Capítulo 3 - Mais que Livros

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— Bom dia, filha — minha mãe deseja e leva sua xícara à boca. Ela já está pronta para ir para seu consultório de psicologia, com seu vestido discreto e seu salto médio.

— Bom dia, mãe — respondo pegando uma xícara e enchendo com leite, quase suspiro quando vejo pães de queijo sobre a mesa. Meu celular vibra mais uma vez, e eu apenas continuo fazendo minhas coisas.

Deve ser o Luís zombando por você ser tão medrosa e não falar com o garoto da Bahia.

Visualizo mentalmente minha Consciência sentada de pernas cruzadas tomando café, minha vontade de fazê-la desaparecer é grande.

Você sabe que não pode se livrar de mim exatamente porque eu sou PARTE de você, né, doida?!

Infelizmente isso é verdade.

— O pai já saiu? — questiono, sentando-me ao lado da minha mãe.

— Está terminando de se arrumar. — Ela sorri e pega o jornal que está sobre a mesa.

Coloco achocolatado em pó no meu copo de leite e mexo, nesse meio tempo também pego cinco pãezinhos e coloco em um prato. Meu celular vibra mais uma vez, aliás, três vezes seguidas. Caramba!

Vai olhar logo o que é isso, menina!

— Bom dia, pai. Onde está o Edu? — pergunto vendo meu pai entrar na cozinha de terno e com uma bolsa de alça longa preta.

— Terminando a mala dele — meu pai responde dando um beijo na minha testa e outro nos lábios da minha mãe. Ele passa por nós e pega um sanduíche de frango enrolado em papel filme. — Lembra que ele vai passar uma semana na casa dos seus avós?

— Ah, é verdade! — digo, incomodada.

Meu pai não vai ficar para o café, tem que ir para o trabalho logo depois de levar meu irmão para a casa dos meus avós. Por isso apressa Eduardo, mais uma vez, e vai até a porta. Termino meu leite e meus pães em silêncio. Meu irmão aparece, ele tem apenas oito anos e gosta de games tanto quanto o Luís. Edu tem uma singularidade de família, nasceu com os cabelos lisinhos, tal como nossa avó materna, aquela que não vejo há muito tempo. Parecendo adivinhar meus pensamentos e vendo que estamos todos juntos, minha mãe fala, mais para mim do que para os outros, já que me olha discretamente:

— Aliás — ela começa colocando as vasilhas na pia —, no fim de semana vai haver um almoço na casa do seus avós, aniversário de casamento dos dois, vamos aproveitar que iremos buscar o Edu e ficaremos por lá durante o sábado e domingo.

Devolvo o olhar da minha mãe e balanço a cabeça minimamente. Não! Definitivamente não! Ela insiste, me olhando por cima do jornal. Meu pai e meu irmão parecem alheios àquela troca de olhares enquanto verificam as últimas coisas na bolsa do Edu. Eu prefiro ignorar aquela informação da minha mãe. Talvez consiga arrumar um jeito de não ir para lá. Não quero vê-los depois daquele dia, depois do que falaram para mim e do que fizeram há dezoito anos.

— Bem, eu vou para o quarto ver se a tia Rafaela está online. Bom trabalho. — Levanto pegando minha garrafa de água na geladeira e sigo para o quarto depois de me despedir dos meus pais e desejar boa viagem ao Eduardo.

Sempre que o assunto acaba se desviando para meus avós, eu gosto de sair de perto. De preferência ir conversar com a tia Rafaela, ela é uma pessoa incrível, ainda mais comigo, porque ela me entende – ainda que isso não seja algo bom –, ela ainda passou por algo pior quando era mais nova. A tia Rafaela mora em Sabará, na região metropolitana de Belo Horizonte, ela se isolou com o marido depois de tudo que aconteceu entre ela e meus avós maternos.

Entre o Real e o Virtual (Concluído)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora