Uma quedinha em você

Gelo

— Kalimann, posso pular meus cem esta semana? Por favor? Preciso de dinheiro para outra coisa. – Gizelly implora a Rafaella naquela bela manhã de domingo.

— Sim claro. Tudo certo? – Rafaella pergunta.

— Obrigada, você é a melhor, fique à vontade para ficar aqui mais uma semana! – Gizelly evita a pergunta e sai do apartamento.

Rafaella queria perguntar mais, mas Gizelly parecia extraordinariamente feliz, então ela tinha certeza de que nada de ruim estava acontecendo. Ela ignora isso e continua a trabalhar em seu laptop.

***

Gizelly volta com uma caixa enorme e um cooler. Ela coloca todos os itens no balcão da cozinha com um grunhido pesado.

— Gizelly Bicalho, você gastou US$ 100 em uma… – Rafaella lê as palavras em inglês sob as letras estrangeiras na caixa. – Autêntica máquina de gelo fofo raspado e feliz? Afinal, o que isso quer dizer?

— É uma máquina elétrica de raspar gelo! Vamos fazer bingsu hoje!

— Bing o quê? – Rafaella pergunta.

— Bingsu! É gelo raspado coreano. Está um dia quente, perfeito para um pouco de gelo raspado. – Gizelly responde ansiosamente enquanto tira a máquina da caixa.

— Então você gastou US$ 100 em uma máquina… que raspa gelo?

— São apenas US$ 70, o resto gastei em ingredientes. O gelo que coloquei esta manhã já está pronto? – Gizelly pergunta enquanto abre o freezer para verificar seu gelo.

— Se eu soubesse que você gastaria seu dinheiro com isso, nunca teria concordado que você deixasse de pagar esta semana. – Rafaella apenas geme e esfrega a têmpora.

— Vou fazer um pouco para você! Vamos. Este é um ótimo investimento. – Gizelly diz  com seu sorriso habitual que faz Rafaella revirar os olhos.

— Já posso dizer que você vai fazer uma bagunça na cozinha. Não vou limpar.

— Vou limpar depois. – Gizelly diz. Rafaella lança um olhar de repreensão para ela, Gizelly imediatamente grita. – Eu juro!

Enquanto Gizelly mexe na máquina e tenta descobrir, Rafaella continua seu trabalho na ilha da cozinha. De vez em quando, Rafaella olha para Gizelly para ver sua luta com a máquina. O fio não consegue alcançar o ponto de conexão da área de Gizelly, então Rafaella está apenas esperando pela pergunta inevitável.

— O fio é um pouco curto, permissão para fazer isso na sua área? – Gizelly pergunta.

— Tudo bem, permissão concedida.

Rafaella não está mais olhando, pois está encarando Gizelly e evitando seu trabalho. É tão fascinante para Rafaella ver Gizelly tão concentrada em algo além de seu trabalho. Rafaella aprendeu a diferenciar a Gizelly que leva seu trabalho a sério e a Gizelly de casa, que é boba, descuidada e grosseira. Embora Gizelly raramente traga mais suas não-namoradas para casa, Rafaella suspeita que é porque ela está por perto com tanta frequência que Gizelly às vezes vai para a casa delas. Mas ultimamente ela tem ficado mais em casa e Rafaella não se importa com a companhia.

Gizelly nem percebe o olhar de Rafaella e a mostra o panfleto de instruções que ela está folheando.

— Todas as instruções estão em um inglês não padrão, olhe.

— Onde você comprou isso? – Rafaella pergunta enquanto olha o panfleto.

— Em Koreatown. – Gizelly diz e Rafaella começa a ler as instruções em voz alta