Capítulo 02

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Foram quatro horas tentando convencê-lo a me deixar na estrada, falei sobre o meu pai, sobre meu irmão, sobre meus padrinhos, mas ele não esboçava medo algum, era como se ele já soubesse quem eu era e já tivesse planejado tudo.

Passamos por uma placa dizendo “Bem vindo a Penedo”, eu conhecia o local, já vim a passeio com meus pais em uma época em que eles eram felizes.

Era uma cidade turística, conhecida como a Finlândia brasileira, eu só não entendia o por que ele estava me trazendo pra cá, já que aqui não era onde ele morava, pelo menos não foi o que ele me disse.

— Meu Deus... Você mentiu pra mim?!
Digo assustada.

— Sobre o que? Sobre onde eu moro?
Ele tem uma voz divertida e eu juro que a cada hora tenho mais pavor dele.

— Marcell é pelo menos seu nome verdadeiro?
Questiono.

— Talvez sim, talvez não!
Ele responde irônico.

Paramos em frente a um conjunto de casas, casas simples. Era um corredor e passávamos por várias casas amarelas, uma grudada na outra e no final desse corredor estava a que iríamos ficar.

A casa era composta por três cômodos, uma cozinha, um quarto e um banheiro, o local fedia a mofo.

— Só me ouve Marcell... Eu sou alérgica a mofo, eu vou morrer aqui.

— Deixa de ser fresca, Ju!
Ele não me dá atenção.

Eu girava olhando aquele espaço e já tentava planejar uma forma de fugir dali no momento certo.

...


Tem três dias que estou aqui, três dias colocando a mesma roupa, Marcell me trancava dentro de casa e ia trabalhar todos os dias. Ele dizia que era pra eu ficar quieta e para eu não fazer merda, que não adiantaria eu gritar já que o pessoal que morava ali eram amigos dele e dariam um jeito de me calar.

Ele graças a Deus não tentou nada comigo, pelo menos não até esse momento. Na cozinha não tinha nada, a não ser uma geladeira, ele trazia comida todos os dias.

Eu mexi na casa inteira, procurei faca, garfo, tesoura, qualquer coisa que eu pudesse me defender caso eu precisasse, mas não tinha nada.

Estou sentada no colchão velho no chão da casa, eu sinto que estou começando a adoecer, talvez pelos mofos que estão por todas as paredes da casa.

Meu nariz coriza, minha garganta dói e minha respiração está começando a pesar...

Estou encolhida chorando quando ele entra em casa, ele veste uma roupa toda branca e pelo cheiro acho que ele trabalha no açougue do mercado.

— Levanta, vamos sair!
Ele coloca a chave do carro em cima do pequeno móvel que tem ali.

Eu até pensei que seria a oportunidade de enfim fugir, mas eu não tinha força, minha cabeça doía muito e meu corpo estava estanho.

— Vamos aonde?
Pergunto com dificuldade.

— O que você tem? Tá doente?
Ele estanha e se aproxima para vê se eu tô com febre.

— Eu falei dos mofos, acho que estou adoecendo.

— Vai, levanta! Vamos comprar roupas para você e aproveitamos e passamos em uma farmácia.

Com muita dificuldade eu levantei, fui no banheiro, lavei meu rosto, ajeitei o cabelo e segui com ele até a porta.

Antes de abri-la, Marcell veio com algumas regras.

— Vamos as regras! Não dê uma de adolescente rebelde, vamos em uma loja, você escolhe as roupas e depois vamos a farmácia, não tente fugir, não tente avisar a ninguém, aqui é minha cidade, eu conheço geral e eles não vão te ajudar... Agora vamos as consequências, caso você faça alguma merda, eu terei o prazer de marcar esse rostinho lindo! Entendeu?

Eu tinha ódio no rosto, mas balancei a cabeça afirmando.

Saímos de casa e eu pude reparar bem o local, entramos em seu carro e seguimos para um centro comercial.

Como era dezembro e estávamos perto das festas de fim de ano, a cidade estava cheia.

Entramos em uma loja e uma menina veio logo nos atender.

— Oi, boa tarde! Posso ajuda-los?
Ela tem um sorriso simpático no rosto.

— Minha namorada precisa de roupas.

Ouvir Marcell dizendo que eu era a namorada dele me dava náuseas.

