- 12.Anotações -

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Gotas de chuva escorriam nos vidros embaçados da janela. Os dias daquela semana correram rapidamente e Clarisse devotou todo o seu tempo livre à leitura do caderno de Julian. Ela segurava uma xícara de café frio e estava em pé no escritório, sem se mover desde antes do amanhecer. Mantinha a cabeça baixa, com a testa encostada na janela, e os cachos de seu cabelo lhe cobriam os óculos e parte do rosto.

O escritório era sombrio devido à chuva lá fora. Mesmo com as cortinas abertas, a luz que entrava pelas janelas não era o suficiente para iluminar o ambiente sozinha. Apagara os abajures e a luz do corredor, antes de virar uma estátua.

A ansiedade a assolava, gerando um aperto no peito e um frio na barriga.

O caderno do pai estava aberto sobre o diário de Clarisse, onde ela escrevia suas dúvidas e organizava os pensamentos. Lera as páginas amareladas e mofadas do livro quase inteiro e, ainda, sim, havia muitas perguntas que precisavam de esclarecimento. Era como se suas dúvidas apenas aumentassem a cada dia e ela sentia que as respostas estavam diante dos seus olhos, mas não conseguia enxergar.

Porque ele me entregou sua pesquisa? — questionou. — O que eu faria com isso? Ainda mais a essa altura do campeonato!

Pensou e descartou a possibilidade de ir à Monchaux, em busca da Academia e do Conselho Áureo. Não queria usar o dinheiro das indenizações nessa idiotice e ela tinha certeza que não seria recebida de braços abertos, caso os encontrasse. Depois da morte dos pais, os Bertrand foram excluídos. Todas as ligações que eles deveriam ter com o Conselho foram cortadas.

Lendo os garranchos, descobriu que Julian e Rebeca foram membros do alto escalão e cofundadores do Conselho. Eles eram muito importantes para o projeto. Mas... qual era o verdadeiro valor disso? Sua família não tinha nenhum direito sobre o trabalho deles?

Em sua cabeça havia uma infinidade de porquês e ela torcia para encontrar mais algumas respostas no laboratório dos pais. Saber que foram descartados a deixava irritada e ela se perguntava se valia o esforço brigar por isso.

Aquele caderno velho dado pelo padrinho era metade equações e metade garranchos e Clarisse imaginava se alguém conseguiria decifrá-lo. Giselle não chegou a vê-lo pessoalmente, mas sentia que havia alguma coisa de muito valiosa, escondida entre as anotações de Julian. Algo que mudaria o mundo.

Tanto os benefícios do Próxyon quanto a existência de Earis também eram um mistério para Clarisse. Não havia nada realmente claro, nas anotações do pai, que explicasse de maneira simples o que era o mineral, do que era feito e como poderia ser usado como combustível. Parte das citações sobre o planeta estavam manchadas, mas as que eram legíveis foram escritas com tanta firmeza que Clarisse só pôde acreditar.

Era o trabalho da vida de seu pai e sua contribuição para a humanidade.

A consciência disso era assustadora e profundamente triste. Clarisse chorava só de pensar que os pais nunca seriam reconhecidos pelo que fizeram. A pesquisa deles e de seus colaboradores tornou as viagens espaciais possíveis e permitiu que a humanidade deixasse o Sistema Solar para explorar a imensidão, cruzando uma dezena de anos-luz de distância em meses. Earis não foi apenas mais um planeta descoberto e seria só o primeiro a ser desbravado.

August acordou perto das nove horas da manhã e estava indo do quarto da irmã ao banheiro. Como caminhava sonolento e arrastando Haroldo, ele tropeçou num dos sacos de entulho que ainda estavam no corredor. Clarisse não explicou porque pôs a parede abaixo e estava demorando para limpar toda a sujeira.

Assim que levantou, ele se deparou com a figura da irmã parada na janela. O coração do menino quase saiu pela boca e ele gritou de susto.

— Tudo bem, aí? — Clarisse perguntou, virando-se de repente e vendo o irmão. Até então estava tão submersa que não tinha percebido que ele estava lá. Devia estar parada há tanto tempo que sua reação foi travada e seus músculos enrijecidos protestaram.

O Alvorecer de EarisTahanan ng mga kuwento. Tumuklas ngayon