Capítulo 4 - Magatama: REI

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Cidade Proibida, China

Nem os 47 samurais foram capazes de derrotar Elektra. A ninja agiu como defesa. Aliás, para ela não existe pretexto, especialmente se é sinônimo de uma boa briga.

Ao ver que todos os guerreiros sem senhor estavam mortos, o Kahama caminhou pela Ponte Curvada sacando o daikyu. Incrédulo, sua única reação foi cumprimentá-la numa espécie de referência.

- Sou REI, o guerreiro Kahama da Etiqueta, Cortesia e Civilidade. Tenho como obrigação e missão deter que você leve consigo as joias imperiais japonesas. Sua força e destreza assustam, mas o Clã Kahama serviu aos deuses solares. Nada tememos.

Elektra saca as armas sais. Há poucos minutos ela tinha enfrentado dezenas de samurais; estava cansada.

- Quando quiser, REI.

O Kahama coloca uma flecha no arco e a dispara para o alto. A munição vai até o céu.

Como se mágica, fogos de artifícios iluminam a Cidade Proibida.

- Para sua sorte, ninja, ninguém a verá morrer. Estamos entrando no ano novo chinês. Aqui, neste país, todos se dão descanso nesta época. Este local é apenas nosso. Será digno para uma luta.

Elektra gira as armas brancas.

Os fogos continuam estourando no céu. Várias cores. Várias formas.

REI segura o arco com as duas mãos e também o gira, em movimento anti-horário.

Vai para cima da ninja.

Ele se aproveita das extremidades deste daikyu, que tem placas de metal, usadas também para ataque e defesa.

Barulho de aço em atrito.

As faces dos oponentes anunciam que este combate não será tão simples. Como eles pensavam, claro.

Ao rebater o arco com os sais, Elektra aproveita a vantagem de estar "mais leve" para desferir chutes e cotoveladas. O comprido arco deixa o guerreiro solar mais lento e um pouco vulnerável.

Ele tomba.

De braços abertos. O arco em apenas uma mão.

Elektra pisa nos braços e coloca o sai de ponta-cabeça. Ela vai cravar no peito do japonês.

Chinatown, Nova York

Ano Novo Chinês. Festa da Primavera. O primeiro dia do novo ano, segundo o calendário lunar do país, símbolo iminente da chegada desta estação. Em diferentes lugares, fora até mesmo da Ásia, os costumes tradicionais se mantêm distintos como a dança do leão, a dança dos faróis, dos dragões, a representação de ópera local e o passeio por mercados de flores ou romarias.

Neste pedacinho chinês nos Estados Unidos não seria diferente.

Este promete ser um ano de plenitude com sensação de fartura, abundância, generosidade e contentamento.

E ali, numa casa quase abandonada, com portões de ferro já derrubados e telhados rachados, um grupo de homens se reúne.

Na porta de madeira forte, ainda firme, estão tiras de papel vermelho com desejos escritos em tinta preta. O vermelho significa o fogo e o sucesso, e o preto, a água e a sabedoria.

Os desejos devem ser escritos por criativos e competentes calígrafos, de forma poética e metafórica para poder trazer sorte e realização.

Fogos de artifício são estourados. Eles espantam os maus espíritos.

Lá dentro, os homens estão em silêncio.

Naquele local ocorreram batalhas sangrentas. O lugar fora detonado, mas poucos remanescentes tiveram motivos para reerguê-lo. O desejo de vingança. A sede de sangue.

Mu Fa.

Mesmo com os últimos acontecimentos, os seguidores ainda buscavam um outro Escolhido.
Um dos 35 homens restantes se levanta. Todos olham apreensivos o grande momento.

- Quando um pingo de água cai sobre o fogo, acontece uma ebulição; e é por ebulição que todas as coisas acontecem.

Os homens restantes gritam, em coro:

- Todos os planejamentos do ano se fazem na primavera!

Uma parte do chão de pedra é erguida. Seis homens puxam algo pesado, em posição horizontal.

Colocam-no sobre uma espécie de altar.

Todos abaixam a cabeça, fecham os olhos, em sinal de obediência.

O corpo do Escolhido morto por Cao Li.

Pequim

REI olha com desprezo para a cara da ninja, que enche o peito de ar.

Barulho.

Algo se aproxima.

Rápido.

Muito rápido.

A galope.

Elektra chuta a cabeça do Kahama antes de ser acertada por um coice.

Um cavalo.

Ela sai rolando pelo chão frio e duro. Tem o corpo ferido pela uniformidade dos pedregulhos. Ajoelhada, com os sais nas mãos.

- A vantagem de ser um Guerreiro Solar é que posso contar com a ajuda dos deuses, Elektra. Este cavalo – REI monta no animal – vai facilitar sua morte.

Cavalgando ao redor da ninja e atacando com o arco. Por sinal, esta arma de REI pode ser usada tanto se ele estiver montado quanto em pé. Longe ou perto. Por causa das flechas e pelos metais nas bordas. Um oponente difícil.

Ao chão, Elektra analisa o percurso do animal e seu montador. REI tenta acertá-la com o daikyu, mas a ninja consegue rebater alguns de seus golpes.

