Capítulo 3.1 - Não temos mais nada a perder

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━━━━━━ ◦ JJK◦ ━━━━━━
Eu estou perdida em algum lugar
Perdida entre Elvis e suicídio.
—THE PRETTY RECKLESS, NOTHING LEFT TO LOSE
◦ 16/11/1986 10:35 ◦

Encarando o gesso branco, Jungkook montava nele a letra da música que ecoava em sua mente.

"Você me sacudiu a noite toda."

Ele nunca tinha sido muito ligado à música. Seus irmãos gostavam. Jiwoo, até o ano passado, tinha posters do Shaun Cassidy colados em sua parede, até os tirar e guardar, dizendo estar muito velha para aquele tipo de coisa. Mas Jungkook ainda tinha certeza de que ela tirava as fotos da gaveta e dava boa noite para o garoto toda vez antes de dormir.

Yug era mais fissurado em Queens e Aerosmith. Tinha tentado convencê-lo a escutar antes, mas Jungkook se recusou com uma careta quando, já no primeiro refrão, soltaram um "Viciado em masturbação, sempre me escondendo embaixo das cobertas. Até eu conversar com meu pai. Ele disse: 'Você ainda não viu nada, até provar das meninas.'"

Ele mesmo não gastava muito tempo pensando em música, mas tinha umas ou outras, que escutara quando Jiwoo largava a TV ligada na MTV, que achava legais.

"Ela era a única, ela é só minha, toda minha. Ela não procurava aplausos, apenas outra vez. Fiz uma refeição pra mim e voltei querendo mais. Tive que me refrescar. Dar outra volta."

Seu pai continuava falando alguma coisa no quarto do hospital, mas ele sinceramente não escutava. Não queria mais escutar. Deixou os olhos correrem pelos sinais do gesso do quarto do hospital onde estava, enquanto repetia uma do AC/DC em sua cabeça.

"Você me sacudiu a noite toda."

— Não o quero mais em minha casa. — O som abafado da voz de seu pai parecia distante, como uma mosca zumbindo pelo quarto, tentando suplantar a música. Jungkook tentou bloquear o ruído das palavras, afundando-se ainda mais em seus próprios pensamentos.

— Você me sacudiu a noite toda. — murmurou para si mesmo; a música estava se tornando mais baixa.

— Meu bem, tem certeza disso? — Disse sua mãe, e involuntariamente ele largou o olhar do gesso no teto para ela. Estava impecável. Ela era sempre assim, quando não estava destruída. — Ele é nosso filho. — Completou em tom baixo, colocando o cabelo castanho pesado atrás da orelha. — E se a imprensa souber pode ser ruim para os negócios.

Jungkook tornou os olhos ao teto. Você me sacudiu a noite toda. — Cantarolou baixinho; A unha do indicador começando a arrancar a pele do polegar sem se conter.

— Não debata comigo. — Disse seu pai. Pelo canto dos olhos podia o ver apontar para porta no quarto de hospital onde estavam. — Eu sei que está tentando proteger aquele muleque. É por sua culpa que ele acabou assim. Eu tentei corrigir e você o protegeu demais. — Completou ele.

Jungkook conhecia aquele tom. Não era exatamente irritado. Era o acusador. Deslizava por aí tal como uma serpente quando saía de sua boca e lhe picava o calcanhar. Não sabia os outros, mas quando as palavras eram para si o deixavam perdido em um emaranhado de "não fiz isso... fiz? Como? Quando? Não fiz. Fiz? Não sou isso... sou? Por que?"

— Você me sacudiu a noite toda. — Continuou baixinho fechando os olhos, e tentou fazer com que os pés, que começavam a se tornar inquietos sob o lençol do hospital, batessem no ritmo da música. — Ela era uma máquina veloz, ela mantinha o motor bom. Ela era a droga da melhor mulher que eu já conheci.

Jungkook gostava da música. A batida era boa e a letra, embora fantasiosa, tinha seu encanto. Mas ele sabia que a mulher descrita na canção era mais uma idealização do que uma realidade.

QUEDA LIVRE - taekookWhere stories live. Discover now