EFFOR+LESS

O começo

-Onde você estava? Com quem estava?

Mesmo ainda caído no chão e segurando meu tornozelo eu consegui sentir no tom da voz de Jay a mesma raiva de sempre.

- Eu não vou te dizer Jay. Agora me solta.

Ainda não escutei nenhum som na casa. Minha mãe  não está aqui. Preciso me livrar dele antes que essa situação se desenrole pra algo pior.

-Não comece com isso de novo...onde está sua mãe? Ela sumiu, me ajude a levantar lana, ande...me ajude!

Seu olhar perdido e a voz embargada pela bebida sempre me causam arrepios.

Eu me solto de seu agarre e seguro em sua mão pra que ele levante e é como um dejavú.
Me vejo com 10 anos, levantando Jay com toda força que eu tinha.

Meu agradecimento era sempre um empurrão, um xingamento... nunca um "obrigada minha filha por ainda permanecer aqui mesmo eu sendo um babaca filho da puta"

Jay, apesar de todos os dias tentar suicídio através do álcool e das drogas, continua sendo um homem bonito. Meu pai não aparenta ser um drogado.
E ele usa isso como um álibi pra seduzir quem o circula.
É assim que um narcisista trabalha. Ele te atrai,te domina e te faz acreditar que ele não é o que realmente é.

A diferença daquela Lana pra essa não é só a idade. Aquela Lana acreditava que o ser humano é mutável. Essa Lana de agora acredita que alguns demônios saíram do inferno e encarnaram em seres humanos.

Já de pé, Jay se senta no único banco que mantemos na varanda.
Ele parece tonto e está sujo com o próprio vômito.
Meu estômago revira com a cena.

-Eu não sei aonde está  sua mãe. Ela não está em lugar nenhum.
- Você acha que pode sair por aí sem dar satisfações? Estou cansado disso, você e sua mãe são duas vagabundas!!!! Vocês me sugam.

Os olhos saltando do rosto, a boca cuspindo as palavras. Tudo me enoja.

Não seria ao contrário? Fico me perguntando isso...não olho pra ele em nenhum momento, continuo encarando o nada. O quadro branco que crio na minha cabeça enquanto ele grita.

Entro na casa finalmente, o calor característico desse lugar sempre me irritando no primeiro passo que dou para dentro.

- Mariana? Onde você está? Tá em casa? Grito sem resposta.

Não me lembro de quando comecei a chamar minha mãe pelo seu nome. Mas lembro que ela não se importa. Nunca demonstrou. Lembro também o motivo que me levou à isso e ele está atrás de mim agora.

Jay me segue. Passo pela cozinha entrando no corredor em direção ao quarto.

-Não desvie o assunto! Vai me dizer onde estava ou não? ele grita e uma raiva súbita sobe pelo meu pescoço.

Eu sinto que vou explodir em mil pedaços sempre que esse homem me questiona.
Eu odeio ter que ouvir a voz dele, e odeio mais ainda quando é direcionada a mim.

- Não vou contar porra, vai se foder!
Minha voz sai como um rosnado e sigo para o quarto.

Entro  me certificando de que Mariana não está aqui. E falando sinceramente, não me importo aonde esteja.

- Você é irresponsável, igual à sua mãe! Onde ela se meteu?

Porra ele não vai me deixar em paz. Eu sinto que fui escolhida hoje para ser infernizada por ele. Esfrego a mão no rosto e reviro os olhos.

Jay passa por mim, indo para o outro lado da cama.
Aproveito sua distração e corro para o banheiro.
Quando ele percebe já estou trancando a porta. Alguns segundos depois sinto seus socos na madeira.

-Saia desse banheiro agora Lana. AGORA!!

Alguns gritos e sinto a intensidade dos socos  na porta diminuindo, a voz perdendo o ritmo e eu sei que ele desistiu.
O chão gelado do banheiro me atrai e deito de costas.
Coloco os fones de ouvido tocando PCH do Jaden e fecho os olhos. Imergindo, até o telefone vibrar.
É uma mensagem do Pedro.

..."oi linda, saímos as 20hrs pra te buscar. Fica gata, tô louco pra te comer na piscina. Isso não faz mal pra você né? Digo infecções etc, porque não paro de pensar nessa porra.
Nora topou mas ela é uma mentirosa. Bjs te amo."

Esboço um sorriso. Pedro porque você é assim? Mas obrigada por ser. Um sorriso involuntário no meu rosto.

Olho o relógio e ainda são 15 horas da tarde.
Tenho tempo pra dormir um pouco e pensar em como pegar meu biquíni no quarto sem precisar cometer um assassinato.

Adormeço.