O cavalo também é rápido; como se ele esquivasse das discretas investidas da assassina.

REI se afasta. Elektra, ofegante, observa.

Ele saca novamente o arco e dispara flechas, enquanto o cavalo avança pra cima da ninja. Duas flechas por segundo. Inevitavelmente Elektra é atingida, de raspão, na coxa direita.

Um grito aterrorizante. Um sai arremessado.

Uma mão atingida. Muito sangue.

Chinatown, NY

O corpo do então Eleito, a reencarnação de um Imperador Chinês, estava exposto sobre uma espécie de altar, de pedra polida. Tatuagens por todos os membros. Pareciam serpentes, dragões, códigos percorrendo o homem nu, coberto por um fino tecido vermelho.

- Na última noite antes do ano novo, a besta esquisita chamada Nian sai para assustar a humanidade. Devemos rezar para evitar que ela chegue. Explodam mais fogos!

- Tarde demais.

Os homens se viram para a porta de madeira, que está estraçalhada, ao chão.

A imagem daquela mulher... todos tremem.

- Você... não pode ser verdade...
- Sou eu mesma. Ainda bem que me reconheceu. Vou poupar sua vida.
- Por favor... não nos faça mal! Apenas estamos celebrando pela passagem do nosso Imperador Celestial...
- Cale-se! Esse daí está morto. Eu quero o corpo dele.
- Isso é uma blasfêmia! Temos que respeitar o morto! É Ano Novo e o nosso senhor...
- Pouco me importa!
- O que você está falando? – o homem que parece ser o líder dos seguidores não resiste e se levanta. Todos o acompanham – Você o abandonou quando ele foi alvejado! Você não se importou em se vingar de Cao Li pelo mal que ela causou ao nosso país. Por que se dar ao direito de querer o corpo?
- Porque – ela tira o quimono roxo – eu sou japonesa e quero descobrir onde ele escondeu os objetos que representam o símbolo imperial do meu país!

Os homens gritam apavorados. Por eles terem sido enganados por muito tempo. Por ela ser uma mulher com uma tatuagem que lhe corre da nuca até os pés. Por seus olhos estarem em chamas. E pela informação que recebem:

- Sou Setsuko, a reencarnação de Amaterasu, a deusa do Sol do Japão! – ao terminar as palavras, dois homens voam e se chocam seguidamente contra uma parede, até morrerem.

O que parecia ser o líder se aproxima.

- O que te leva a crer que o corpo do Eleito pode ser útil?
- Não interessa.

O corpo do descendente do Imperador Celeste levita.

Os seguidores do chinês sacam pistolas, tacos, pedras e tudo que pudesse ser usado como arma, e partem pra cima de Setsuko.

- Tolos! Vocês são os motivos que me fazem conquistar aquela terra desperdiçada! Atrapalharam meu plano de me aproveitar do Eleito quando trouxeram aquela agente para o Centro! Vocês continuam sendo burros!

Grades surgem, caindo de algum lugar. Um gongo também aparece. Ele soa. O barulho deixa os homens desesperados.

Quando batiam no gongo era o sinal de que alguém morreria, com o início de algum duelo.

Os 33 homens são trancados pela grade. Os olhos da deusa ainda estão em chamas. Ao tempo em que a grade começa a apertar, como se estivesse fechando, os corpos dos chineses ardem num fogo vermelho e amarelo.

- Agora, Eleito, posso declarar o seu fim... até a próxima geração.

China

Outras flechas seguidas são disparadas, mas não com tanta rapidez. A arma sai da ninja está distante. REI desce do cavalo, retira uma planta de dentro da armadura e coloca sobre o ferimento.

Um relinchar rouco.

O Kahama olha o cavalo galopando ao redor de Elektra tentando desferir um ataque. Quando acredita estar vendo seu animal deixando a oponente mais ferida ainda, se espanta como rastro de sangue que escapa pelo rabo do animal.

REI grita desesperado.

O corpo do animal é dividido em dois, lateralmente, pelo sai que sobrou na mão de Elektra. O sangue agora escorrega pelo antebraço da ninja.

O Kahama saca o arco e novamente dispara para cima. De acordo com o raciocínio da assassina, aconteceria o mesmo de antes: acompanhando os fogos de artifício viria um cavalo.

Ledo engano. Quando a flecha disparada explodiu no céu, novas setas, milhares, como gotas d'água duma chuva de verão, caíam na direção da ninja. Ela não tinha onde se proteger.

Ela correu.

Como nunca.

Ao tempo em que salta, gira o corpo como um parafuso e acerta REI no abdome. Ela pega a outra arma e o ataca novamente. Ele cai de braços abertos e ela repete o ato de antes: pisa nos membros superiores e continua fincando os sais em diversas partes do guerreiro.

As flechas que caem do céu a atingem, mas nada grave. A incidência diminuiu quando REI sofreu o primeiro ataque.

Elektra não consegue sentir dor neste momento.

Apenas ódio.

Ela continua perfurando.

Descontrolada.

Até que cessam as setas. Os fogos de artifícios ainda podem ser escutados de longe.

Elektra ergue a cabeça e vê um ponto luminoso depois da Ponte Curvada.

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N.A - imagem de capa gerada por inteligência artificial.


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