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Van der Wood

Fervi de raiva, ao ver a Anna voltar para dentro de casa, achando-se a dona da razão. A verdade é que não sei o que me deu para reagir da forma que reagi, mas estava zangado ao ponto de começar a bater em qualquer um que me dirigisse a palavra.

A festa continuava, como se nada se tivesse passado. Apercebi-me de que deveria ter mantido a boca fechada e ignorado a presença dela, mas ver o idiota do Gabriel tão próximo da Anna, a rir de sabe lá Deus o quê, como se fossem íntimos...

Tentei ignorar a sensação incomoda e forçar-me a entrar novamente no espírito da festa. Peguei numa bebida do bar, mas o sabor era amargo, quase tão amargo quanto a troca de palavras com a Anna. A melhor forma de lidar com este tipo de situações era procurar algo que realmente me abstraísse.

Vi uma miúda a abanar-se ao ritmo da música, de um lado para o outro, perto da piscina e aproximei-me. Começamos a dançar, e eu tentei perder-me na música enquanto uma das minhas mãos percorria o corpo dela. No entanto, por mais que eu tentasse, a imagem da Anna e do Gabriel insistia em reaparecer na minha memória.

Trouxe-a para mais perto de mim e então beijei-a. No calor do momento consegui, por momentos, esquecer os pensamentos. No entanto, quando me afastei, a realidade bateu de volta com força.

Uma sensação estranha de vazio substituiu momentaneamente a raiva e os ciúmes. Percebi, de repente, que a miúda com quem eu estava não era quem eu queria. Olhei em volta, à procura da Anna na multidão, mas não a vi em lado nenhum.

Deixei a miúda sozinha, decidido a encontrar a Anna. Caminhei em direção ao interior da casa, afastando-me da agitação da festa. A batida da música desvaneceu-se à medida que me distanciava, deixando-me apenas com o som dos meus próprios passos e pensamentos. Entrei na sala, onde a televisão lançava uma luz suave sobre os móveis.

E lá estava ela, sentada sozinha, concentrada num programa de televisão qualquer. Havia algo na forma em como ela ali estava, sozinha, que despertou uma mistura de emoções em mim. A raiva deu lugar a uma espécie de ansiedade e eu vi-me sem saber o que fazer ou dizer.

O que raio se estava a passar comigo? Será que eu tinha bebido assim tanto?

- Anna - murmurei, ainda incerto do que estava a sentir. Ela virou-se para mim, com os olhos carregados de questões. O silêncio pairou entre nós, carregado de tensão.

Aproximei-me, tentando disfarçar a confusão dentro de mim. Quando ela notou que me aproximava, a expressão dela mudou, tornando-se um misto de surpresa e desconforto. Tentei soar casual, apesar do caos interno.

- O que estás a fazer aqui? - perguntei, tentando mascarar a tensão na minha voz.

- Estou apenas a ver televisão. O que é que isso interessa? - ela respondeu, num tom que misturava resistência e desinteresse.

Não sabia ao certo o que estava a tentar alcançar com aquela abordagem. Talvez quisesse compreender o motivo pelo qual vê-la com o Gabriel me afetara tanto. No entanto, as palavras pareciam presas na minha garganta. Não estava habituado a ter este tipo de conversas.

- Podes voltar para a festa, se quiseres. - comentei, desviando o olhar por um momento antes de fixá-lo novamente nela.

- Estás a gozar com a minha cara, só pode! - a expressão dela tornou-se mais intensa. Era como se estivéssemos numa espécie de confronto silencioso, e eu lutava para decifrar o que passava pela sua cabeça.

- Não estou a gozar contigo, Anna. - respondi, mantendo a voz firme, embora a confusão ainda pairasse dentro de mim - Só estou a tentar perceber o que estás a fazer aqui sozinha.

Ela soltou uma risada amarga, como se a minha preocupação fosse o último dos seus problemas.

- Acredita, não preciso da tua preocupação. Se quiseres divertir-te lá fora, força. Não vou ser eu a estragar a tua festa.

A sua resposta atingiu-me de uma forma que não esperava. Era como se tivéssemos acionado um mecanismo de defesa um no outro, e a nossa comunicação estava agora repleta de mal-entendidos.

- Não se trata disso, Anna. - tentei explicar, mas ela já se levantava do sofá, parecendo decidida a distanciar-se da conversa e, talvez, de mim.

Ela começou a afastar-se, como se estivesse a escapar de algo que nem eu mesmo compreendia. Sentia uma urgência inexplicável de esclarecer as coisas, de desfazer a tensão que pairava entre nós.

- Anna, espera. - ela parou, mas não se virou para me encarar.

- Não sei o que está a acontecer comigo... - continuei, relutante por estar a expressar o que sentia.

Ela virou-se para mim, e os seus olhos transmitiam uma mistura de emoções. Parecia incerta, e eu percebi que também ela, estava num território desconhecido.

- Leonardo, não sei o que esperas que eu diga. As coisas estão estranhas desde o início. – a Anna confessou, deixando a honestidade permear as suas palavras – Eu não sei se foi por algo que vi ou ouvi, mas a tua vida não me podia interessar menos. Eu não quero ter nada a ver com ela ou contigo. Podes ficar descansado.

Ali estava a confissão. Ela realmente ouviu a conversa que tive com o James, mas por algum motivo, naquele momento, eu não estava minimamente preocupado com isso.

- Talvez devêssemos voltar à estaca zero, para acabar com esta tensão. - sugeri, sentindo uma vontade genuína de resolver aquilo.

A Anna suspirou e, sacudiu a cabeça, como se estivesse a pensar em algo que não queria recordar. – Acho que somos demasiado diferentes, honestamente, e isso nunca vai permitir uma relação cordial, sequer. Sinto que já sei mais acerca de ti, do que realmente gostava de saber, por isso prefiro manter a distância, dentro dos possíveis.

A sinceridade nas palavras dela atingiu-me como um soco no estomago. Era difícil não levar para o lado pessoal.

- Talvez tenhas razão. - murmurei, incapaz de olhar diretamente nos olhos dela.

Ela desapareceu no corredor, deixando-me ali, a absorver as suas palavras.

Senti raiva de mim mesmo e isso era algo que já não sentia há muito tempo.  

TouchWhere stories live. Discover now