêncio, parados no hall, até que Alfredo quebrou o silêncio.

- Vou passar um café. Quem sabe depois?

- É... talvez... – concordou Ricardo e seguiram para a cozinha, onde ficaram um bom tempo conversando sobre as aventuras desse tempo que Ricardo passou longe da capital.

Brunno passava a noite vigiando os monitores e lendo notícias.
Até que aqualea notícia que ele tanto esperava aconteceu: prenderam o suspeito de ter matado seus pais.
Ele olhou no monitor e reconheceu aqueles olhos.

Parecia que os rostos dos pais haviam se desvanecido no tempo, mas os olhos do assassino eram nitídos e vinham atormentá-lo todas as noites.

Aquela notícia o fez reviver aaquele dia, mais uma vez.
A alegria de assistir o espetáculo do circo pela primeira vez. O trapézio, os palhaços, os malabares. O pequeno Brunno saltitava de alegria, ao lado dos pais. A noite estava estrelada e quente, perfeita para uma caminhada. Brunno comia pipocas salgadas e a mãe um algodão doce cor de rosa. Então foi tudo tão rapido, o homem encapuzado surgiu do nada, atirou no pai e a mãe deu aquele grito. O ladrão disse para o menino correr, mas Brunno ficou ali paralizado por um tempo que parecia eterno. A mãe agachou-se para socorrer o pai, e na visão do menino, era lento, câmera lenta, lento demais para salvar o pai. Então Brunno fugiu de desespero, de medo, correu o máximo que pode, sem olhar para trás. As pipocas que eram brancas caíram no chão, tingindo-se de vermelho, de sangue. Ouviu ainda mais dois estalos ao longe e o grito cessou na noite. Mas nunca em sua mente. Quando fechava os olhos em sua cama, para dormir, ouvia o grito e via os olhos naquela faixa aberta do capuz negro.

Como amar um cactoWhere stories live. Discover now