Prólogo

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Norte do Canadá

Marcela olhava os monitores com atenção, anotando os dados para relatar as mudanças de oscilação de energia para sua mentora. Mesmo com o vidro blindado separando a sala de operações do reator, uma dezena de metros abaixo, ela conseguia ouvir o chiado da reação de Próxyon ativo.

— Fascinante, não? — Rebeca perguntou, entrando na sala com dois grandes copos de café e entregando um para Marcela. A mulher olhou o monitor de relance e se voltou para o vidro.

— É minha primeira vez vendo a reação — a assistente respondeu, um tanto animada. Ela levantou e parou ao lado de sua chefe.

— A reação gera um campo magnético bem interessante — Rebeca explicou. — É daí que vem a condensação das nuvens, os raios e a aurora azul. Quando tudo der certo, darei aulas sobre o Próxyon nas maiores universidades do mundo e todos terão acesso.

Lá em baixo, vinte cientistas acompanhavam as mudanças e colhiam dados da atmosfera em volta da máquina do reator, que era tão densa que formava um nevoeiro na altura dos joelhos dos pesquisadores. Cada informação era vital para o sucesso da Segunda Expedição de Earis. Precisavam correr o risco para que o desastre da Primeira Expedição, um ano antes, não se repetisse.

— Admiro esse pessoal — Marcela comentou, bebericando o café. — Todos vocês são pioneiros e mudarão a história da humanidade.

— Se Julian não estivesse em conferência com o Conselho, tenho certeza de que estaria lá embaixo. Ele é fanático pelo Próxyon.

Enquanto observavam o reator e os colegas trabalhando, Marcela olhou para sua mentora. Rebeca Bertrand, apesar de ser apenas cinco anos mais velha, era considerada a maior bioquímica da atualidade e não dava para acreditar que seu nome continuaria em segredo até que Earis fosse devidamente estudado. Ela vestia um jaleco branco sobre um suéter de lã, contrastando com a pele negra-avermelhada de seu rosto que, naquele momento, refletia os raios das pedras de Próxyon, isótopo radioativo natural do planeta Earis. Ela tinha olhos castanhos claros e o sorriso mais encantador que Marcela já viu na vida.

O jaleco que vestia tinha o nome de Julian Bertrand, seu esposo e também cientista, e era grande demais para ela vestir, pois Julian era um homem bastante alto. Rebeca dizia, como toda gestante, que roupas largas eram suas melhores amigas. Enquanto mantinha a concentração sobre o trabalho dos colegas, ela deslizava a mão sobre seu ventre.

— Seu afilhado está chutando bastante esta noite — Rebeca contou, com um ar de sonhadora e orgulhosa.

— E o August será o bebê mais amado de todos os planetas que existem no universo — Marcela respondeu, contagiando-se com a expectativa de segurar aquele pequeno ser no colo.

— Eu costumo ficar surpresa toda vez que ele se mexe aqui dentro. O pequeno August está sempre quietinho. Diferente da Clarisse, que parecia um furacão! Ela é como uma tempestade até hoje.

Marcela se divertiu. Não teve o prazer de conhecer a garota.

— Sente falta dela, não é? — Marcela perguntou, de um jeito divertido e provocativo. — Você não perdeu nenhuma oportunidade de falar sobre sua filha.

— E como não sentiria? — Rebeca rebateu. — Estamos nos vendo poucas semanas por ano, por causa da Academia. Se fosse possível, e eu não estivesse tão atolada em responsabilidades ou com os pés tão inchados, invadiria aquele lugar todos os dias só pra poder amassar a minha menininha com abraços e beijos. Mas o que posso fazer? É parte do acordo do Conselho. Se eu soubesse que me arrependeria tanto, não teria assinado aquele Tratado.

— Os acionistas não darão uma trégua porque Rebeca Bertrand sente saudades da filha.

— Infelizmente — Rebeca concordou, encolhendo os ombros. — Eles pagam meu salário, então darei o meu melhor, como minha menininha. Clarisse está se esforçando e diz que se tornará a melhor aluna da Academia.

O Alvorecer de EarisWhere stories live. Discover now