A menina segurou o meu braço sorrindo e me puxou pela loja... Ela me mostrava tudo e Marcell sempre atrás da gente, duas horas depois eu estava cheia de roupas nas mãos.

— Já terminou?
Ele pergunta já cansado de esperar.

— Terminamos! Mas ela vai experimentar agora.
A atendente diz sorrindo.

— Não! Se alguma não der voltamos para trocar depois.
Marcell diz.

Eu não falava nada, pra mim tanto faz.

— Que isso menino, vocês já estão aqui, a cidade está lotada... Aproveita logo que vocês estão aqui e não precisarão voltar depois.

Marcell fica pensativo, mas no final concorda.

A atendente o coloca sentado em umas cadeiras próximo a entrada dos provadores e assim que vou me preparar para entrar no mesmo, ele se levanta e segura meu braço direito e me abraça sussurrando em meu ouvido.

— Não tente gracinha, você sabe o que vai acontecer!
Eu só balaço a cabeça afirmativamente e para disfarçar, Marcell me dá um Celinho.

Que nojo!

Entro no provado e começo a tirar minha roupa e a experimentar as dezenas que peguei, até que vejo que uma pessoa entra no provador ao lado... O provador era de madeira, mas a parte de baixo era aberta, vi quando a mulher coloca a bolsa no chão e em um dos bolsos da mesma tinha um celular.

Essa era a oportunidade, eu tremia dos pés a cabeça, eu precisava ser rápida.

Sem pensar muito pego o celular com cuidado e penso pra quem ligar, mas fico frustrada quando vejo que o mesmo está bloqueado.

— Droga!
Murmuro.

A foto do perfil era de uma gata e em seu pescoço tinha uma medalhinha escrita “cherry” e em baixo do nome tinha a data “ 10 - 07 – 2001”.

Eu comecei a tentar, precisava ser rápida.

“10072001” nada!
“100701” nada!
“10701” foi!

Fiquei eufórica quando o telefone destravou, liguei correndo para meu irmão, foi o primeiro número que veio a minha mente.

O telefone toca três vezes, meu coração estava acelerado e quando vejo que ele atendeu já começo a falar.

— Briguento, aqui é a Ju, me escuta, preciso ser rápida... Fui sequestrada!

Eu já começo a chorar e falo sussurrando.

— Por que não liga pra polícia?

Ouço uma voz estranha no outro lado da linha e meu desespero é enorme.

— Droga! Cadê meu irmão?
Pergunto em soluços.

— Sei lá quem é seu irmão! Tú deve ter ligado pro número errado!

A voz do outro lado da linha diz.

— Tô ferrada, já era!

Digo aos prantos.

— Ju, neh? Ele volta a falar. — Aonde você está? Vou tentar te ajudar.

— Eu não sei... Só sei que é Penedo.

— Me envia a sua localização.

— Eu não estou na casa, estou em uma loja... Peguei o celular de uma cliente escondida.

— Okay... Me envia sua localização assim mesmo e me diz tudo que você sabe sobre a rua que você está morando.

Ju, tá demorando demais!”
Ouço Marcell falando.

— Já estou terminando.
Respondo tentando fazer uma voz melhor.

— Eu não consegui vê muita coisa, mas é um conjunto de quitinetes amarelas, a casa que eu estou fica nos fundos de um beco... Tem um bar na rua, ele é amarelo...

— Nome do bar?

— Eu não lembro... Choro.

— Da casa até a loja, levou quanto tempo?

— 10 minutos aproximadamente.

— Ju, presta atenção... Eu vou tentar te achar, seja forte, okay.

Ele tenta me acalmar.

Ju, se vc não sair agora desse provador, eu vou entrar!”
Marcell diz.

— Ele vai entrar aqui, preciso desligar.

— Eu vou te achar! Eu vou!

Foi a ultima coisa que ouvi dele, desliguei o telefone e quando fui colocar o telefone no lugar percebi que a moça já havia saído, droga!

Deixo o telefone no chão do provador dela e quando estou recolhendo as roupas para sair do mesmo, Marcell abre a porta com tudo.

Algumas mulheres olham assustadas e ele tenta disfarçar sua irritação, principalmente quando ele olha pro chão e vê a ponta do celular.

— Vamos, agora!
Ele segura meu braço e sai me puxando.

Ele paga as roupas, sinto ele tenso e preocupado... Ele olha para todos os lados.

Sheik - O rei de Vigário Geral (Morro)Where stories live. Discover now