A façanha de uma feirinha.

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Os dias favoritos de Kai eram as sextas de feirinha do centro que o prefeito, o mesmo há pelo menos trinta ou quarenta anos, propusera na época do começo de seu mandato. As luzes da igrejinha típica da Praça das Rosas eram fortes e as barraquinhas de iluminação fraca e decoração pobre eram o marco da noite e o ponto de encontro dos jovens era sempre na praça de cima, atormentando os pobres idosos que só queriam desfrutar de uma boa reza pacífica com um copo de caldo de cana na mão e a outra no crucifixo pendurado no pescoço.

Kai adorava sextas-feiras. Com seus bons quinze anos e frequentando o ensino médio como calouro, seu momento favorito era sair da escola meio-dia e meia, bolsa cheia de broches pendurada de um lado só do ombro enquanto gritava para seu melhor amigo que se veriam mais de tardinha, quando as barracas começavam a serem montadas e o sol começava a se despedir. Ele chegaria em casa com pressa e comeria seu prato de arroz e feijão e carne moída acompanhado dos gritos de sua mãe para mastigar mais devagar e parar de atormentar sua irmã Lea, ocupada pintando as unhas em seu lugar designado, o mesmo desde os quatro anos de idade quando precisou começar a dividir a mesa com seu irmão mais novo.

Depois Bahiyyih apareceria da escola junto com seu pai, porque a mocinha não aceita caminhar e quer sempre ir de moto, obrigando o adolescente a caminhar mais, enquanto ela sentia os cabelos voando e abraçava forte o homem mais velho. Daí ela correria para o quarto e jogava a bolsa da barbie, a mesma que usava à quatro anos atrás na quarta série, na cama e correria até a cozinha, pegando seu próprio prato de comida porque sua mãe ensinou a se virar sozinha e sentando do lado direito de Kai, sentindo seu cabelo ser puxado e uma guerra de tapas começasse até que a mãe implorasse do quarto do meio, onde estaria passando roupa e já tendo almoçado mais cedo, que eles parassem com a briga boba.

O pai se sentaria na mesa junto com os filhos e diria para Lea largar a mão de ser vaidosa desse jeito e comesse junto com os irmãos, o que ela faria depois de bufar e fechar o potinho de esmalte. Sua sainha era curta, daquelas que se usa para dançar lambada, e ela receberia uma provocação de Hiyyih sobre como aquilo era feio e que ela não entendia os jovens adultos.

Depois do almoço então era quando Kai voltaria para seu quarto, não sem antes conferir no calendário da casa se era seu dia de lavar a louça (hoje não era) e rir da cara das irmãs quando uma delas fazia essa tarefa. Tiraria o uniforme com pressa sem explicação e colocaria sua clássica bermudinha marrom rasgada no interior da coxa direita e uma camiseta azul, deitando na cama e contando seus tazos com a mesma alegria de quem faz isso todo santo dia e se orgulha da grande coleção. Depois ele olharia para seu bolo de cartinhas e se lembraria de que precisa ligar para o telefone fixo da casa de Taehyun porque o veterano Choi Soobin tinha respirado no pátio e causado o maior tumulto (que só existia na cabeça desses dois).

Seu pai estaria assistindo futebol na televisão em que dois grupos tão locais que só eles mesmos conheciam jogavam e ele espreitava no finalzinho do corredor para ver se ninguém mais estava usando o telefone fixo. Ufa, ainda bem que não. Na pontinha dos pés, ele passaria pelo quarto de sua mãe e veria ela dormindo na cama, a janela aberta e o ventilador de teto salvando do calor horrível, o cabelo da mulher todo desgrenhado enquanto ela abraçava pacificamente o gatinho laranja dono da casa e babava nas cobertas.

A mãe sempre dormia todas as tardes, religiosamente até às três porque (de sexta-feira) às quatro já começava a empurrar cada filho para o banheiro, porque cinco pessoas precisam estar prontas para ir à feira às sete.

Então ele finalmente discaria o número que estava grudado na sua mente com cola de madeira, igualzinho o sofá quebrado que o pai deu conta de consertar e nunca mais quebrou de novo, e esperaria na linha, só para ouvir Taehyun atender com os gritos de sua mãe dizendo balelas e sua irmãzinha bebê-meio-criança implorando para deixar ela pintar as unhas dele. Até que era tudo bem rotineiro, porque toda sexta-feira eles fofocavam no telefone e ai de quem ousasse interromper.

Cocada, pé de moleque e paçoca.Tahanan ng mga kuwento. Tumuklas ngayon